por Bruno Lisboa
Luan Nobat é mais um exemplo da prolífica nova geração belo-horizontina. Com carreira iniciada em 2012, o cantor debutou com “Disco Arranhado”, álbum em que apostou na sonoridade indie como reflexo daquele tempo, pois segundo o mesmo “naquele momento tudo era Indie Rock ou Indie”.
De lá para cá foram lançados os singles “Amanhecer“, “LSD” e o EP “Insônia” (todos disponíveis no Bandcamp), que mostram novas facetas sonoras do compositor, que tem como grande trunfo o lirismo poético nas suas composições. Fora do ambiente de estúdio, Nobat faz do palco uma extensão da sua criatividade, entregando habitualmente uma performance enérgica e visceral.
Em entrevista concedida por e-mail ao Scream & Yell, Nobat fala sobre sua carreira (“Faço Pop Music Brasileira”), o cenário musical local (“Eu não vejo uma cena em Belo Horizonte”) e sobre o seu segundo disco, “O Novato”, que deve sair em maio deste ano: “Finalizei há pouco tempo os arranjos das 13 músicas”, ele avisa. Com você, Luan Nobat.
A primeira vez que tive contanto com seu trabalho foi numa apresentação na qual vocês abriram para o Selton em BH. De imediato, impressionou a sonoridade e a postura visceral associada ao lirismo poético das letras. Como você descreve o seu trabalho para os que ainda não o conhecem?
Poxa, que legal! Obrigado pelo elogio. Confesso que não sei qual seria a melhor maneira de descrever meu próprio trabalho, especialmente porque, quando ouço amigos, pessoas que me acompanham, os jornalistas e colegas tentando fazê-lo, percebo que estou bem distante de conseguir emoldurar minha sonoridade, sempre erro feio quando tento, pelo visto – a visceralidade e o lirismo poético costumam ser observados, digo isso porque talvez seja uma característica mais marcante e uniforme do que os signos sonoros. Acredito que a década de 90 e os anos 2000 dificultaram bastante essa possibilidade, os rótulos todos terminam sendo insuficientes porque o leque de referências é absurdamente amplo pra se tentar “taguear” em uma única palavra ou termo as tão múltiplas musicalidades. Talvez na época do “Disco Arranhado” fosse mais fácil, poderia dizer Indie Rock que tava tudo bem, afinal de contas, naquele momento tudo era Indie Rock ou Indie. Neste novo momento estético vejo muita dificuldade, mas pra responder de alguma forma e citando uma bela banda de Belo Horizonte, A Fase Rosa, acho que faço “Pop Music Brasileira”.
Aproveitando o gancho, recentemente entrevistei o Thales Silva (vocalista do A Fase Rosa) e falávamos sobre a cena musical mineira e as suas dificuldades para se estabelecer em outras praças. Para você o que falta para que artistas daqui consigam obter maior projeção?
Uma primeira coisa fundamental seria a união dos artistas que tem recebido os olhares da cidade e de fora dela em diálogos que são totalmente possíveis. A feitura de festivais colabora muito pra consolidar uma geração e eu tenho me movimentado pra que isso aconteça, mesmo tendo que lidar diversas vezes com a falta de compreensão de alguns artistas e grupos que não entendem a força de determinados gestos como esses e preferem mostrar sua suposta grandeza ao invés de colaborarem na construção de uma cena. Eu não vejo uma cena aqui, percebo artistas que se conhecem, que conversam, que vez ou outra estão no mesmo palco, no mesmo bar, mas num rascunho muito tímido e segregado, recortado. Belo Horizonte tem artistas de outra ordem, um nível incrível e há de se engajar na montagem de interseções pra que tudo cresça. Atualmente ando otimista, casas de show tem sido abertas com a missão do autoral em sua agenda, festivais cada vez mais estruturados tem acontecido e as várias iniciativas – sites, produtoras, jornalistas – tem dedicado esforços grandes a uma nova noção de cenário que pode dar certo, especialmente se os artistas se juntarem. De todo modo, hoje eu faria e diria pra se fazer o que fiz, faço e o que fazem as outras bandas daqui que querem alguma outra maneira de projeção: sair de Belo Horizonte, tocar em outros lugares, se conectar com outros artistas, o Brasil é lindo, imenso e permite movimentos incríveis.
No seu Soundclould é possível acompanhar a sua discografia, partindo de seu primeiro álbum, “Disco Arranhado” (2012), até o EP “Insônia” (2014). É perceptível certa evolução sonora, pois você se rende a outras sonoridades. Como se deu este processo?
Foi um processo extremamente intenso, psicanalítico e enlouquecedor. Atravessei um momento da vida que possibilitou uma ruptura de imaginário extremamente brusca, quase que um movimento de loucura mesmo. Evidentemente que isso se esbarra no campo artístico e precisei conectar as duas pontas. A bem da verdade, as sonoridades às quais você diz que me rendi eram as coisas que eu fazia e que me faziam como artista antes do meu primeiro álbum – talvez este tenha sido uma suíte, um vácuo dentro do meu universo estético e artístico. Sempre ouvi muitas coisas e nunca tive meu nicho de predileções, sou de 90, né? Cresci ouvindo muita música popular brasileira, fui apresentado ao rock ainda novo, minha família era super fã de Bossa Nova e Clube da Esquina, a Tropicália foi fundamental na minha adolescência e eu tinha amigos muito próximos que gostavam e me apresentavam ao Trip Hop, Pop, Hip Hop, Rap, Axé, Afoxé, Funk, Shoegaze, country, folk, música caipira, bolero, tango e tudo que você puder imaginar colaborou pra formação das minhas noções de musicalidade.
Você já regravou “Não Sei Dançar”, música do Alvin L. que foi sucesso com a Marina Lima, e “Pronto pra Morrer”, do Jair Naves. Num possível disco de covers, quais seriam os artistas e suas respectivas faixas que você gostaria de homenagear?
Olha, esta pergunta foi boa, mas corre o risco de ter uma resposta imensa como seria provavelmente esse disco, por isso que talvez eu nunca o faça. Estas versões e todas que fiz ou pretendo fazer surgem normalmente em momentos muito espontâneos – exceto a do Jair que fiz a convite da (produtora) Variável 5 que estava, na época, montando uma homenagem ao músico. Recentemente também gravei uma versão para a música “Walking in The Rain”, das The Ronette, pra coletânea “Girls Groups – Underground Versions”, feita em homenagem aos grupos femininos das décadas de 50 e 60, e foi ótimo. Geralmente pego algum instrumento e toco alguma música que tá na minha cabeça e pronto, tenho uma versão com arranjo e tudo. Só faço ou faria de coisas que adoro cantar em todo canto. Já tenho alguns esboços de versões pra músicas de artistas-gurus como Tom Jobim (“O Boto”, do disco “Urubu”), Macalé (“Revendo Amigos”), Caetano (“Muito Romântico”), Tom Zé (“Desenroque-se”), mas adoraria fazer versões de músicas de outros mestres como Tatá Aeroplano (“Perigas Correr”), Helio Flanders (“Cosmonauta”) e de compositores que não são do Brasil como Morrissey (“Let Me Kiss You”), Broken Social Scene (“All to All”), Radiohead (“Separator”), Grizzly Bear (“Two Weeks”) e Silver Apples (“Oscillations”). “Fruta Elétrica”, do Carne Doce, e “Gênio Ruim”, da Quase Coadjuvante, também estariam no meu disco de covers e vou parar por aqui pra que esta resposta não se torne quilometricamente insuportável.
Os singles “Não Deu”, parceria com Hélio Flanders, e “LSD” dão uma prévia do que pode ser seu segundo disco. A quantas anda a produção e o que podemos esperar dele?
Finalizei há pouco tempo os arranjos das 13 músicas que pretendo levar para o estúdio pra lapidar e registrar. Me tranquei no meu quarto com violão, viola, guitarra e um software vagabundo pra tentar montar as ideias que eu tinha para os arranjos das músicas que havia composto e agora vou transformar os arranjos eletrônicos em possibilidades orgânicas, com músicos tocando tudo que manobrei digitalmente ali. Ainda não sei se todas as canções vão compor o disco. Pode-se esperar deste trabalho uma revelação intensa de um processo de leitura existencial muito profundo de um jovem que lida com suas crises e questões todas e as traduz por meio de uma faceta artística e musical bastante ampla, com referências e combinações as mais malucas e com muita novidade, certamente.
– Bruno Lisboa (@brunorplisboa) é redator e colunista do pignes.com
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