Piratas do Caribe: A Maldição do Pérola Negra
por Diogo Mattos
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01/09/2003

Piratas do Caribe – A Maldição do Pérola Negra começa com uma apresentação dos personagens principais. A filha do governador Swann (Johnathan Pryce), Elizabeth (Keira Knightley), é cortejada pelo recém-promovido comodoro Norrington (Jack Davenport). Mas a moça gosta mesmo é do ferreiro Will Turner (Orlando Bloom), que, ainda garoto, foi encontrado no mar como o único sobrevivente de um ataque pirata. Nesta ocasião, ele carregava um misterioso colar, que Elizabeth acaba ficando para si. Até que chega o dia em que o navio Pérola Negra, com uma tripulação de mortos-vivos comandada pelo capitão Barbossa (Geoffrey Rush), chega à cidade com uma missão: roubar o colar que terminará com a maldição que fora lançada sobre eles e os fará ganhar a condição de seres vivos novamente. Ah, e ia esquecendo de um detalhe importantíssimo, aliás, fundamental: neste meio tempo, chega à cidade o pirata Jack Sparrow (Johnny Depp). Embora nem tão necessário à trama principal, ele é a razão de ser do filme, como explicarei mais adiante. Acaba reconhecido e preso. Mas Barbossa, além do colar, acaba levando Elizabeth junto. Então, o apaixonado Will liberta Jack da prisão, e os dois partem atrás de Barbossa, cada um com um objetivo diferente: o ferreiro quer libertar a amada, e o pirata quer mesmo é reaver seu Pérola Negra, o mais veloz navio do Caribe, roubado por Barbossa. 

Aproveite bem este princípio de filme, que dura mais ou menos uma hora. Divirta-se um pouco com os personagens, que são legais. Principalmente Jack Sparrow, uma espécie de herói sem o menor senso de ética, algo em extinção no cinema. Porque, a partir da primeira hora, o filme só vai caindo. Primeiro, pela previsibilidade dos acontecimentos. Depois, pela longa duração do filme, de duas horas e vinte minutos (aliás, por que os filmes ultimamente estão tão longos?). E, por fim, pelo enredo no qual o filme se sustenta. Já vi filmes onde o objetivo do vilão é se tornar imortal, mas nunca o contrário. O monólogo que Geoffrey Rush faz para justificar a busca pela mortalidade é patético. O argumento parece ter sido colocado lá apenas para justificar efeitos especiais dispensáveis – e fazer a alegria da molecada que vai aos cinemas. Lá pelas tantas, a gente não agüenta mais ver lutas entre Depp e Bloom contra os mortos-vivos. Se os inimigos são imortais, qual a graça? Ou seja, tirando o principal, o filme é bom. O que equivale a dizer que o almoço não foi bom, mas a sobremesa estava uma delícia. 

A sobremesa, no caso, atende por Johnny Depp. Ele é a principal razão para se assistir a Piratas do Caribe. Sua caracterização e atuação são engraçadas, com dentes de ouro, uma maquiagem bizarra e trejeitos variando entre a excentricidade e a boiolice mesmo. O cara aparenta estar se divertindo à beça no papel. Segundo o próprio Depp, a inspiração para seu Jack Sparrow foi o guitarrista dos Rolling Stones, Keith Richards. Para ele, os piratas eram estrelas no século XVII da mesma forma que os grandes rockeiros são hoje. A canastrice escancarada é hilária, embora por vezes tive a impressão que Depp se esquecia de que havia construído seu personagem desta forma, e passasse a atuar mais contidamente. O que é uma pena, já que são nestas cenas - da metade para o final - que o filme se torna menos interessante. Ou seria o contrário, as cenas desinteressantes é que afetaram o humor de Depp? 

Outro que abre mão de anos de aprimoramento dos dotes artísticos para se divertir sem preocupações é Geoffrey Rush. Se bem que, para Rush, a canastrice não é novidade alguma (vide A Casa da Colina). Sobre Keira Knightley, não há muito mais a dizer a respeito da moça além de que ela é uma graça. E Orlando Bloom, este deve aproveitar enquanto puder a fama que o Legolas de “O Senhor dos Anéis” lhe proporcionou. O cara não tem muito carisma nem senso de humor e, se não surpreender se revelando um bom ator em uma produção mais séria, vai acabar caindo no esquecimento logo, logo. 

A produção de Piratas do Caribe fica por conta de Jerry Buckheimer. Nem vale a pena alongar muito falando no currículo desastroso do cara (60 Segundos, Armaggedon, Falcão Negro em Perigo). Também não convém falar das idéias "geniais" do homem – que outra pessoa faria um filme baseado em um parque temático da Disney? Entretanto, há algo no sujeito que o faz atrair nomes de respeito para os elencos de seus filmes. Seria uma lábia excepcional? Ou um faro para achar atores que estejam passando por sérias dificuldades financeiras – aliado a um belo saco de dinheiro? A verdade é que o produtor é o responsável por atrair para o lado negro do cinema nomes como Nicolas Cage, Ed Harris, John Malkovich e, agora, Johnny Depp e Geoffrey Rush. Sujeitos mais acostumados a variar entre o circuito independente e o artístico e, quando fazem produções hollywoodianas, procuram roteiros mais ousados e originais. Entretanto, nunca as escolhas de Buckheimer se mostraram tão acertadas quanto em Piratas do Caribe

A direção de Piratas do Caribe fica por conta de Gore Verbinski. Da mesma forma que a maioria dos diretores dos filmes de Buckheimer, ele é apenas um funcionário obediente. Não está lá para dar idéias, sua missão é apenas não comprometer, sem acrescentar nada autoral. Se bem que, no caso de Verbinski, quanto menos ele der toques pessoais ao filme, melhor. Vide seus trabalhos mais recentes (A Mexicana e O Chamado). 

Ao contrário de obras mais "profundas" desta temporada, como Matrix Reloaded e Hulk, Piratas do Caribe é filme-pipoca puro. Talvez isto explique seu imenso sucesso nas bilheterias. Apesar de trazer um tema extremamente antiquado e fora de moda como piratas, o filme é o que mais se adequa ao gosto dos adolescentes atuais. Nem é preciso muito esforço para entender tramas pseudo-filosóficas ou pseudo-psicológicas. Não descobrimos que o mundo real em que os piratas vivem é uma realidade virtual dentro de outra relidade virtual, e nem que o comportamento do protagonista é determinado por traumas de infância (teria Jack Sparrow sido criado pela avó e pelas tias?). Para assistir Piratas, só é necessário um pequeno esforço. Precisa-se fazer vista grossa para os defeitos – que não são poucos –, segurar o sono a partir da metade do filme, fingir se surpreender com as obviedades do roteiro e às vezes tampar os ouvidos para não enjoar daqueles barulhinhos de lutas de espadas. De resto, é só aproveitar as boas cenas - coincidentemente ou não, em todas elas Johnny Depp divide a tela com alguém. Se você fizer tudo isso, o filme até poderá ser uma boa diversão. 

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