Texto e fotos por Marcelo Costa
Em sua 14º edição, o Festival Casarão, em Porto Velho, reuniu 18 atrações divididas em três dias de shows: os dois primeiros em uma pequena casa noturna, o Pioneiros Pub (que numa edição anterior presenciou um show do Dead Fish que ficou marcado entre o público), e que em 2013 recebeu os dois principais headliners do evento: o grupo carioca Matanza (uma das atrações mais pedidas pelos porto-velhenses) e o cantor Nasi, ex-vocalista do Ira!, em carreira solo.
Com um line-up que talvez não chamasse muita atenção em capitais do Sudeste, o Festival Casarão comemorou três dias de casa cheia. A primeira noite, encabeçada pelo Matanza, esgotou os 600 ingressos (e teve gente ainda que ficou pra fora). A segunda, que trazia Nasi, não chegou a ficar sold out, mas cerca de 500 pessoas bateram ponto na casa de shows enquanto a noite de sábado, gratuita na Praça Mercado Cultural, arrastou uma bela multidão.
Ponto positivo: boa parte da escalação do festival é completamente desconhecida fora da Região Norte (alguns nomes nem na própria cidade), o que mostra a correção da ideia de line-up da produção do Casarão: levar uma atração que arraste um bom público apresentando-o assim a jovens artistas da nova geração da cidade, da região, ou mesmo de outros Estados. Perfeito. O Casarão acerta no ponto em que a maioria dos festivais brasileiros erra.
Ponto negativo: das 18 atrações da edição 2013 do festival, 8 também se apresentaram na edição de 2012 – Sub Pop e Versalle pelo terceiro ano consecutivo. Há o desconto de que cinco destes oito nomes tocaram ao ar livre gratuitamente (embora três destes voltassem pelo segundo ano consecutivo ao palco da praça – Beradelia pelo terceiro), mas ainda assim é uma repetição exagerada de artistas de um ano para o outro.
A cobrança deve-se ao fato de que muitas dessas bandas têm potencial de sobra para impressionar o público de outras cidades e festivais, e parecem ficar presas ao que está na mão. Ok, não é fácil circular no Brasil, e não recomendo vender seus ideais para organizações que estão mais preocupadas com política do que com cultura, mas uma conversa mais próxima entre os integrantes da FBA (Festivais Brasileiros Associados) poderia render bons frutos.
Ainda assim, é preciso festejar o Casarão (que em 2014 completará 15 anos) como um evento corajoso em uma cidade de difícil acesso e longe demais das capitais. O que se viu nos três dias de evento deste ano foi uma profusão de bons shows de artistas que estão longe de rádios, TVs e grandes jornais, mas tem a capacidade de conquistar a atenção do público com canções próprias. Não é pouco. Neste ponto, a produção do festival está de parabéns. Abaixo, dia a dia do Casarão 2013.
23/05 – Quinta-Feira
Assim como no ano passado, o primeiro dia cheio do Casarão é um tributo ao rock and roll básico e sem firulas, algo que não tem muito a ver com o bom som indie do trio Os Últimos, da cidade de Ariquemes, uma das primeiras bandas a se apresentar nos dois anos. Novamente, Laura (bateria), Rogério (baixo) e Keverton (guitarra e voz) mostraram uma boa performance, que carece de contato com a plateia, mas convence. De Cuiabá, e já veterano de estrada, o trio Branco ou Tinto mandou bem ao avisar o pessoal do gargarejo (que pedia covers de bandas clássicas como Led e AC/DC) que “esses caras não querem saber de vocês. Nós queremos e vamos tocar o nosso som”. O som: rock and roll clássico bem tocado.
De Uberlândia, o Leave Me Out mostrou sua pegada grunge destacando o bom vocal carregado de Bruno, e conquistou vários fãs de preto, mas o grande show da noite foi o retorno do Maria Melamanda, respeitada banda local que misturou canções novas e velhas levando o público ao delírio. O som e as letras pagam tributo ao rock nacional dos anos 80, e o grupo deixou o palco merecidamente ovacionado. Fechando a primeira noite, o Matanza honrou o pedido dos fãs que colocaram a banda como atração mais desejada do festival, e fez uma baita apresentação de countryhardcore. O vocalista Jimmy foi além e convocou todos os presentes a entrarem no “Clube dos Canalhas”, e o pogo rolou bonito na pista do pub.
24/05 – Sexta-Feira
Duas bandas do Estado que fizeram bons shows em 2012 mostraram evolução no segundo dia do Casarão 2013. A Sub Pop, da cidade de Vilhena, que ao contrário do que o nome prenuncia, é fiel seguidora das barbas do Los Hermanos (e não do grunge de Seattle), voltou a repetir o bom show, e merece uma chance do lado de cá da linha do Equador (boa sacada encerrar o show com uma cover fiel de “O Tempo”, do Móveis). Os locais do Versalle, no entanto, parecem que progrediram muito mais neste meio tempo, e apesar do show curto, mostraram maturidade e confiança. Momento bizarro da noite: Dimazz Trio tocando uma versão de “Vem Quente Que Estou Fervendo” sobre a base de “Seven Nation Army”, do White Stripes.
Alguns degraus acima, o reformulado Mezatrio – banda de Manaus surgida em 2004, com disco lançado em 2007 e boa estrada em festivais e capitais – fez um dos grandes shows do festival. Com single novo na praça (assista ao clipe de “Qualquer Um”) e álbum em pré-produção, os amazonenses, comandados pelo vocalista e guitarrista Paulo Lins, mostraram uma sonoridade forte calcada no rock alternativo dos anos 90 e prometem bastante com o disco novo. Fechando a noite, Nasi subiu ao palco valorizando sua porção interprete. De Raul (“Rockixe” e “As Minas do Rei Salomão”) e Garotas Suecas (“Tudo Bem”) a Willie Dixon (“Hoochie Coochie Man”) e Cazuza (“O Tempo Não Para”, com verso trocado: “Procurando uma agulha no palheiro” vertida para “Procurando uma puta num banheiro”) até, claro, Ira!, Nasi mostrou vigor e lucidez provando que o título de seu penúltimo álbum não era à toa: ele está muito vivo na cena.
25/05 – Sábado
O dia gratuito do Festival Casarão mostrou variedade para um excelente público que lotou a Praça Mercado Cultural. Entre os destaques, os veteraníssimos Os Coveiros fizeram uma trilha sonora perfeita para o pogo. Muito hardcore e trash metal antecipando o novo disco dos caras, que deve sair pra logo. De posse de uma pá, o carismático vocalista Giovanni Marini (professor, mestre e geógrafo, que dá aulas na Universidade Federal de Rondonia e é admirado pelos alunos) devia baixar com sua banda para o Sudeste para mostrar para um monte de bandinhas como fazer barulho no palco. Na sequencia, Beradalia. Reforço o que escrevi no ano passado: eis uma banda que é forte concorrente à produto de exportação de Porto Velho. Um pouco de regionalismo, rock and roll, poesia, uma coisa meio hippie, mas que funciona e, sim, tem muito mais a dizer ao cidadão porto-velhense do que ao carioca ou ao paulista, mas tem estofo para conquistar um bom público fora das divisas da cidade.
De estreante na edição passada para um dos destaques da escalação de 2013, o grupo Kali e os Kalhordas sofreu com a equalização de som (fato que não aconteceu em nenhuma das outras apresentações), embolada e apitando, até o meio da apresentação, e gastou material próprio ao inserir duas covers no repertório: uma ótima releitura de “Esquadros”, de Adriano Calcanhoto, e uma versão confusa de “Eu Sou Neguinha”, de Caetano Veloso. Ainda assim, um bom show, que foi atropelado pela empolgação rock and roll dos brasilienses do Cassino Supernova. Responsáveis por uma das melhores apresentações do ano passado, mas desta vez tocando em praça pública, o quinteto mostrou pique de sobra para arrebatar uma plateia que, provavelmente, nunca tinha ouvido falar neles, e deve ter saído apaixonada pelo som forte e empolgante que saia das caixas de som. É apenas rock and roll, mas o público gosta, e esgotou todos os CDs que a banda levou para vender após o show. Merecido. Uma entrega absurda em uma apresentação contagiante. Bonito de ver e ouvir. Fim do Casarão 2013. Que venha o Casarão 2014. Baile de Debutante, hein.
Top 5 Festival Casarão 2013
01) Nasi
02) Mezatrio
03) Cassino Supernova
04) Beradalia
05) Os Coveiros
– Marcelo Costa (@screamyell) é editor do Scream & Yell e assina a Calmantes com Champagne
O Scream & Yell viajou para Porto Velho a convite da produção do Festival Casarão.
Leia também:
– Balanço: os destaques do Festival Casarão 2012, por Marcelo Costa (aqui)
– Balanço: os destaques do Festival Casarão 2010, por Tiago Agostini (aqui)
Putz, o Nasi tá gordo pra cacete.