Três shows: Bruno Morais no Centro Cultural São Paulo, Jair Naves no Sesc Vila Mariana, Banda Sunday no Teatro FAAP

Bruno Morais no Centro Cultural São Paulo, 26 de agosto
Texto e fotos por Marcelo Costa
Video por Alexandre Matias (da noite de 03 de setembro)

Um dos grandes álbuns nacionais de 2022, “Poder Supremo”, de Bruno Morais, mereceu tratamente a altura em duas semanas de shows imersivos no Espaço Cênico Ademar Guerra, nos porões do maravilhoso Centro Cultural São Paulo. O disco que combina funk, spiritual jazz, neo soul, afro jazz, samba soul, riffs nervosos, bossa nova e muito misticismo nasceu não só para celebrar a música como também celebrar o poder supremo de estar vivo (o que ganha contornos emocionais evidentes após um periodo em que o projeto necropolítico do país era deixar morrer o mais gente possível), e o show não poderia deixar de ser também uma celebração visual e sensorial, o que foi amplificado pelo maravilhoso espaço do CCSP, com seu palco (inicial – haveria intervenções interessantes em outros locais do porão durante a noite) sendo abraçado por um circulo de luz em que 10 integrantes, cinco homens e cinco mulheres, recriavam as canções de maneira impecável vestindo belíssimas túnicas coloridas. No repertório, as 17 faixas do álbum mais o interlúdio “Vamos Entrar” e uma única concessão a material mais antigo, “Há de Ventar”, do álbum “A Vontade Superstar”, de 2009, faziam a experiência soar como algo místico: primeiro, o público foi disposto em cadeiras na frente do palco para admirar o som e canções como “Divindade”. Depois, auxiliares encaminharam com luzes os presentes para um outro espaço, onde uma dançarina performava e outro bloco de canções do álbum (“Molly”, “Fly Away” e “C’oração”) seria apresentado. Na sequencia, o quarteto de sopros encaminhou novamente o público para o palco anterior, mas agora sem cadeiras, para que todos pudessem celebrar não só o grande disco de Bruno, mas a oportunidade de dançar na escuridão ao lado de amigos e desconhecidos embalados por música emocional com uma das melhores faixas do álbum, “Para Alguém no Deserto”, encerrando uma noite absolumante mágica.


Jair Naves no Sesc Vila Mariana – 1º de setembro
Texto e vídeos por Bruno Capelas
Fotos de Fernando Yokota

Na noite do dia 1º de setembro, a tensão no auditório do Sesc Vila Mariana era tanta que dava para cortar o ar com uma navalha. Também, pudera: à frente da plateia, Jair Naves lançava com ingressos esgotados em São Paulo o show de seu mais novo disco, “Ofuscante a Beleza Que Vejo” (2022). Reflexo da pandemia, do isolamento social (que fez Jair incorporar o teclado entre seus instrumentos, ainda de forma “amadora”) e do avanço de inúmeros absurdos nos dois países que o cantor chama de casa (o Brasil e os EUA), o álbum traz alguns dos momentos mais pessimistas de um compositor já conhecido por trafegar os recônditos sombrios da alma humana, ao mesmo tempo em que busca enxergar luz por entre as rachaduras. No palco, com sete músicas do trabalho novo, o resultado ainda é de mais escuridão que lume. A sensação é amplificada pelos arranjos entre o noise e o pós-punk da banda de Jair, composta por Rob Ashtoffen (baixo e ótimos backing vocals), Lucas Melo (bateria) e Renato Ribeiro (guitarra). Há também raiva (“Deus Não Compactua”, “De Arder”) e algum espaço para o romantismo (o resgate de “5/4”, bela balada do segundo disco de Jair) entre as treze canções apresentadas – tal como treze são as canções de “Ofuscante”, certo, leitor? Como quase todo show de lançamento, é um espetáculo ainda em construção, podendo evoluir em ritmo, escolhas de repertório (foi sentida a ausência de qualquer canção do álbum da estreia solo do cantor, completando 10 anos em 2022) e dinâmica. Mas os pequenos defeitos se compensaram no bis com a emoção na voz embargada de Jair, um artista que entende como poucos o seu lugar no mundo. Primeiro, com a confessional “Meu Calabouço” e depois, com a já clássica “Um Passo Por Vez” – e diante de duas canções como essas, poucas palavras bastam. Um show que merece ser visto.


Sunday no Teatro da FAAP – 2 de setembro
Texto e fotos por Marcelo Costa
Vídeos por Bruno Capelas

Em 2014, o jornalista André Barcinski lançou o essencial livro “Pavões Misteriosos: 1974-1983: a Explosão da Música pop no Brasil”, que foi reeditado em 2022 em edição de luxo acrescido de muito material extra. Cinco anos depois, em 2019, estreava nos canais Music Box Brasil e Amazon Prime os oito episódios da série documental “A História Secreta do Pop Brasileiro”, dois esforços de resgate e registro histórico de suma importância num país sem memória. A série traz histórias imperdíveis dos bastidores do pop brasileiro dos anos 70 e 80, e para recriar algumas das gemas pop do periodo, Barcisnki recrutou a banda Sunday, grupo paulistano dos anos 70 ainda na ativa que viveu intensamente o periodo – tendo “perdido” seu baterista original para a banda de Roberto Carlos. O sucesso da série alavancou o interesse pela Sunday, e o jornalista decidiu produzir um show inspirado no programa, com a banda relembrando canções da época entre histórias do periodo – ora contadas pelos integrantes, ora em trechos da série exibidos em cena. Com dois shows lotados no teatro da FAAP, em São Paulo, a Sunday recebeu o carinho de um público seleto (Xico Sá, Marcelo Tas, Paulo Cesar “Garagem” Martin, integrantes da banda Os Carbonos, destaque da série) e majoritariamente grisalho que foi cantar quase duas e meia de hits como “Tell Me Once Again”, “Soler Soley” / “My Sweet Lord”, “Be My Baby” e “True Love” do falso gringo Steve MacLean aka Helio Costa Manso, líder da Sunday. Duda França marcou presença para relembrar Carlos Imperial cantando o sucesso “Grilo na Cuca” e o maior sucesso de um falso gringo, “Feelings”, de Mauricio Alberto, ou melhor, Morris Albert. Gilliard também marcou presença cantando os sucessos “Porto Solidão” e “A Pulga e o Percevejo” numa noite que ainda teve a presença das Harmony Cats relembrando gingles como o do Café Seleto, da Varig e DD Drin, entre outros, numa vibe saudosa e musicalmente competente., que merece ser prestigiada. Fique atento na agenda deles.


– Bruno Capelas (@noacapelas) é jornalista. Apresenta o Programa de Indie, na Eldorado FM, e escreve a newsletter Meus Discos, Meus Drinks e Nada Mais. Colabora com o Scream & Yell desde 2010.
Fernando Yokota é fotógrafo de shows e de rua. Conheça seu trabalho: http://fernandoyokota.com.br/
– Marcelo Costa (@screamyell) é editor do Scream & Yell e assina a Calmantes com Champagne.

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