Texto por Marcelo Costa
Fotos por Liliane Callegari
“Samuel Beam é um herói da cena indie norte-americana dos anos 2000. Sob o codinome de Iron & Wine, conquistou uma legião de fãs com seu alt folk country inspirado em Nick Drake, Neil Young e Elliott Smith”. Essas duas frases abriam o pequeno texto do Scream & Yell em 2007 que falava sobre o lançamento de “The Shepherd’s Dog”, o então terceiro disco de Sam Beam, inspirado na desilusão da reeleição de George W. Bush, e após ele vieram outros dois discos, “Kiss Each Other Clean” (2011) e “Ghost on Ghost” (2013), os três Top 30 da parada norte-americana, o que de certa forma demonstra o alcance popular do músico (nos EUA).
Ainda assim, quem entrasse no Cine Joia, em São Paulo, numa noite agradável (e levemente fria) de quarta-feira, iria se espantar. Um ótimo público marcou presença no local para assistir a 39ª Popload Gig, e assim que Sam pisou no palco, sozinho, uma ovação digna de popstar teve início – com palmas, gritos, urros, declarações de amor, gente cantando junto emocionada e pedindo muitas músicas tomando o ambiente – impressionando o músico, que, antes de agarrar um dos dois violões disponíveis (que seriam alternados durante a noite), bebericou o vinho disposto num banco ao lado e partiu para quase duas horas de show voz e violão.
“The Trapeze Swinger”, lançada em um EP de 2004, abriu a noite, mas o tom do show, porém, começou a ser dado quando, ao final da primeira canção, uma fã pediu “Woman King” e foi atendida. Dai em diante todos queriam ouvir “a sua canção”, e gritos ecoavam pelo Cine Joia a todo intervalo, com Sam distribuindo sorridentes “Oh Shit” e “Fucks” a cada música pedida, visivelmente impressionado com o reconhecimento. “É demais vir prum lugar tão distante de casa e ouvir pessoas pedindo músicas dos últimos 10 anos”, contou. “Low Light Buddy of Mine” e “Cinder and Smoke” vieram na sequencia.
Em “Tree by the River”, Samuel esqueceu a letra, e gargalhou. “Errei o refrão? Errei o refrão! Acho que foi porque nunca vi tanta gente cantando essa canção”, brincou, entre risos. “Jezebel”, “Big Burned Hand” (intensa), “Lion’s Mane”, “Boy With a Coin” (aplaudidíssima) e “Sixteen, Maybe Less” (com Sam rindo em meio ao falsete do vocal na canção originalmente gravada em parceria com a banda Calexico) foram recebidas de forma calorosa, mas o primeiro momento irrepreensível da noite surgiu com uma versão poderosa e cortante de “Monkeys Uptown”.
Pouco mais da metade do show (uma hora passou imperceptível e voando) e o público seguia a rotina da missa gritando nomes de canções. Afinando o violão, Sam apenas sorria e pescava daquele mar de pedidos uma música, apontando para a pessoa escolhida. Assim surgiu “Fever Dream”, outra das antigas, e “Communion Cups and Someone’s Coat”, lançada em uma compilação de raridades em 2009, e, novamente nesta noite, vitima de esquecimento de letra. A singela versão de “Waitin’ for a Superman”, dos Flaming Lips, foi outro grande momento, seguida de “Peace Beneath the City” e “Caught in the Briars”.
Em certo momento, um fã gritou: “Joy”. Na sequencia, o nome da canção ecoou no ambiente com vários outros fãs pedindo a mesma música, e ali pelo sexto pedido, Sam atendeu a plateia. Do recém-lançado disco de raridades “Archive Series Volume No. 1” (2015) saiu “Two Hungry Blackbirds”, com Samuel explicando: “Essa é uma canção nova que é velha, e como vocês aqui gostam muito das canções velhas, espero que gostem dessa também”. Um cover do Postal Service “Such Great Heights” veio na sequencia, encaminhando a noite para o trecho final.
Com quase uma hora e quarenta de show, Sam Beam já podia ser considerado “da galera”. O público pedia uma música, ele dizia que não lembrava e oferecia outra canção. Alguém queria vinho, mas sua taça já estava vazia, e ele lamentou… rindo. “House by the Sea”, do álbum “The Shepherd’s Dog”, sinalizou o final do show, mas o público queria mais, e Sam voltou para uma versão arrepiante a capella de “Flightless Bird, American Mouth”, que foi resgatada de “The Shepherd’s Dog” para a trilha sonora oficial do primeiro filme da saga “Crepúsculo” (2008), apresentando Iron & Wine para jovens vampiros (sim, haviam alguns na plateia).
Munido apenas de violão, uma taça de vinho, uma voz poderosa e um repertório de canções praticamente escolhido na hora (a maioria pelos fãs), Samuel Beam fez um show consagrador em sua estreia na capital paulista. Melhor do que oferecer um grande espetáculo à plateia, porém, é perceber que a noite foi de plena satisfação reciproca: Iron & Wine fez o público feliz com suas canções emocionais, e o público fez Iron & Wine feliz com uma recepção calorosa, apaixonada e surpreendente. Demorou um bocado de tempo para Sam Beam descobrir São Paulo, tomara que a espera por um novo show seja menor, porque já deu saudade.
– Marcelo Costa (@screamyell) edita o Scream & Yell e assina a Calmantes com Champagne
– Liliane Callegari (@licallegari) é fotógrafa e arquiteta. Veja galeria de fotos dos shows aqui
One thought on “Iron and Wine ao vivo em São Paulo”