Para Entender: The Replacements

por Tiago Agostini

Ao lado do Hüsker Dü, o Replacements foi uma das duas grandes bandas de indie rock a sair de Minneapolis nos anos 1980 – a mesma cidade do contemporaneo multiplatinado Prince. Formada pelos irmãos Bob (guitarra) e Tommy Stinson (baixo), Chris Mars (bateria) e Paul Westerberg (voz e guitarra), o Replacements lançou sete discos nos 12 anos em que esteve na ativa – quatro deles e um EP com a formação original – antes de acabar em 1991. Em agosto de 2013, 22 anos após o último show, eles subiram ao palco do Riot Fest, em Toronto, para o primeiro de três shows de uma volta improvável.

Tudo começou a se ensaiar quando Westerberg e Tommy, o Stinson mais jovem, se reuniram no final de 2012 para gravar o EP “Songs For Slim”, parte de um projeto para arrecadar dinheiro para Slim Dunlap, ex-guitarrista da banda, que sofreu um derrame em fevereiro de 2012. Colocado para leilão virtual, “Songs For Slim” levantou US$ 106,75 mil, uma média de US$ 427 por cada uma das 250 cópias da edição limitada do vinil de 10″. A edição gravada por Frank Black para o mesmo projeto, por exemplo, arrecadou “apenas” US$ 7,2 mil.

Os dois remanescentes seguiram caminhos distintos: Westeberg teve uma prolífica carreira solo que inclui duas músicas na trilha sonora de “Singles”, o filme de Cameron Crowe que flagra a cena grunge de Seattle, enquanto Tommy acabou tocando baixo na atual encarnação do Guns n’ Roses. Para os shows, os dois chamaram Dave Minehan (guitarra) e Josh Freese (bateria).

A volta como headliner de um festival com três datas – a banda ainda toca em Chicago, no dia 15 de setembro, e em Denver, no dia 21 – não deixa de ser uma ironia para uma banda que primou pela autosabotagem nos anos áureos. Famosos por shows imprevisíveis e comportamento errático, eles podiam, pelos relatos da época, serem a melhor ou a pior banda do mundo em uma noite. Tudo dependia do humor dos quatro – e da quantidade de álcool e drogas consumidos. O abuso de substâncias lícitas e ilícitas culminou com a traumática saída de Bob, em 1986, antes da banda lançar “Pleased To Meet Me”.

Com seus solos estridentes e rápidos, Bob era o contraponto sujo à habilidade de compositor pop de Westerberg, e sua saída marcou o inicio do fim da banda, que, enquanto se desmantelava, gravou mais dois álbuns: “Don’t Tell a Soul” (1989) e “All Shook Down” (1990), este segundo planejado para ser o primeiro disco solo de Westerberg.

Porém, em seu auge criativo, o Replacements lançou dois discos perfeitos, capazes de agradar o indie e o mainstream: “Let It Be” (1984) – com a icônica capa no telhado dos Stinson – e “Tim” (1985). O primeiro é, fácil, um dos maiores discos de rock já gravados. Sua faceta pop chamou atenção da Sire Records, subsidiária da Warner, por onde o segundo foi lançado. Enquanto o Hüsker Dü e boa parte do alternativo norte-americano apostava em temas políticos e de confrontação, Westerberg e o Replacements falavam sobre as angústias da adolescência e juventude com sinceridade única.

Ouvir “Let It Be” e “Tim” é como assistir a um filme de John Hughes.

Abaixo, cinco músicas para entender por que esta é a principal volta musical do ano.

“I Will Dare”
Em 1983, o Replacements quase foi expulso de uma turnê de oito datas abrindo para o R.E.M., graças ao seu comportamento na estrada. Apesar dos problemas, Peter Buck emprestou sua guitarra a esse rock anos 50 dançante que abre “Let It Be”

“Alex Chilton”
Homenagem ao líder do Big Star. Precisa dizer mais?

“Bastards of Young”
O riff e o grito iniciais são a introdução perfeita para uma música que fala dos baby boomers (Westerberg nasceu em 1959) e a geração que os seguiu, com sonhos não realizados, formados em universidade, mas sem habilidade para nada na vida. Se você já teve 18 anos, sabe exatamente do que Westerberg está falando.

“Here Comes a Regular”
Última música de “Tim”, espécie de hino de todas as pessoas comuns do mundo. No vídeo, Westerberg brinca com a frase que resume a autosabotagem da banda ao longo da carreira: “Here comes a regular, and here goes a career”.

“Unsatisfied”
Em um artigo sobre composição musical para o New York Times em maio de 2013, Westerberg deixava uma dica importante: “Ignore a gramática algumas vezes. Eu nunca teria escrito uma música chamada Dissatisfied.” O erro proposital resultou na obra prima da banda, uma balada tão intensa quanto uma boa balada pode ser. Poucas músicas encapsulam tão bem as agruras de amadurecer e muitas vezes estar perdido na vida. “Look me in the eye and tell me, that you’re satisfied”, resume, em voz rasgada, Westerberg no refrão.

– Tiago Agostini (@tiagoagostini) é jornalista e escreve para o Scream & Yell desde 2006

Leia também:
– Belíssimo epitáfio, “All Shook Down” ganha reedição dupla e ainda comove (aqui)
– “Songs for Slim”, The Replacements: parece pouco, mas é mais que suficiente (aqui)
– “Stereo / Mono”, uma aula de independencia de Paul Westerberg (aqui)
– Áudio: Ouça a íntegra do show de volta dos Replacements no Trabalho Sujo (aqui)

10 thoughts on “Para Entender: The Replacements

  1. Tiago, além dos que você citou, “Let i be” e “Tim”, acho “Pleased to Meet Me” (1987) um discaço. Tenho este em vinil. O lado B é soberbo. E sua comparação foi sensacional: ouvir Replacements é como assistir um filme do John Hughes. É nostálgico sem soar deprê.

  2. amei o artigo, sou muito fã de replacements e é uma pena os brasileiros não conhecerem muito a banda, não sabem o q tão perdendo!

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