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Beat Happening – Crashing Through 
K Records (2002)
por Julio Costello
http://juliosays.blogspot.com/

O Beat Happening é o principal veículo de expressão de Calvin Johnson, um dos expoentes da cena independente americana nos anos 80, que ao lado do Sonic Youth e Husker Dü, valorizava o expressionismo musical minimalista, compondo canções talhadas a machado, sem ornamentos, mas repletas de melodia e inspiração, tocadas, no máximo, com duas guitarras e bateria de 3 ou 4 peças.
 
A história do Beat Happening teve início em janeiro de 1983 quando Calvin formou o trio Laura, Heather and Calvin em Olympia, Washington.  Pouco depois, Laura Carter abandonou o grupo e Bret Lunsford, ocupou a vaga. Adotaram o nome Beat Happening e em março de 1984, partiram para o Japão onde ficaram dois meses fazendo poucas apresentações. O grupo seguirá à risca o mandamento do yourself do punk, confeccionando eles próprios, todos os produtos relacionados ao grupo: camisetas, LPs, fitas-cassete etc. Os lançamentos do grupo estarão sempre sob a tutela da K Records, selo de Calvin, responsável pelo lançamento de importantes bandas do underground americano (Mecca Normal, Beck, Built to Spill). Alguns discos do grupo foram distribuídos pela Sub Pop e já é lendário o fato de Kurt Cobain, grande fã do grupo, ter tatuado num dos braços, o símbolo da gravadora K.

Após 1992 o Beat Happening não mais lançaria LPs, reservando-se a poucos shows e parcos compactos. Oficialmente o grupo ainda existe, ainda que Calvin Johnson tenha outros projetos paralelos (o ótimo Halo Benders, o estranho Dub Narcotic Sound Systen, e, recentemente solo no álbum "What Was Me?"), Bret Lunsford toque no D + e Heather Lewis leve uma vida doméstica em Seattle, o grupo terá seu verbete na escrito na enciclopédia do rock, caracterizado pelo senso de liberdade e despretensão.

Programada para ter sido lançada em 2000 e só agora disponível (o quanto eu esperei), "Crashing Through" é a coleção definitiva do Beat Happening. A caixa contém todas as gravações lançadas pelo grupo entre 1983 e 2000. São sete CDs, compreendendo os cinco LPs originais, uma coletânea de lados B e um CD bônus com vídeos e uma rara gravação do Beat Happening ao lado dos Vaselines numa apresentação em Londres, e um livreto de 92 páginas escrito por Lois Maffeo (artista da K) contendo entrevistas e fotos. A embalagem de cada álbum foi redesenhada em formato digipack, mantendo a concepção das capas originais, incluindo fotos inéditas.

Beat Happening (1985), ou álbum amarelo, é a estréia do grupo e, certamente, o disco mais sujo, mal gravado e menos criterioso do grupo. O que mais impressiona no álbum é o fato de suas canções possuírem magnetismo ("Our Secret"), senso pop ("What's Important") e ritmo incessante ("I Love You"), proporcionado pelas guitarras débeis de Calvin e Bret e da bateria burra de Heather. A edição recente do álbum inclui as lendárias primeiras demos do grupo: "Beat Happening" (1984) e "Three Tea Breakfast" (1984). 

Jamboree (1988), o disco rosa, é considerado por muitos a obra-prima do grupo.  Há ecos dos Cramps ("Bewitched" e "Hangman"), distorções a esmo ("The This Many Boyfriends Club"), solenidade e misticismo ("Indian Summer", gravada pelo Luna no EP Slide).

Black Candy (1989), o álbum preto, aproxima-se do blues primitivo e da morbidez literária. Não chega a configurar uma antítese em relação aos álbuns anteriores, mas é um disco tristonho, excetuando-se as alegres "Cast a Shadow" (regravada pelo Yo La Tengo) e "Ponytail".

Dreamy (1991), é tão importante quanto "Jamboree". Heather Lewis, a baterista/guitarrista canta as melhores músicas do álbum ("Left Behind", "Fortune Cookie Prize", "Collide") e  Calvin valoriza sua voz de barítono em outros bons momentos ("Hot Chocolate Boy", "Me Untamed" e "Cry For a Shadow").

You Turn Me On (1992), é o ultimo álbum de inéditas lançado pelo grupo. Produzido por Steve Fisk, produtor dos álbuns anteriores, e Stuart Moxham, dos minimalistas e influentes Young Marble Giants, o disco não difere dos anteriores, e reúne uma coleção invejável de rifs de guitarra numa improvável associação entre os Cramps ("Pinebox Derby") e o Velvet Underground ("Tiger Trap").
Music To Climb The Apple Tree By, 2002, compila lados b e músicas inéditas e gravações recentes ("Angel Gone" de 2000 e "Zombie Limbo Time", de 1995). O grande atrativo, porém, é a inclusão do EP Beat Happening/Screaming Trees, há tempos fora de catálogo.

Crashing Through Bônus CD, 2002, é item exclusivo da caixa. Contem três faixas de áudio ("Cast a Shadow", "I Love You" e "Bad Seeds") gravadas em Londres em companhia dos Vaselines e seis vídeos de apresentações ao vivo ("Black Candy" e "Midnight A Go Go") e dois videoclipes ("Hot Chocolate Boy" e "Pinebox Derby"). É um belo souvenir, que só aumenta a obrigação de se adquirir "Crashing Through".