Beck
Hansem é incensado pela crítica desde o lançamento
de Mellow Gold e o sucesso do single Loser. É também considerado
uma espécie de camaleão, um David Bowie dos anos 90. Medindo
as verdadeiras proporções, tal afirmação não
é de toda absurda, se considerarmos que ele se reinventa a cada
disco.
Em 1996 o nome
de Beck ilustrava as principais publicações e constava nos
primeiros lugares das listas de melhores do ano, afinal Odelay superava
em muito as expectativas geradas pelo sucesso de Mellow Gold.
Depois
viria
Mutations (1998), que seria lançado pela K Records, gravadora
de Calvin Johnson, do Beat
Happening – que já havia lançado One Foot In The Grave (1994) – mas
a Geffen, percebendo o seu potencial, resolveu comprar os
direitos de edição do álbum, (afinal o contrato permitia
que Beck gravasse por outros selos). A psicodelia e o excesso de baladas
não tiraram o brilho do cantor e Tropicália, destaque
do disco, era um tributo torto, com direito a cuíca mal tocada, aos
tropicalistas. A crítica brasileira não gostou nem um pouco
da citação tropicalista e malhou o artista, acostumada a
rechaçar músicos estrangeiros que citam a música brasileira.
Com
Mutations,
porém, Beck subvertia sua carreira e gerava desconfianças até que Midnite Vultures (1999)
devolvesse, mas não por completo, o seu
prestígio. O disco era um verdadeiro tratado de música dançante
em que ele emulava um Prince cantando músicas do James Brown.
Consciente de
um novo abalo em sua carreira, Beck arrisca de novo na simplicidade. Se
já o fez em One Foot In The Grave e Mutations, no
novo álbum
ele radicaliza.
Sea
Change tem propósitos mais honestos do que qualquer outro álbum
do artista. Aqui o mote é a simplicidade unida a arranjos de corda
(elaborados por Al Campbell, pai de Hansem), ambientação
melancólica e intimista, inclinando-se mais ao formato folk do que
para o psicodélico.
Os
temas abordados
nas letras são extremamente pessoais e monocromáticos - desde
feridas abertas: "Baby, eu sou uma causa perdida (...) Estou cansado de
lutar por uma causa perdida" (Lost Cause), análises comportamentais
(All In Your Mind) e visões desoladoras: "O sol não brilha
até quando é dia" (The
Golden Age) culminadas em um surto
de autocomiseração (Guess I’m Doing Fine e Round The Bend).
O título
"Sea Change" define bem a proposta do álbum: mudança, tanto
exteriormente, em sua carreira, quanto interiormente, já que as
letras revelam lirismo taciturno, perfeito, unido aos arranjos e produção
cuidadosa. Há quem vai execrá-lo pela "exagerada" exposição
sentimental. São pessoas acostumadas a um Beck genérico,
enciclopedista pop e "arauto" da revolução alternativa dos
anos 90.
As influências
imediatas de Beck para este disco incluem Dylan na concepção
literária e Neil
Young nas melodias. O fantasma de Nick
Drake se apossa do músico em "Round The Bend" – canção
que se encaixaria perfeitamente em "Five Leaves Las"t.
Nigel Godrich,
que teve o mérito de ter produzido importantes discos na década
de 90 (Travis,
Radiohead,
Pavement)
e já havia trabalhado em "Mutations", ratifica seu talento de transformar
canções em cristais.
Saldo final:
Grodrich e Hansem souberam utilizar a simplicidade para a confecção
de um dos discos mais tristonhos e instigantes de 2002.
Links
Site Oficial Beck
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