Boteco: Cinco cervejas belgas

por Marcelo Costa

Abrindo uma série belga com a Jupiler, uma Pale Lager produzida desde 1966 em Jupille ainda quando esta era considerada uma cidade (hoje o distrito faz parte de Liége). Fabricada pela Piedbœuf, cervejaria fundada em 1912 e hoje parte do império Ambev, a Jupiler segue a risca os mandamentos do estilo: coloração dourada brilhante e creme branco de baixa formação e rápida dispersão. No nariz, doçura caramelada, sugestão de cereais e papelão intensamente distinguível. Na boca, a textura é melada e levemente metalizada. O primeiro toque oferece doçura de caramelo acentuada – que consegue diminuir o incomodo do papelão – seguida de amargor praticamente inexistente abrindo as portas para um conjunto que querer ser uma Vienna Lager, mas não chega lá, deixando pelo caminho doçura e metalizado, que se esticam até o retrogosto. Simples e indicada para dias quentes (mas há melhores dentro do estilo).

A Brasserie de Jandrain-Jandrenouille é uma cervejaria fundada em 2006 na cidade de mesmo nome, localizada no Brabante Valão belga, a menos de 50 minutos da capital Bruxelas. A Saison IV foi a primeira cerveja produzida pela casa, já em 2007, e trata-se de uma Farmhouse Ale rústica, que utiliza apenas malte, lúpulo, levedura e água, sem especiarias ou açúcar, uma prática comum ao estilo. De coloração amarelo turvo com creme branco de média formação e permanência, a Jandrain Saison IV exibe um aroma frutado e doce sugerindo pêssego, mel, uva verde e leve tangerina. Na boca, a textura é picante e efervescente, como manda o figurino. O primeiro toque traz doçura frutada levemente cítrica (pêssego, mel e tangerina) seguida de um amargor bastante suave e levemente picante. Dai pra frente, uma cerveja bastante agradável e totalmente dentro da beleza rústica do estilo Saison. O final é seco e picante. No retrogosto, leve cereais, frutado e cítrico. Muito boa.

Produzida em Leuven, na Bélgica, cidade vizinha a Bruxelas, a nova aposta da Leffe é uma Belgian Ale que atende pelo nome de Nectar, pois recebe adição de mel. Na taça, uma cerveja de coloração dourada exibe um creme bege clarinho, quase branco, de boa formação e alta permanência. No nariz se entende porque decidiram trabalha-la no Brasil em versões de 250 ml: doçura intensa sugerindo mel, caramelo e banana com leve remissão a frutas cítricas. Há ainda discreta percepção de condimentação. Na boca, textura levemente picante e sedosa. O primeiro toque confirma a pegada doce do conjunto com mel seguido de banana, caramelo e floral. Amargor? Não existe. Ou se existe é absolutamente imperceptível diante de tanto mel. O conjunto que se segue pende entre muito mel e caramelo e um bocadinho de banana com discreta condimentação tentando chamar a atenção, sem sucesso. O final é seco e… doce. No retrogosto, mel e banana. Acho que só harmonizando, viu.

A grande estrela da adorada cervejaria De Struise, de Oostvleteren, uma vila de pouco mais de mil habitantes na comunidade flamenca dos Flanders Ocidentais (perto de Bruges), a Pannepot (safrada) já havia passado por este espaço em sua versão 2014, e agora retorna na versão 2013 exibindo uma coloração marrom escura com creme bege de boa formação e média retenção. No nariz, algumas mudanças em relação a versão 2014: o Vinho do Porto pulou para frente e um leve traço de balsâmico foi acrescentado, mas ainda é possível perceber ameixa, baunilha e bem levemente café. Na boca, a textura é levemente picante (novamente diferente da 2014). O primeiro toque doçura (baunilha) logo envolvida em sugestão de Vinho do Porto com um toque suave de balsâmico e azedume. Esqueça amargor e concentre-se no quão os 10% de álcool passam completamente batido pelo paladar, que se delicia com as sugestões de ameixa, baunilha, Vinho do Porto, madeira, balsâmico e leve azedume. O final e o retrogosto reforçam a remissão a Vinho do Porto numa cerveja que soa uma experiência. Palmas.

Fechando o quinteto com uma cerveja premiada, a Blanche de Namur, da Brasserie Du Bocq, de Purnode (distante uma hora de Bruxelas e meia hora da fronteira com a França), eleita melhor cerveja de trigo no World Awards Beer 2009. De coloração amarelo palha com creme branco de boa formação e longa retenção (com direito a rendas ao redor da taça), a Blanche de Namur exibe um aroma delicioso, tradicional do estilo, com sugestão cítrica (limão e casca de laranja) e de semente de cravo sobre uma base suave de trigo. Na boca, a textura começa frisante, mas depois aconchega suavemente na língua. O primeiro toque oferece notas cítricas (limão) e suave acidez seguida de percepção de semente de cravo. O amargor é baixo e abre caminho para um conjunto tradicional e bastante caprichado, com notas cítricas, herbal e doçura muito bem equilibrados. O final é seco e levemente adstringente. No retrogosto, mais cítrico (suave), coentro e azedinho doce. Muito boa!

Balanço
Eu sei que é meio triste abrir uma série belga com uma American Premium Lager… e é isso mesmo. A Jupiler é uma cerveja triste, melada, metalizada e com sugestão de papelão. Vamos tentar sorrir com a próxima. Dando um salto, a Jandrain Saison IV é uma Farmhouse que honra o estilo. Excelente. Já a Leffe Nectar, que chega ao Brasil em garrafinhas de 250 ml, é um poço de doçura que, sozinha, é difícil de descer. Talvez mesmo só harmonizando, viu (com queijo de cabra, por exemplo). A segunda Pannepot a passar por aqui, versão 2013, deu um baile na versão 2014 aplicando mais complexidade e soando mais arisca. Se a 2013 era excelente, essa 2014 soa incrível. Só melhora. Fechando a série belga com a Blanche de Namur, uma Witbier tradicional do jeito que tem que ser: limão, laranja, azedinho doce, coentro, refrescancia, tá tudo aqui. Ótima!

Jupiler
– Produto: Pale Lager
– Nacionalidade: Bélgica
– Graduação alcoólica: 5.2%
– Nota: 1,89/5

Jandrain Saison IV
– Produto: Farmhouse Ale
– Nacionalidade: Bélgica
– Graduação alcoólica: 6.5%
– Nota: 3,53/5

Leffe Nectar
– Produto: Belgian Ale
– Nacionalidade: Bélgica
– Graduação alcoólica: 5.5%
– Nota: 2,89/5

De Struise Pannepot 2013
– Produto: Belgian Strong Ale
– Nacionalidade: Bélgica
– Graduação alcoólica: 10%
– Nota: 4,41/5

Blanche de Namur
– Produto: Belgian Witbier
– Nacionalidade: Bélgica
– Graduação alcoólica: 4.5%
– Nota: 3,33/5

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