texto de André Luiz Fiori
O neologismo “Cornitude” foi cunhado pelo poeta Augusto de Campos, se referindo à obra do gaúcho Lupicínio Rodrigues. Suas músicas falando de amores fracassados, traições e sentimento de vingança, sempre bateram fundo no coração do brasileiro
“Confissões de Um Sofredor” (2024), de Alfredo Manevy, fala de um Brasil que não existe mais, da boemia desenfreada… e de uma música brasileira que não existe mais, do samba-canção de letras tão populares quanto elaboradas.
“Vingança”, “Nervos de Aço”, “Nunca”, “Ela Disse-me Assim”, “Um Favor” “Felicidade”, “Volta”, “Esses Moços”, “Se Acaso Você Chegasse”, e outras… podem surpreender o espectador mais distraído, ao concluir que conhece todas
A narração de Paulo Cesar Pereio cai muito bem, e o filme mostra o lado humano de Lupi, um cara tão tranquilo que não há como não simpatizar com ele. Muitas cenas de arquivo e depoimentos de artistas (Caetano Veloso, Gilberto Gil, Gal Costa, Elza Soares, entre outros) e pesquisadores da obra de Lupicínio, mostrando que suas versões para suas músicas, com sua voz pequena e baixinha… são tão boas quanto àquelas que fizeram sucesso com grandes intérpretes, e totalmente atemporais.
A produção também revela um episódio importante da história de Lupicínio envolvendo a faixa “Se Acaso Você Chegasse”. A música fez parte da trilha sonora de um musical de Hollywood, “Lady, Let’s Dance” (“Dançarina Loura”, 1944) indicado ao Oscar de 1945. Porém, além de não ter sido consultado sobre o uso da canção, Lupicínio só foi receber direitos autorais anos após o sucesso – até hoje seus créditos na indicação ao Oscar não foram reconhecidos.
A narrativa de “Confissões de Um Sofredor” passeia por diversas facetas do focalizado, contando a inspiração por trás dos seus clássicos, e até do hino do Grêmio composto por ele A direção consegue ir além do tradicional “depoimento-imagem”, chegando a emocionar várias vezes. Quem já gosta vai se deleitar, e quem quiser conhecer seu trabalho vai explorar um campo fértil e interminável.
“Confissões de Um Sofredor” foi finalizado em 2022, mas somente agora chega ao público. É muito difícil para um filme/documentário entrar em cartaz no “circuitão”, em 14 capitais brasileiras. Então é importante que as pessoas o prestigiem nos cinemas (alô, público do In-Edit!) para a iniciativa ser bem-sucedida.
O filme termina com a última entrevista dele em vida, no ano de 1974. O entrevistador diz:
– “Lupicínio, tem mais alguma coisa que o sr. queira dizer?”
– “Sim, essa dose de uísque já acabou… se tiver mais entrevista, vamos ter de buscar outra garrafa, né?”
Imperdível!
– André Luiz Fiori (www.facebook.com/andre.fiori.73) é dono da loja Velvet SP