por Marcelo Costa
colaborou Bruno Capelas
Com uma dos cenários musicais mais agitados do país no momento (ao lado de Goiânia, Recife, Salvador, Belém e Natal, cinco polos de boa nova música), Belo Horizonte conseguiu retomar a força do carnaval de rua (o recém-lançado vinil duplo “Deita no Cimento: Músicas do Carnaval de Rua de Belo Horizonte de 2009 a 2014”) e vem sedimentando uma geração de novos músicos através de eventos como a Mostra Cantautores (já em sua quarta edição) e o primeiro festival do selo belga-mineiro La Femme Qui Roule.
Leonardo Marques é um dos responsáveis pelo selo La Femme Qui Roule, e se divide entre a função de produtor (“Tenho mais cinco discos de artistas locais para finalizar até o meio do ano”), artista solo e guitarrista vocalista da Transmissor, uma das bandas “que você precisa ouvir” (grifo do editor) da nova cena mineira (Graveola e Iconili completam um trio de indicações, mas há muito mais). Mas… “Tem muita gente nova aparecendo”, ele avisa.
Leo está lançando seu segundo álbum solo, “Curvas, Lados, Linhas Tortas, Sujas e Discretas”, sucessor de “Dia e Noite no Mesmo Céu” (2012). A estética continua a mesma, “um ping-pong musical entre Belo Horizonte e Los Angeles”, destacando influências de Clube da Esquina (agora de forma direta com uma versão emocional de “Girassol da Cor do Seu Cabelo”), outro tanto de Elliott Smith, agregados a “melancolia e nostalgia que, acredito, permeia muitos mineiros”, diz o músico.
“Curvas, Lados, Linhas Tortas, Sujas e Discretas” está sendo lançado pelo selo La Femme Qui Roule (quem quiser a edição caprichada em CD é só falar com Leonardo Marques aqui) e disponibilizado para download gratuito pelo Scream & Yell (em MP3 de alta qualidade: basta clicar na imagem). Junto ao disco, Leonardo Marques lança o primeiro clipe do álbum, para a canção “Se o Chão Dá um Nó”, filmado em Havana. Abaixo há links para download do disco, o clipe e um bate papo rápido com Leonardo. Divirta-se.
No que seu trabalho solo se diferencia do que você faz com a Transmissor? Pensando quando a música surge, como você define que isso vai pra carreira solo e isso pra banda?
A escolha fica a cargo da intuição, mas acho que a maior diferença é no processo. Quando começo a compor uma música que acredito ser mais voltada a minha estética solo, o método de gravação é o grande diferencial. Como toco todos instrumentos menos a bateria, não existe ensaio, construo a música e à descubro a medida que vou gravando. A gravação se torna uma ferramenta de composição, um rascunho até o momento que idealizo os arranjos e os timbres que levam a canção a um estado mais completo.
Em seus dois álbuns solo é possível perceber uma ligação com a cena musical de Minas Gerais, mais diretamente o Clube da Esquina. Como é sua relação com essa influência? O que significa: 1) a sonoridade do Clube da Esquina pra você? 2) o ser mineiro?
Minha relação com essa influência é totalmente sem conflitos, consigo enxerga-la no meu trabalho e fico lisonjeado por ter essa conexão com na música que faço. Mas a sonoridade do Clube da Esquina não me cativou desde sempre, foi na feitura do segundo disco do Transmissor, “Nacional” (2011), que comecei realmente a descobrir, escutar e gostar do Clube da Esquina e de outras gravações da música brasileira do começo dos anos 70. Acho que tinha algo de especial na produção nacional dessa época, algum tipo de mágica nas composições e na estética das gravações. O Clube da Esquina, Jorge Ben com “Tábua da Esmeralda” (1974), Tim Maia com “Racional” (1975). Sobre o ser mineiro, acredito que, com o passar dos anos, enxergo com mais clareza minha mineiridade, desde meu sotaque até o meu gosto pela melodia, melancolia e nostalgia que acredito que permeia muitos mineiros.
Além do “Curvas, Lados, Linhas Tortas, Sujas e Discretas”, você também produziu e lançou o disco do trio Invisível. Como está o trabalho com o selo La Femme Qui Roule?
Estou muito feliz com as conquistas e com o direcionamento que o selo está tomando. O disco do Invisível foi um trabalho que me orgulho muito de ter gravado e produzido junto com a banda. Apoiamos o lançamento do “Impossível Breve”, da Jennifer Souza. Gravei e produzi o EP de estreia do duo belga-paulista Teach me Tiger e atualmente tenho mais cinco discos de artistas locais que estou produzindo para finalizar até o meio do ano. O que torna o selo interessante é a flexibilidade com que ele se relaciona de artista para artista e as parcerias que estão se consolidando e outras sendo criadas.
A nova cena musical de Minas Gerais em geral, e BH em particular, anda produzindo muita coisa boa, e os festivais que vocês andam fazendo parecem ser um emblema deste bom momento que o cenário vive. Como você analisa este momento da música local?
Realizamos o primeiro festival do selo La Femme Qui Roule no fim de fevereiro, com lançamentos do meu novo disco e do invisível. O festival se tornou uma ferramenta para fortalecer parte dessa cena musical de Belo Horizonte que fomentamos, ela precisava de uma plataforma adequada para as pessoas ouvirem e absorverem essas propostas artísticas e acredito que o sucesso do festival foi nesse sentido. As pessoas se sentaram e fizeram silêncio pra ouvir o show intimista do Invisível e a atmosfera do evento era de apreciar e conhecer as bandas, mais do que estar e ser visto numa “balada”. Foi muito gratificante tocar para esse público que compareceu ao evento.
Você é bem atuante nessa cena de novos compositores. Que nomes de nova cena mineira você acha que devemos prestar atenção?
Tem muita gente nova aparecendo. Um dos discos que produzi ano passado foi o disco do Magalhães (“Trago seu Amor”), que tem grandes canções, na minha opinião. O André Travassos, do Câmera e do Invisível, é um cantor e compositor de mão cheia; o Thales Silva vem produzindo grandes discos com a Fase Rosa e com o Minimalista; o Thiakov é outro artista pouco falado com dois discos solo muito interessantes. O Rafael Ludicanti, vocalista, guitarrista e compositor dos Junkie Dogs é outro, que além de ter feito um grande disco de estreia de sua banda, compôs a icônica marchinha de carnaval da Alcova Libertina, da qual participo dos shows no novo carnaval de Belo Horizonte.
O clipe de “Se o Chão Dá um Nó” foi filmado em Havana. Como rolou a gravação?
Não tínhamos intenção de fazer um vídeo clipe, a gravação foi meio que acidental. Fui pra Cuba trabalhar com o roteirista David Elliot em uma pesquisa de locações para a filmagem de um de seus roteiros em Havana e acabei por fazer algumas cenas para ilustrar esses cenários. Aproveitei as imagens e eu mesmo me arrisquei na edição, tentei ilustrar a letra da canção que observa um momento peculiar na vida, um jeito meio beatnik de encarar a realidade e se deixar levar.
O visual é bem bonito! Tem aqueles carrões!
Demais! Eu sou fã de carros antigos, pirei lá. Já tive Variant, Zé do Caixão, Karmann Ghia, agora estou com um Fusca. Fiquei no paraíso lá… hehe
“Curvas, Lados, Linhas Tortas, Sujas e Discretas” terá lançamento no Japão, certo? O disco da Jennifer Souza, “Impossível Breve”, também já tinha sido lançado lá. Como está rolando essa parceria?
Acho que a nova cena musical de Belo Horizonte vem chamando atenção dos Japoneses há um tempo. A minha querida parceira Jennifer Souza teve seu disco lançado no Japão pela Core Port. O meu disco deve ser prensado no Japão em breve. Ainda estou fechando as negociações com outro selo japonês com histórico de vários lançamentos da atual música brasileira.
– Marcelo Costa (@screamyell) é editor do Scream & Yell e assina a Calmantes com Champagne
Outros discos para download no Scream & Yell
– “Somos Todos Latinos”: músicos brasileiros regravam canções hispânicas (aqui)
– “Espelho Retrovisor”, um tributo aos 30 anos dos Engenheiros do Hawaii (aqui)
– “Ainda Somos os Mesmos”, um tributo ao álbum “Alucinação”, de Belchior (aqui)
– “De Lá Não Ando Só”, terceiro álbum dos mineiros da Transmissor (aqui)
– Walverdes ao vivo no Asteroid Bar (aqui)
– “Natália Matos”, o disco de estreia da cantora paraense (aqui)
– “Projeto Visto I e II”: brasileiros e portugueses juntos em dois EPs (aqui)
– Download gratuito: diversos álbuns liberados pelos próprios artistas (aqui)
Leia também:
– Entrevista com Luan Nobat: “Eu não vejo uma cena em Belo Horizonte” (aqui)
– Entrevista com Thales Silva: “A cena musical mineira são vários nichos diferentes” (aqui)
– Download gratuito: baixe “De Lá Não Onde Só”, novo disco do Transmissor (aqui)
– Download: baixe “Impossível Breve”, o disco de Jennifer Souza, gratuitamente (aqui)
– Jennifer Souza: “Minhas composições são quase sempre confessionais” (aqui)
– Luiz Valente: “Me sinto completamente ligado a esta geração (de bandas mineiras)” (aqui)
– Transmissor ao vivo em Belo Horizonte: “Renovado e com lenha para queimar” (aqui)
– Graveola: “Nascemos independentes e autônomos e assim morreremos” (aqui)
Belíssimo disco!
Essa música do clipe é praticamente uma versão em português de “All The Way To Reno”, do R.E.M. https://www.youtube.com/watch?v=eItAK36eltk