por Leonardo Vinhas
“Gingo”, Gingo (Independente)
Se você só lesse “o quarteto Gingo faz um som instrumental dançante”, poderia pensar que se trata de mais uma das bandas que tentam mascarar a falta de qualidade compositiva com um arremedo de afrobeat – uma estética que cola bastante por aí. Mas embora a frase entre aspas seja verdadeira, a banda é bem mais que isso. Tem elementos africanos e brasileiros, sim, e até uma aberturazinha para a psicodelia (principalmente via dub), mas a coisa toda consegue ser coesa, e quase pop (tente não cantarolar “Malagueta” e “Carbonara”, por exemplo). Outro feito pouco comum que eles conseguem é soarem em estúdio com o mesmo punch dos palcos. Formado por músicos experimentados que também atuam no Bixiga 70, The Ráulis e Joseph Tourton, o Gingo faz uma daqueles estreias que dá gosto.
Nota: 7
“Selo Multicromal de Goya”, Aminoácido (Independente)
Frank Zappa, vanguarda paulista, Hermeto Paschoal, Mr. Bungle e uma dose generosa de cara de pau formam as influências do Aminoácido, quinteto de Londrina (PR). Trata-se de uma banda que conhece vários caminhos para chegar aonde quer, e todos são acidentados. O leme está sempre em três eixos: o groove, os tempos “quebrados” e um senso de brincadeira musical (é fácil acreditar que a banda está se divertindo horrores enquanto toca). Pela lista de referências (e pode acrescentar mais uma dose de p-funk entre os ingredientes da receita), já fica evidente que não é um som para quem gosta do formato canção mais tradicional, mas por trás da aparente anarquia, é uma direção artística clara, na qual o groove é o leme . Não é para todo mundo nem para toda hora, mas quem estiver a fim de (boa) música, que desafie o óbvio sem forçar a mão na esquisitice, faz muito bem em fuçar aqui. “Selo Multicromal de Goya” não é um disco novo, e sim uma caprichadíssima edição física (CD duplo) dos dois discos que a banda já gravou: o ótimo “Meticuloso’ (2017) e o tortão “Sem Açúcar” (2018). Para quem puder, é mais recomendável do que a audição pelo streaming. Afinal, a música do Aminoácido nunca se propôs a ser simples background e o cuidado com as duas bolachinhas convida a uma apreciação mais atenta e sem interrupções.
Nota: 7,5
Leia também:
– Entrevista: “O som do Aminoácido busca retratar cenas do nosso cotidiano”
“Hai Kai Ser”, Rodrigo Nassif Trio (180 Selo Fonográfico)
A agremiação gaúcha perdeu um integrante e um tiquinho do peso nos violões, mas compensou a ausência com espaço para incorporar sintetizador e aumentar a dinâmica de seu “folk jazz instrumental” (a definição é deles mesmo). Outrora Rodrigo Nassif Quarteto, o agora Trio solta esse EP de quatro faixas e deixa mais explícita sua influência jazzística (antes o folk era mais pronunciado), alargando um caminho que sempre foi pavimentado com música não só autoral, mas bastante particular. “Temos uma regra simples entre nós: se uma composição estiver ficando parecida demais com fulano ou beltrano, a gente despacha e passa pra próxima”, declarou Nassif ao S&Y. Neste EP, a proposta continua ousada, mas sem alienar o ouvinte. Na verdade, a banda parece ser das poucas no universo jazzístico brasileiro nas quais a investigação musical funciona não em função da técnica ou a favor da vaidade, e sim em favor do ouvinte.
Nota: 7,5
– Leonardo Vinhas (@leovinhas) assina a seção Conexão Latina (aqui) no Scream & Yell.
One thought on “Três CDs quase instrumentais: Gingo, Aminoácido e Rodrigo Nassif Trio”