por Bruno Capelas
Exibida originalmente em 1994 pela TV Cultura, a série “Confissões de Adolescente” marcou época nos anos 1990 ao contar, em formato de crônica, a história de uma família da zona sul carioca formada por um pai viúvo e quatro irmãs na terrível idade da adolescência, além de ter marcado as primeiras aparições televisivas de Deborah Secco e Leandra Leal. Baseada em uma peça original da atriz Maria Mariana (filha do diretor Domingos de Oliveira), que na TV fazia a mais velha das garotas, a série ganha adaptação cinematográfica no começo deste 2014 pelas mãos da GloboFilmes, do diretor Daniel Filho (que participou da série há vinte anos) e do roteirista Matheus Souza (“Apenas O Fim”).
O filme se abre desvelando situações diferentes para cada uma das irmãs: a mais jovem (Clara Tiezzi) busca o primeiro beijo e sonha com vampiros; a mais velha (Sophia Abrahão, de “Rebelde”) está em crise com o primeiro namorado e a escolha de faculdade, enquanto as duas ‘filhas do meio’ começam um relacionamento (Bella Camero) e tentam transar pela primeira vez (Malu Rodrigues), respectivamente. Além disso, as quatro garotas têm de, juntas, enfrentar a possível mudança de casa, da zona sul para o Recreio dos Bandeirantes, devido ao aumento do custo de vida – pelo menos é o que diz o pai delas (Cassio Gabus Mendes, em atuação que faz até esquecer o bom Luiz Gustavo da TV). Ufa. Ainda tem mais: há uma série de histórias paralelas correndo pelo filme, com destaque para a dupla de garotos que tentam se dar bem com a mais nova da família e para Juliana (Olivia Torres), a nova aluna que sofre bullying na escola que as irmãs estudam.
Cansou? Pois é: assim como outros filmes brasileiros do mesmo gênero, como é o caso de “As Melhores Coisas do Mundo”, “Confissões de Adolescente” peca ao tentar abraçar o mundo, buscando absorver todo o universo adolescente em pouco mais de noventa minutos. É fácil notar que cada um dos temas acima já seria suficiente para fazer um filme. Entretanto, ao contrário do filme de Laís Bodansky, que conseguia certa ordem em meio ao caos juvenil por alinhar um protagonista e a partir dele encontrar sequência lógica, a adaptação da série televisiva se perde na telona por não conseguir escolher uma história para dar mais atenção, resultando em narrativas que pouco fazem paa ir além da superfície e dos clichês.
Ao abordar temas como gravidez e homossexualidade de maneira simplista, sem grande desenvolvimento dramático, o filme ‘passa a mão na cabeça’ de seus problemas, embarcando em futilidades típicas da classe média ao contrário de problematizá-las. Isso para não falar na trilha sonora asséptica e pouco próxima à geração Y, que conta com Djavan (?), Caetano Veloso, SILVA e Clarice Falcão, e na infantilidade de certas referências pop, como a fala “MGMT vai mudar sua vida”. Outro falha do filme é abordar a interface dos relacionamentos jovens com a internet de maneira inócua, algo que já foi feito com sucesso por bobagens do cinema americano (“Lola”, com Miley Cyrus, lançado em 2012) e por curtas-metragem espertíssimos (caso do incrível “Noah”, uma das revelações do festival de Toronto em 2013).
É preciso reconhecer a dificuldade do trabalho de se adaptar o universo da série para uma narrativa curta e empolgante sem perder o viço, mas até mesmo elementos importantes da TV ficaram de lado, como a interação entre as irmãs e o pai da família em convivência típica, cheia de afetos e conflitos de geração. É uma pena, especialmente ao se lembrar que o roteiro ficou na mão de Matheus Souza, que, depois de assinar boas colunas no Globo sobre juventude e ter feito um dos grandes filmes nacionais dos últimos anos, naufraga aqui e também em “Eu Não Faço a Menor Ideia do Que Eu Tô Fazendo Com a Minha Vida”, outro retrato da geração Y que se perde em muito blá-blá-blá.
Entretanto, há alguns acertos em “Confissões”. Normalmente temerária, a escalação do elenco jovem passa longe de comprometer o resultado do filme, e até surpreende, seja pelo alívio cômico (com os dois garotos que tentam vampirescamente conquistar a irmã mais nova) ou pela maneira honesta que é tratada a história do bullying. Outro bom ponto é a maneira como drogas, sexo e álcool são tratados pelo filme, com naturalidade, ao contrário da pasteurização típica feita pela Globo Filmes. A participação das quatro ‘adolescentes’ originais (além de Maria Mariana e Deborah Secco, Georgiana Góes e Natália Valente fecham o grupo) ao longo do filme, ainda que não passe de um gracejo, faz sorrir.
Ainda assim, é pouco para um filme com pedigree, e que tem que lidar com a rivalidade próxima de boas películas sobre o mesmo assunto, como a já citada “Melhores Coisas”, o delicado “Antes Que o Mundo Acabe”, o excitante “Os 3” e os clássicos (pelo menos a nível nacional) “Houve Uma Vez Dois Verões” e “Meu Tio Matou Um Cara”, de Jorge Furtado. Em uma golada só, o sabor de “Confissões de Adolescente” é menos como uma Coca-Cola com gelo e limão à moda de John Hughes, e muito mais como um suco de laranja aguado bebido em “Malhação”. Uma pena.
– Bruno Capelas (@noacapelas) é jornalista e assina o blog Pergunte ao Pop.
Leia também:
– O problema de “As Melhores Coisas do Mundo” não é exatamente seu, por Capelas (aqui)
– “Apenas o Fim” é sobre quando somente amar não basta, por Murilo Basso (aqui)
– “Houve Uma Vez Dois Verões”, uma deliciosa comédia romântica, por Angélica Bito (aqui)
Ficou legal a contextualização, n tava entendendo o porque de você estar empolgado pra ver um filme com esse mote! Ao menos a série era bem feita?
MGMT realmente muda a vida de quem ouve. É uma banda transcendental <3