por Leonardo Vinhas
O programa Unplugged, da MTV, virou uma franquia importante da indústria musical em quase todos os países onde ela existiu (e até mesmo fora deles), rendendo discos e DVDs que figurariam entre os mais vendidos dos artistas que o protagonizavam, e não raro ajudavam a reaquecer a carreira, reapresentando a banda para novos públicos e recuperando antigos admiradores. No Brasil, os exemplos de Cassia Eller, Titãs e Capital Inicial – para ficar entre os mais populares – estão aí para comprovar. E na MTV Latina também não foi diferente.
Porém, é curioso notar que muitos artistas não aderiram ao formato acústico, usando alguns ou mesmos todos os instrumentos eletrificados – na gringa, o caso mais exemplar foi de Jimmy Page e Robert Plant e seu “No Quarter: Unledded”. Na América Latina, Los Tres, Julieta Venegas e Tigres del Norte foram alguns dos poucos que seguiram à risca a proposta do programa. O que não quer dizer que os “transgressores” da norma não tenham reinventado suas próprias canções. Dentre um grande número de artistas latino-americanos (a maioria de Argentina, Colômbia e México), vale conferir o Top 5 que vem a seguir (todos na integra nos vídeos mais abaixo).
Los Fabulosos Cadillacs
Foi o primeiro unplugged realizado pela MTV Latina, registrado em 5 de maio de 1994. É mais lembrado por esse feito e pelo fato de o vocalista Vicentico – na época, um símbolo sexual para as adolescentes argentinas – ter se apresentado de saia. Porém, é necessário fazer justiça e lembrar-se do show pelo que ele tem de melhor: a música. Mesmo com guitarra e baixo plugados (ainda que sem muitos efeitos), e com Mario Siperman usando tanto piano como órgão elétricos, os arranjos valorizam mais os metais e a batida (conduzida tanto pela bateria de Fernando Ricciardi como pela percussão do falecido “Toto” Rotblat), dando mais suingue e vitalidade às execuções. Os Cadillacs estavam no auge de seu sucesso comercial, com sua melhor formação, e a empolgação e o entrosamento é visível. As versões de “Manoel Santillán, El León”, “Desapariciones”, “V Centenario” e “Siguiendo la Luna” (com citações a “Kaya”, de Bob Marley, e “Bad”, do U2) superam de longe as originais de estúdio. O combinado “El Genio Del Dub / Radio Kriminal”, com várias mudanças de andamento, homenagens a Cypress Hill e Ian Dury e um poderoso solo de trompete de Dany Lozano, é o ponto alto de um show com poucas canções (sete ao todo), mas que faz valer cada minuto. Nunca foi lançado em formato físico de nenhuma espécie (mas circula em versão bootleg com a capa acima).
Café Tacvba
Um dos mais famosos Unplugged latinos foi também um dos que mais tardou a ganhar formato físico: gravado em 1995, só virou CD e DVD dez anos depois – aparentemente, por um impasse comercial entre a MTV e a gravadora Warner (chegou a se especular que teria sido por causa de um suposto descontentamento da banda com sua performance). O repertório é tirado em grande parte do fundamental “Re” (1994), e se em estúdio a eletrônica às vezes diminui o vigor das canções do quarteto mexicano, neste show fica evidente o quanto elas são pop e bem elaboradas. O carisma e a presença de palco colaboram para reforçar o sentido pop, fazendo deste um espetáculo para ouvir e assistir. Detalhe: a faixa ”Una Mañana”, cover do cantor mexicano José José, não havia sido incluída na transmissão original, mas aparece no CD e no DVD.
Los Tres
Gravado em 1995 em Miami e lançado em CD (com o título “Los Tres MTV Unplugged”) no ano seguinte, é certamente o mais “roots” da série – não só por usar apenas instrumentos acústicos e até microfones de curto alcance, mas principalmente por colocar em primeiro plano a influência do folclore chileno que caracteriza a banda, principalmente do ritmo conhecido como cueca. É certo que a morte de Roberto Parra, tio-avô do guitarrista Ángel Parra e mentor musical e espiritual da banda, ocorrida poucos meses antes, teve grande impacto para isso, influenciando na concepção dos arranjos e na escolha do repertório, que inclui covers de três temas do finado músico: “El Arrepentido”, “La Vida que Yo He Pasado” e “Quien Es la que Viene Ahí”. Uma homenagem justíssima, com a beleza da música superando a dor da ausência.
Soda Stereo
É um dos Unplugged mais “trucados” em seu conceito: já na segunda música, Gustavo Cerati troca o violão pela guitarra e não volta ao instrumento acústico; Zeta Bosio nem se dá ao trabalho de usar um baixolão ou similar, usando até pedais em seu baixo elétrico; o tecladista convidado Tweety Gonzaléz tem até um sampler à sua disposição e o baterista Charly Albertí recorre a um pad de percussão eletrônica para completar seu kit. Se falha em ser “desplugado”, por outro lado sucede em ser um grande momento da banda. Até entre detratores do Soda Stereo há quem admire o resultado final, pois a banda conseguiu – como nunca fez antes nem faria depois – combinar suas influências aparentemente inconciliáveis: progressivo, folk, pós-punk e rock inglês dos anos 1980. A recriação de “En la Ciudad de la Furia”, com participação vocal de Andrea Echeverría (da banda colombiana Aterciopelados) e o cover de “Genesis”, da banda argentina Vox Dei, são clássicos em uma apresentação feita toda de pontos altos. Gravado em 1996, teve sete canções incluídas no álbum “Comfort y Música para Volar”, editado no mesmo ano, que incluía ainda quatro inéditas de estúdio, sobras do disco “Sueño Stereo” (1995). Em 2007, foi lançada uma versão do álbum sem essas quatro faixas, porém com a íntegra da apresentação na MTV (também presente no DVD de mesmo nome).
Spinetta y Los Socios del Desierto
Sé não dá para chamar Luis Alberto Spinetta de “maior instituição da música argentina” porque caracterizações do tipo são sempre temerárias, é difícil não se impressionar com a obra do “Flaco”: com suas muitas bandas (Almendra, Invisible, Pescado Rabioso e outras) ou em carreira solo, Spinetta trouxe jazz, folk, blues, rock e pop classudo à canção argentina, e criou um estilo próprio, inimitável e inconfundível, mesmo que muito plural. Este Unplugged foi feito em 1997 e lançado com o título de “Estrelicia MTV Unplugged”, creditado a Spinetta y Los Socios del Desierto, banda que manteve entre 1994 e 2000 com o baixista Marcelo Torres e o baterista Daniel Wirtz. Foi a mais extensa de todas as apresentações (74 minutos), e repassou destaques do lado mais sofisticadamente pop da extensa discografia do compositor. Os teclados (elétricos) e a presença de uma orquestra em algumas faixas buscam o grandioso, mas Spinetta garante que isso jamais esbarre para a grandiloquência. O disco traz um tema instrumental inédito, “Garopaba”, não incluída na exibição televisiva. Uma nota triste: dois dos Socios del Desierto – Daniel Wirtz e o próprio Spinetta – já são falecidos (Wirtz morreu em 2008, e “El Flaco” em 2012)
– Leonardo Vinhas (@leovinhas) assina a seção Conexão Latina (aqui) no Scream & Yell.
Leia também:
– Entrevista => Los Tres: “O rock não cabe em uma etiqueta, em um visual” (aqui)
– Cinco músicas para entender… Los Fabulosos Cadillacs (aqui)
– Café Tacvba: “Talvez estejamos numa etapa mais épica em nossas vidas” (aqui)
Desses dae mesmo so escutei o do Soda Stereo, que é sensacional, essa versão do Ella uso mi cabeza como un revolver é matadora.
Vou ver se scuto mais dos outros.