entrevista por Renan Guerra
O Festival MixBrasil é o maior evento cultural dedicado à diversidade na América Latina e um dos maiores do mundo. Em 2022, o Festival MixBrasil celebra 30 anos de existência com o tema “Toda Forma de Existir”. De 9 a 20 de novembro, o evento traz 119 filmes de 35 países e de 12 estados brasileiros, experiências XR vindas da França, Holanda, Taiwan, China e Chile, seis espetáculos teatrais inéditos, shows musicais, o clássico Show do Gongo, literatura, performances, palestras e workshops sobre temas relevantes para comunidade LGBTQIA+, além de homenagear com o prêmio Ícone Mix a artista multimídia Linn da Quebrada. É muita coisa!
Esse ano o MixBrasil ocupa diferentes espaços da cidade de São Paulo: o CineSesc, o Espaço Itaú Augusta, o Centro Cultural São Paulo, o Teatro Sérgio Cardoso, o MIS – Museu da Imagem e do Som, a Biblioteca Mário de Andrade e o Cine Olido. Com exceção do Espaço Itaú Augusta, em que os ingressos custarão o valor único de R$20, todos os outros espaços terão ingressos gratuitos, basta chegar uma hora antes para a retirada (sujeito a lotação). Além disso, o festival também contará com uma programação online que estreia a partir de 14 novembro e poderá ser assistida gratuitamente pelas plataformas do Sesc Digital e Spcine Play.
Entre os destaques da programação, estão os filmes “Três Tigres Tristes”, de Gustavo Vinagre, vencedor do prêmio Teddy de Melhor longa no Festival de Berlim; “Close”, de Lukas Dhont, vencedor do Grand Prix no Festival de Cannes e indicado da Bélgica ao Oscar; ““Nelly & Nadine”, ganhador do Teddy de Melhor Documentário em Berlim; “Girl Picture”, premiado em Sundance e indicado da Finlândia ao Oscar 2023; “Winter Boy”, novo longa do francês Christophe Honoré; “Túnica Turquesa”, de Maryam Touzani, lançado na mostra Un Certain Regard no Festival de Cannes e indicado do Marrocos ao Oscar 2023; “Girl Picture”, que ganhou o prêmio do público em Sundance; e “Fogo-Fátuo”, novo filme do português João Pedro Rodrigues, exibido na Quinzena dos Realizadores.
Nesses 30 anos, o MixBrasil se transformou em um espaço de resistência e de celebração das diferentes formas de ser, por isso é muito belo que essa edição tenha como norte a ideia de “Toda forma de existir”, ainda mais após dois anos em que o Festival funcionou de forma híbrida em função da pandemia. Para entender um pouco mais sobre a história do MixBrasil e as mudanças pelas quais o festival passou em sua trajetória, André Fischer, idealizador e diretor do Festival, respondeu a três perguntas do Scream & Yell e você pode conferir suas respostas na íntegra abaixo:
Nesses 30 anos o Festival MixBrasil vivenciou diferentes momentos da história do país, tornando-se um espaço de celebração e resistência, tanto que nessa edição vocês celebram todas as formar de existir. Nesse sentido, você sente que o Festival chega a sua 30ª edição ainda mais forte e resistente?
Nesses 30 anos passamos por todo tipo de situação. No começo quando não havia nenhum tipo de apoio à causa LGBTQIA+ tivemos que nos organizar de forma independente para viabilizar o evento e até mesmo a produção audiovisual sobre essa temática. Criamos uma das primeiras redes sociais do mundo, que mobilizou a comunidade e garantiu recursos e equipe para a realização do MixBrasil nos anos 90. Foram necessários 10 anos até que viessem os primeiros patrocinadores! Depois disso tivemos sites, revistas, programas de radio e tv, as conquistas sociais e de direitos que ocorreram a partir do começo dos anos 2000 fizeram que por um momento parecesse que a parada estava ganha para nosso lado, e talvez o próprio festival em algum momento não fizesse mais sentido. Mas vimos uma reação forte do conservadorismo e os ataques à diversidade foram se institucionalizando. E mais do que nunca vimos como é importante a manutenção de um espaço seguro para o encontro da comunidade em torno da produção cultural LGBTQIA+. Que por sinal, está mais forte e viva do que nunca, até mesmo como uma resistência aos possíveis retrocessos que felizmente conseguimos barrar.
As duas últimas edições foram híbridas em função da pandemia, como você percebe que essa experiência modificou o festival? Nesse ano teremos alguns filmes disponibilizados de forma on-line, você acredita que esse modelo híbrido é uma possibilidade cada vez mais constante?
Alguma parte da programação disponibilizada através de plataformas digitais provavelmente continuaremos a ter, assim como a maioria dos festivais. É positivo que mais pessoas que não poderiam estar presentes nas salas possam ver alguns filmes. Mas há algumas questões a serem consideradas. A começar pelo fato de que a maioria das distribuidoras de filmes está limitando a veiculação de seus lançamentos no digital, já que esse é o canal principal para a indústria audiovisual e há o risco real de pirataria antes dos lançamentos. As salas de cinema são vistas como um lugar mais seguro e controlável para divulgar os filmes. Além disso, acredito que o sentido maior dos festivais é o encontro e a troca que só acontecesse de verdade no presencial. As mostras realizadas no online foram a possibilidade encontrada em um momento excepcional, dadas as limitações sanitárias impostas pela pandemia. Mas não têm, nem de longe, o mesmo impacto de compartilhar a experiência de ver filmes, peças, shows com outras pessoas.
Em 1993, o festival começou como uma mostra de curtas e hoje em dia é um espaço de congregação de diferentes artes, do cinema ao teatro, da música a literatura. Em retrospectiva, como você vê o MixBrasil e toda a história que vocês construíram até aqui? Mais que isso: como você vislumbra o futuro do festival?
Fomos ampliando nossa programação para além do cinema experimental já partir da segunda edição, como forma de ampliar o público, mas também para dar visibilidade a toda essa produção que se expandia pelo teatro, música, artes visuais e no universo digital. Já em 1996 fazíamos a primeira mostra de vídeos online, como forma de expandir o alcance do festival, em 1999 começamos a cobrir a cena teatral e no ano seguinte os shows de música. Esse ano estamos abrindo uma nova frente, das experiências imersivas e virtuais. Acredito que seja esse o caminho não apenas do MixBrasil, que sempre teve uma forte conexão com novas tecnologias, mas de todos os festivais. Agregar novas linguagens, novos meios , como forma de manter relevante o encontro ao redor da produção cultural. No nosso caso temos uma causa e uma temática que está acima dos formatos, o que abre espaço para uma constante investigação e nos provoca a estarmos sempre buscando o que de mais interessante tem sido produzido sobre a diversidade sexual.
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– Renan Guerra é jornalista e escreve para o Scream & Yell desde 2014. Faz parte do Podcast Vamos Falar Sobre Música e colabora com o Monkeybuzz e a Revista Balaclava.