Em
toda a cena do "novo rock americano", o nome Interpol destoa
de seus concidadãos nova-iorquinos White
Stripes e Strokes por uma razão muito simples: enquanto
essas duas bandas (e mais um monte de imitadores) buscam inspiração
nas frescuras glitter e hard, o quarteto que emprestou seu nome
do órgão policial internacional prefere as frescuras
do pós-punk inglês, notadamente Joy Division (no
som) e nos new romantics (no cuidado com a imagens, ainda que
com ternos escuros substituindo as plumas rosadas).
Daniel
Kessler (guitarra), Carlos Dengler (baixo), Paul Banks (bateria)
e Sam Fogarino (bateria) já estão de saco um pouco
cheio dessas associações, mas o fato é
que a audição do álbum de estréia
Turn On The Bright Lights (Matador/Trama) e uma espiada
nas fotos de divulgação confirmam essas idéias.
Claro, o espectro sonoro engloba outras influências (Television
e Echo AndThe Bunnymen, por exemplo), mas é inevitável
a associação com as sonoridades soturnas do fim
dos anos 70 e começo dos 80. Daniel Kessler atendeu ao
Scream & Yell por telefone e insistiu, de forma um
tanto repetitiva, que a personalidade da banda é mais
forte que as comparações. Bastante articulado
e falante, o discurso e a postura de Kessler fazem jus à
imagem que a banda veicula. Ouça você Turn On
The Bright Light para conferir se o mesmo se aplica ao seu
som..
S&Y
- Daniel, que tal estar na Matador?
Daniel
Kessler - Ótimo, bom mesmo, estamos muito felizes aqui,
é uma boa gravadora que conta com boas bandas e nos trata
com atenção e cuidado.
Em
uma entrevista recente para o Brasil, o baterista Sam Fogarino
declarou estar cansado da superficialidade com que jornalistas
tratam a banda, enfocando exclusivamente a semelhança
de seu som com o do Joy Division e seu cuidado com a aparência.
Isso realmente incomoda vocês?
Não
que seja esse o único foco, mas acaba sendo o mais recorrente.
O problema não é tocar nesses assuntos, mas sim
a maneira como eles são abordados. Você sabe, jornalistas
têm que manter seus leitores para continuarem com seus
empregos, e por isso eles insistem em assuntos fáceis
e de interesse geral. E é por isso que ficam insistindo
em questões de aparência, em como nós nos
vestimos e como encaramos isso. Nos perguntam as mesmas coisas
3.000 vezes, e tentamos sempre responder da maneira mais diplomática
possível, mas quando você faz perguntas que não
são muito interessantes, acaba obtendo respostas não
muito interessantes. Se você faz perguntas mais elaboradas,
não vai ter as respostas mais comuns, e seria bom que
explorassem melhor essas questões com perguntas mais
profundas e mais interessantes. Não é um incômodo,
portanto, mas é repetitivo e às vezes cansativo.
Sam
também disse que a turnê que vocês estão
fazendo parece interminável. Isso chega a desanimar?
Você
preferiria estar falando com o Sam, pelo visto, então
deveria perguntar isso a ele para saber. (risos - só
por parte dele...). Brincadeira. A turnê realmente é
extensa e vai levar muito tempo. Se você olhar nosso planejamento,
vai ver que daqui a muitos meses ainda estaremos excursionando
e viajando para lugares diferentes. Claro que isso cansa em
alguns momentos, e até podemos dar uma certa desanimada
por pouco tempo, mas isso não quer dizer que será
algo permanente. Os garotos têm sido os melhores possíveis,
têm aproveitado muito nossas apresentações,
e realmente gostamos do que fazemos no palco. Estaremos ainda
excursionando por muito tempo, mas como gostamos muito do que
fazemos e temos boa resposta do público, não acho
que estaremos desmotivados para tocar ao vivo, onde quer que
seja.
Há
alguma banda nova de quem vocês possam se considerar próximos,
bandas que vocês possam colocar junto ao Interpol? Bandas
com que excursionamos?
Não,
bandas em geral, cujo trabalho que vocês julguem próximo
do seu. Imagino que não seja nada do tipo White Stripes,
Strokes ou outras bandas de Nova Iorque, que a crítica
insiste em "agrupar"... Ora... pelo som, creio que nenhuma.
Fazemos o que gostamos, o que sabemos fazer, e música
é uma coisa tão pessoal que esse tipo de semelhança
não é algo que procuremos. Nossa música
é verdadeiramente pessoal, e não escutamos outras
bandas procurando proximidade ou pontos comuns ao que fazemos.
Fazemos o que sabemos, e acho que isso nos torna muito pessoais
e diferentes de outras bandas. Claro que há bandas novas
muito boas, como uma banda de Nova Iorque chamada Colla, uma
banda nova muito boa, e outros grupos novos de Nova Iorque,
que são muito bons e criativos. Mas o nosso som é
algo que fazemos por nós e para nós mesmos, não
estamos interessados em semelhanças. (Nota: o entrevistador
achou melhor nem dizer que Sam julga a banda próxima
aos Delgados...)
E
o que você tem ouvido ultimamente?
Discos?
Hmm, algumas coisas antigas de dub, como um grupo obscuro chamado
Gappa, Spacemen 3, Wilco
(Nota: ... e uma sequência interminável de bandas
independentes obscuras que fariam a alegria dos caçadores
de estranhezas).
E
de música brasileira, há algo que o atraia?
(Entusiasmado)
Sim, sim! É uma das razões de eu querer ir aí
(Brasil) um dia! Há muitas coisas boas que foram produzidas
nos últimos anos, a música eletrônica brasileira
é muito boa, algo que realmente gosto de ouvir. Há
ótimos DJs, como Patife (pronunciado de uma intrasncritível
maneira), e ótimos artistas como Bebel Gilberto, M4J
e Suba, um trabalho muito interessante e rico.
Você
é o terceiro ou quarto artista americano que me menciona
Suba. Parece que ele está ficando meio popular por aí?
(risos - dessa vez, só do entrevistador)
Não,
longe disso, esse tipo de música é bem pouco conhecida
e divulgada por aqui. É que artistas tendem a manter
contato entre si, trocando informações sobre discos
e artistas interessantes que venham de outros lugares, por isso
acabamos conhecendo músicas como a desses brasileiros
graças às trocas que fazemos um com o outro. E
é algo que nós quatro do Interpol gostamos, então
o que um consegue, acaba divulgando aos outros. Suba é
um que habitualmente agrada a todos que o ouvem por aqui.
Sim,
ele tinha um trabalho interessante, mas infelizmente faleceu
em 2001 antes que pudesse seguir em frente.
Mesmo?
Lamentável, eu não sabia disso.
Aqui
no Brasil, vocês estão sendo apresentados ao público
com os clichês que vocês já se cansaram:
uma banda de forte influência pós-punk, principalmente
do Joy Division, e muito preocupada com o visual. Vocês
acham que isso pode prejudicar o entendimento de sua música?
Não.
É como eu disse: fazemos o que gostamos e o que sabemos,
sabemos que nosso som é pessoal e muito particular, e
que os jornalistas tendem a ter a mesma apresentação
superficial para nosso trabalho porque é mais fácil.
Nós somos quem somos, e isso inclui a preocupação
com o visual, não só no modo como nos vestimos,
mas também nos vídeos, no nosso web site, no projeto
gráfico do disco. Mas, pelos jornalistas, é como
se disco em si não merecesse tanta discussão
como isso. É certo que realmente damos mais atenção
ao visual e à apresentação porque nossa
música é uma coisa muito pura e muito espontânea,
que não precisa de tanta atenção de nossa
parte. Fizemos nosso álbum como quisemos, ele não
é muito produzido porque assim o quisemos, mas ele mostra
muito claramente nossa identidade e o que gostamos de fazer,
e também nos dedicamos muito aos nossos shows. Por isso
nos preocupamos mais com nossa criação e com nossa
apresentação do que com o que escrevem sobre a
gente. Podem escrever o que quiserem, podem insistir nas mesmas
abordagens, o fato é que nossa música é
muito autêntica e pura e quem nos ouve pode ter sensações
proporcionadas pela música, sensações que
não serão afetadas pelo que as pessoas escrevem
sobre nós. Se a gravadora quer nos vender assim no Brasil,
não nos importamos. Quem nos ouve pode sentir nossa música
e senti-la independente de conceitos prontos.
Sei
que é cedo para falar sobre isso, mas você pode
adiantar o que seria diferente do Turn On The Bright Light
no próximo disco?
Não
dá para dizer, é difícil explicar nossa
abordagem, a forma como criamos nossas músicas. Nós
predizemos ou antecipamos o que vamos fazer, tocamos a música
que gostamos e que que temos vontade, de uma forma pura e natural
que acaba expondo como somos. Então não estamos
preocupados com isso agora, nem estaremos quando formos compor
para o próximo álbum. As canções
saem naturalmente, e sempre nos agradam.
Bem,
Daniel, é só. Muito obrigado pelo seu tempo e
atenção.
De
nada. Ei, tenha certeza que queremos muito tocar aí.
E certifique-se de que nosso som será entendido pelos
brasileiros, não importa como nos apresentem. Mas lembre-se
que nós não somos uma banda vazia, temos uma música
que pode ser sentida pelo público brasileiro e queremos
muito que esse público nos veja ao vivo.
Tem
sido difícil para artistas estrangeiros virem ao Brasil.
Alguns estão com medo de voar por causa do conflito entre
Iraque e Estados Unidos, outros são economicamente inviáveis,
já que a taxa de câmbio entre o dólar e
nossa moeda está muito alta. Mas é claro que há
um interesse por parte dos brasileiros em vê-los ao vivo.
É
uma pena haver esses problemas. Mas se conseguirem contorná-los,
estaremos aí.
Ok,
ok. Eu vou fazer o possível para ser o menos chato possível
nesta resenha. Turn On The Bright Lights não é
só uma bela capa e os caras não só se vestem
bem. O som que sai pelas caixas acústicas faz o ouvinte
retornar no tempo, buscando tristezas perdidas ou, muitas vezes,
a própria adolescência.
Não
vou ser outro a enfileirar o número de bandas a quem
o Interpol paga tributo em Turn On The Bright Lights.
É só ouvir a linha de baixo e lembrar de uma.
Pegar canções indistintas como Obstacle 1
ou NYC e reconhecer a voz de outro. É olhar as
fotos é reconhecer a influência.
Assim,
se em termos de originalidade a banda deva um bocado no cartório
pop, a questão que fica é: eles fazem isso bem
ou não? Sim. O quarteto estudou direitinho seus objetivos.
O instrumental é pesado, gélido, rock. O vocal
emociona. Os arranjos matam a pau.
Desde
que saiu no Brasil, Turn tem feito uma boa carreira nas
lojas indies paulistanas. Chegou a esgotar uma primeira tiragem
e continua sendo um dos destaques de 2003, isso sem tocar nenhuma
canção em rádio. Até isso o Interpol
conseguiu ressuscitar: a divulgação boca a boca.
O
único detalhe que incomoda nessa releitura toda é,
um-dois-três: história. Sabe todas as tais bandas
que muita gente associa ao Interpol? Então, elas são
beeeemmmm melhores. Se tivesse surgido na virada da década
de 70 para os 80, o Interpol com certeza seria uma das grandes
bandas de todos os tempos da história da música
pop. Com vinte anos de atraso, o grupo consegue uma boa sacudidela
na memória. Você lembra? Não? Nem tinha
nascido?
Desculpa
ai, eu estou velho demais... e chato.
Mas
que fique dito que é um bom disco...
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