por Pedro Salgado, especial de Lisboa
O músico cascalense B Fachada atravessa um dos melhores períodos da sua carreira. Com a edição de “Criôlo”, 11º trabalho de uma trajetoria prolífica, generalizaram-se os elogios à maleabilidade e capacidade de absorver paletas sonoras portuguesas, brasileiras e africanas, introduzindo componentes eletrônicos, sem desvalorizar a palavra cantada.
Em shows recentes, que mostram a evolução do compositor, Fachada apresentou um conceito mais dançante da sua música, com incrementos de voz e atualizações instrumentais. Embora o músico de Cascais planeje um novo álbum para o Inverno, é certa a ausência de lançamentos e shows em 2013 com propósito de “descansar, quebrar um ciclo habitual de lançar dois discos por ano e não viciar a criatividade”.
A vontade de alargar fronteiras e abraçar novos projetos, no entanto, é o seu passo seguinte. De Lisboa para o Brasil, B Fachada conversou com o Scream & Yell. Confira:
<a href=”http://bfachada.bandcamp.com/album/cri-lo” mce_href=”http://bfachada.bandcamp.com/album/cri-lo”>criôlo by B Fachada</a>
Em “Criôlo”, você explorou algumas sonoridades africanas, anteriormente abordadas, mas também fez incursões no pop e nas baladas. Foi pensado construir um álbum abrangente?
Quis fazer um disco que não impusesse dificuldades ao ouvinte, mas que ao mesmo tempo deixasse clara a minha perspetiva da música. O meu objetivo era juntar sob a mesma capa toda a minha herança africana, brasileira e (em muito menor escala) asiática. Na música não há fronteiras políticas nem históricas: tudo é contínuo, tudo é língua, nada está errado.
“Quem Quer Fumar Com O B Fachada” é apenas uma provocação?
Nas minhas pesquisas musicais pareceu-me ter descoberto alguma portugalidade na canção “I’m the Upsetter”, de Lee “Scratch” Perry, e a ideia de fazer um dub portuga surgiu de imediato. Ideia puxa ideia, o tema da fumaça e da reunião dos amigos pareceu-me necessário para ser uma história bem contada.
Você considera que sua mensagem ficou mais fortalecida com este trabalho?
A cada disco sinto que o “meu patrimônio” vai ficando mais completo. Conseguir aquilo que considero ser um mínimo de diversidade no meu trabalho é fundamental para uma certa noção de relevância pop, que a indústria tem vindo a destruir nas últimas décadas, e que é para mim a parte mais importante deste ofício.
No seu entender, porque é que a nova geração musical portuguesa ainda não obteve um reconhecimento mais generalizado?
Julgo que a música portuguesa ainda não flui como devia, de geração em geração, para permitir uma quantidade suficiente de música para isso… Olhando o exemplo brasileiro, e a maneira como uma cultura forte se multiplica em muitos gêneros e muitas línguas, com o passar do tempo, percebo que em Portugal ainda estamos longe de ter essa capacidade de invenção e renovação que poderia, a longo prazo, permitir a eterna juventude de um Caetano Veloso lado a lado com a sensibilidade ancestral de um Marcelo Camelo.
Na atual cena musical brasileira você encontra algumas pontes com seu trabalho?
A música no Brasil está num estado de maturação muito diferente da portuguesa. Há mais raízes e árvores, toda a gente deixou a sua escola. Além disso, há muitos músicos, talvez até uma maior dose de música no sangue. Os instrumentos tradicionais desenvolveram-se melhor. Há mais línguas e ideias. Por um lado, (fica) a sensação de que em Portugal está (quase) tudo por fazer, dá-me liberdade para ser qualquer coisa e todas as coisas ao mesmo tempo: posso comer a história e refazê-la só para mim; posso tentar fazer um tropicalismo e ser o formalista mais chato e consigo ser um antropófago sentimentalão. Não há muita música fundadora para eu venerar e posso importar tudo e continuar a ser um português na sua pequena cidade. Quando ouvi Marcelo Camelo pela primeira vez pareceu-me muito próximo: soava como um brasileiro sonhando com Portugal. Não posso fazer isso, mas posso ser o português sonhando com o Brasil.
Recentemente, você esteve para tocar em São Paulo, dentro num festival de música portuguesa que não se concretizou. O Brasil ainda está nos seus planos?
O Brasil está sempre nos meus planos e só não se concretizou ainda porque nunca conseguimos conciliar várias datas para compensar atravessar o oceano. Em breve, espero!
A música de B Fachada desperta simultaneamente paixões e incompreensões. Qual é a sua explicação para esta dicotomia?
Agrada-me que seja muito fácil não gostar: isso é uma grande recompensa para quem aprecia. Há música que toda a gente preza, alguma que somos obrigados a estimar e outra que só gosta quem quer. A minha é da última, mas tem que haver de tudo.
O que você imagina estar fazendo aos 40 anos?
Imagino-me fazendo discos de fim de carreira: muito experimentais ou conservadores demais, relevantes de menos e bastante caros.
– Pedro Salgado (siga @woorman) é jornalista, reside em Lisboa e colabora com o Scream & Yell contando novidades da música de Portugal. Veja outras entrevistas de Pedro Salgado aqui
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