entrevista por Manoel Magalhães
Fellini é uma das mais relevantes bandas do pós-punk brasileiro. São 37 anos de história como grupo, cinco discos oficiais de inéditas, três álbuns de versões alternativas, b-sides e registros ao vivo e ainda alguns singles, como o mais recente “Leave Me Alone”, lançado no último dia 04 de junho e gravado de forma virtual durante a pandemia da Covid-19.
Ao longo das últimas duas décadas, o Scream & Yell buscou acompanhar os shows de reunião do grupo, como o de celebração ao álbum “Amor Louco” em 2016 e o lançamento da caixa “A Melhor Coisa Que Eu Fiz” em 2020, além de publicar conteúdos sobre os álbuns, como o faixa a faixa de “Amanhã é Tarde” em 2002 e uma conversa com Thomas Pappon, em 2006.
A entrevista a seguir com Cadão Volpato, Thomas Pappon e Jair Marcos foi realizada na conexão Nova Iorque, Londres, São Paulo e Rio de Janeiro por videochamada. Os três falaram a respeito de diversos momentos da trajetória da banda e comentaram toda a discografia de inéditas, que inclui os álbuns “O Adeus de Fellini” (1985), “Fellini Só Vive 2 Vezes” (1986), “3 Lugares Diferentes” (1987), “Amor Louco” (1990) e “Amanhã é Tarde” (2002).
Sobre o lançamento do single “Leave Me Alone”, a forma bem sucedida como aconteceu (foi gravado online entre Londres, Nova Iorque e São Paulo) abre a possibilidade para que exista um disco novo?
Cadão Volpato: Nem pensar.
Thomas Pappon: Acho difícil. É muito complicado, e na verdade essa música nova, esse single, nem era uma coisa tão nova assim, a gente meio que concluiu uma música que já estava praticamente composta, que fizemos no último ensaio da banda em 1990. O que teve de novo foi a letra, porque mesmo a linha vocal foi bem parecida com a original.
Cadão: O engraçado é que a letra, por exemplo, eu não consegui me livrar dela, porque quando a gente compunha, eu em geral colocava uma coisa qualquer em cima, que facilitava ser em inglês por ser mais fácil de cantar e depois eu trabalhava isso em algum momento. Mas dessa vez eu não consegui me livrar, isso aconteceu com “Chico Buarque Song” também, que foi uma letra que era toda em inglês e eu tive que dar um jeito para que ela tivesse algum sentido. E com essa daí foi a mesma coisa. Demorou pra burro porque eu tive que fazer uma letra nova, mas que na verdade é uma letra velha.
Então a chance é zero para um disco novo?
Thomas: Na verdade, a possibilidade é a seguinte: alguém chegar e falar “aqui vocês têm 100 mil dólares para vocês poderem pedir férias nos trampos de vocês, para arrumarem um estúdio e passar um mês gravando um disco”, que na verdade é o que as gravadoras fazem. Cansei de ler sobre bandas que se recolhem e passam meses em uma fazenda compondo, aí é mais fácil. Infelizmente não existem essas condições pra gente e nunca existiram. Aliás, o “Amor Louco” foi o mais perto que chegamos desse tipo de condições.
No seu livro “À sombra dos viadutos em flor“, Cadão, você fala que a banda começou em uma conversa com o Thomas no Bar do Árabe, no Centro de São Paulo. Essa conversa que deu origem ao Fellini é de 1983 ou 1984?
Thomas: 1984. O primeiro ensaio foi em 18 de maio de 1984. A gente guardou essa data porque foi o quarto aniversário da morte do Ian Curtis, do Joy Division.
Cadão: E a gente deve ter conversado no verão, eu me lembro que não fazia frio naquele papo no bar. A conversa deve ter sido em fevereiro ou março, aí depois a gente falou com o Jair e com o Ricardo na sequência e então resolvemos fazer o primeiro ensaio.
Jair Marcos: Cadão e eu tivemos uma banda chamada Toque de Recolher, que nunca se apresentou ao vivo. Foi um projeto que tivemos com uma turma da Mooca que praticamente só ensaiou. Com o Thomas tive Os Internacionalistas, um grupo de covers que criamos com o Minho K. A gente tocava em festas da USP, uma fase bem interessante, e posteriormente o Thomas e o Cadão apareceram na PUC, não sei se eles lembram disso, e me convidaram para tocar guitarra no Fellini. Foi uma noite muito legal aquele encontro. Eu lembro que a gente foi no fusquinha do Thomas até o Morumbi e rabiscamos lá as primeiras músicas no quarto do Thomas.
Thomas: Foi no porão lá de casa.
Cadão: Naquele dia, eu acho que a gente já tinha “Rock Europeu”, já tinha “Funziona Senza Vapore”. A coisa acontecia sempre assim: o Thomas tinha uma linha de baixo e a gente meio que recheava essa linha em algum momento quando se encontrava. E isso deve ter acontecido nesse primeiro momento, o Thomas apareceu com as linhas e a gente foi colocando as melodias do jeito que dava.
Thomas: Eu estava tentando me lembrar se o Ricardo (Salvagni) chegou a fazer algum ensaio na casa dos meus pais, eu acho que sim.
Cadão: Eu não me lembro.
Jair: Eu também não lembro.
Cadão: No dia que foi o fim dessa banda que eu tive com o Jair, a Toque de Recolher, que eu não lembro o motivo da briga exatamente, deve ter sido um motivo fútil, o Vitor Leite, que era um baterista importante daquela época (era baterista do Ira ainda sem a exclamação), veio ver o ensaio com o Ricardo. Eu não conhecia o Ricardo pessoalmente. Curiosamente eu saí puto desse ensaio e o Ricardo estava dando carona pro Vitor e me deu carona também. Ou seja, fui espumando dentro do carro e eu fui com a cara do Ricardo. E eu pensei: “Ele deve tocar alguma coisa”. Foi aí que eu sugeri o nome dele, acho que o Thomas já o conhecia.
Thomas: O Ricardo era amigo do Caíto, que era empresário do Ira!. Foi o Caíto que indicou o Ricardo. Eu lembro de perguntar pra ele porque a gente estava precisando de um baterista e ele citou o Ricardo. O Ricardo tocava numa banda chamada UK7.
Cadão: A artista plástica Jac Leirner tocava baixo nessa banda do Ricardo. Era legal, um barulho desgraçado.
E qual foi a expectativa para o primeiro disco? Na época o BRock começava a aparecer como uma aposta das gravadoras, mas imagino que vocês tivessem expectativas diferentes.
Thomas: A gente sempre quis ver o repertório gravado. Acho que essa sempre foi a grande motivação, porque gostávamos muito do repertório. Chegamos a fazer duas demos. Na primeira a gente gravou três músicas, eu tenho essas demos até hoje, a segunda demo eu tenho até a matriz, gravamos em um estúdio que era um Portastudio, o estúdio Calico, que era lá no Brooklin, foi num sábado. Vocês lembram disso?
Cadão: Lembro bem, lembro muito bem.
Thomas: A primeira demo foi gravada na Av. Indianópolis e depois, em janeiro ou fevereiro, fizemos essa segunda no Calico. Todas as músicas dessas demos acabaram entrando no “O Adeus de Fellini”, exceto “Eclipse”, que a gente depois abandonou. Com as demos vimos que as músicas eram legais, mostramos a algumas pessoas e elas também gostaram das músicas, então resolvemos registrar isso. Eu saí à cata de um estúdio porque resolvemos bancar o disco. A gente nunca achou, em momento algum da trajetória do Fellini, que uma gravadora fosse se interessar. Rapidinho achamos que o único jeito de registrar isso era bancar. Fomos atrás de um estúdio barato ou que a gente pudesse pagar, achamos um estúdio novo indicado pelo Peter Price, acho que a mulher do Peter Price era amiga da mulher de um dos donos do Ônix, que era um estúdio que dois sócios abriram em Perdizes, perto da PUC. A gente combinou um pacote com eles e fomos vários fins de semana e algumas noites, acho que durante uns dois meses fomos gravando. A gente mixou o disco com a ajuda do Peter Price, que eu convidei, era um cara que tinha gravado discos na Inglaterra, achamos que era uma boa ideia chamar o cara e ele foi e deu alguns palpites. Foi engraçado porque os caras do estúdio não tinham experiência alguma de gravação com rock, eles faziam jingles, comerciais, era um estúdio pequeno, de 8 canais, tinha umas limitações, mas acho que lidamos super bem com todas essas limitações, não só a gente como eles também, os dois caras que se revezavam na engenharia de som. Eu me lembro do som da bateria ter ficado muito bom e eram basicamente dois microfones. A bateria montada lá e dois microfones, com alguns efeitos, um gate reverb no bumbo e na caixa. Ficou um disco despretensioso, sem o ranço de outros discos gravados na época, principalmente por gravadoras porque os caras também não tinham noção na época. Você tinha um som de bateria que eles triggavam uma LinnDrum, um som muito característico dos anos 80. O disco do Voluntários da Pátria tem esse problema, as pessoas dizem que o som do disco dos Voluntários é muito bom, elogiam e tal, eu lamento, acho que o disco do Fellini tem um som muito mais legal, muito mais vivo e orgânico, talvez por ter sido gravado nessas condições restritas.
Cadão: Sempre me incomodou muito o som dos discos brasileiros daquela época. E tem a ver com a bateria diretamente. O baixo inclusive era um problema também, mas no caso da bateria você já nota que é disco brasileiro porque é uma coisa flácida, é bizarro, não tem volume. Essa é a vantagem de começar sem muita experiência, o Thomas tinha a experiência do Voluntários da Pátria, mas a gente começou sem saber nada. Pra gente foi uma experiência e tanto porque tivemos que inventar coisas. O técnico de som, se não me engano, era um surfista, tinha surfado no Havaí, alguma coisa assim, mas eles gostaram do lance, então foi uma descoberta conjunta.
Thomas: Eu levei um amplificador de baixo, acho que era um Polytone, mas não ficou legal o som. Aí a gente usou o amplificador de guitarra do Pamps (Sergio Pamplona, guitarrista da banda Smack, falecido em 2015), ele emprestou um Pearl que ele tinha de guitarra, a gente experimentou e ficou super bom. O baixo foi todo gravado em um amplificador de guitarra.
Cadão: Ninguém faria isso em estúdio hoje em dia. Imagina se uma gravadora iria bancar, nunca.
Jair: Um aspecto que considero bem importante e inovador no caso do rock brasileiro ou rock paulista da época foram também os diversos efeitos sonoros que utilizamos no álbum, de máquinas de escrever, bigorna, helicóptero. Uma outra coisa curiosa é o megafone que o Cadão gravou em “Outro endereço, outra vida”. Você lembra disso, Cadão? Ele foi lá fora da casa do estúdio e usou o megafone.
Cadão: Isso lembra uma cena do “24 Hour Party People”, o filme sobre o Joy Division e Factory, que o cara vai gravar lá a bateria no banheiro e ele fica afastado de todo mundo. Parece que foi assim.
Jair: Ah, você usou o interfone. Você usou o megafone pelo interfone.
Thomas: Foi isso mesmo.
Cadão: Tô falando, foi 24 Hour Party People. (Risos)
E a capa? O Fellini tem essa questão das cores bem definidas nas capas. Verde, azul, vermelho e amarelo.
Cadão: Isso foi tudo pensado. A gente escolheu a cor primeiro, inclusive a gente chupou a cor de algum lugar que eu não me lembro. Thomas, você é capaz de dizer qual é o disco de onde saiu essa cor? A cor verde.
Thomas: Claro, o primeiro foi tirado de um disco de música clássica que eu peguei emprestado da discoteca da Rádio Cultura. Eu trabalhava nessa época na rádio e era um disco de música clássica, lindo, exatamente essas duas cores. Verde e dourado. Mas não lembro de mais nada, o que tinha nesse disco. A capa do segundo disco é inspirada no “Chronic Town”, que é um EP do R.E.M., e a capa do terceiro disco é inspirada no “Chimera”, do Bill Nelson. Literalmente eu levava a capa pro Luiz Calanca e falava “essas são as cores”, pra chupar essas cores. O do Bill Nelson é o mais bandeira. Ele tem também as ideias das fotos na capa.
Cadão: Eu não sei se foi ideia do Thomas colocar um desenho na capa, mas deve ter sido. Eu lembro de ter feito esse desenho em um caderno, não tenho mais o original, era tudo um pouco improvisado. E depois eu escrevi todas as letras a mão na contracapa.
Thomas: Pro CD o Calanca tentou reproduzir essa ideia, ele mesmo botou, e tem um monte de erros. Nome de música errado.
Cadão: É o que temos.
Thomas: Uma coisa que muita gente esquece do primeiro disco é que ele é um LP de 45 rotações.
Cadão: Todos os EPs que a gente achava legais eram 45, acho que pode ter sido essa a referência. O problema é que muita gente tocou em 33 rotações e ficou um disco macabro.
Jair: Muita gente não entendeu, tocou em 33 e pensou “que bosta é essa?”.
Thomas: Ou achou do caralho também, não sei. (Risos)
E o segundo disco? Como aconteceu exatamente a transição para a gravação de um disco só com Cadão e Thomas?
Cadão: O que aconteceu é que a gente expulsou o Jair (risos). A gente, na verdade, eu não lembro em que situação exatamente, mas a gente quis comprimir o negócio. O Ricardo tinha saído da banda, eu acho que nesse momento para se casar, e em algum momento Thomas e eu pensamos em fazer um negócio minúsculo. De fato é um disco gravado em uma sala de visitas. Ficamos os dois naquela sala de visitas fazendo uma coisa muito de dupla mesmo. Eu acho que a ideia era no sentido de simplificar e, ao mesmo tempo, tinha uma guinada muito grande de estilo, porque é aí que entra a MPB na história. Foi nesse momento que músicas como “Tabu”, por exemplo, a gente acrescentou o efeito de bateria eletrônica vagabunda com uma batida de bossa nova e eu acho que a gente achou que era esse o caminho. A gente vivia experimentando, inclusive experimentando formações. Eu acho que foi isso que aconteceu. É um disco bem mais simples nesse sentido, as pessoas tendem a gostar muito porque é um disco que é totalmente aberto à experimentação. De tal forma que entra um guarda noturno apitando, o Mitsu, que era o gato do Thomas, passa pela sala, eu falo com ele porque a gente tá gravando ao vivo e o bicho tá ali. Esse tipo de coisa. Era um barato, uma experiência única.
Thomas: Não foi o disco inteiro que foi assim, foi “Mãe dos Gatos”, nesse esquema de improviso foi só. A gente teve sorte. Vários elementos aconteceram ao vivo que tornaram a música tão interessante. Eu lembro que eu apertei um botão errado uma hora no ritmo eletrônico e entrou um barulho, o gato passar e os pedais que foram apertados ali meio que ao léu. O acaso teve um papel importantíssimo. Ficou uma música muito legal e é muito difícil duas pessoas tocando ao vivo fazerem um som desses. Realmente a sorte ajudou muito.
Cadão: É bom lembrar que o resto a gente gravou no esquema de quatro canais também, mas só que assim, cada um no seu canal, da melhor forma possível. É verdade. Eu acho que fazia parte de uma descoberta nossa de uma nova possibilidade que era trabalhar com o lance da MPB. É importante dizer o seguinte: o Thomas, por exemplo, tem uma ligação com a MPB muito forte. Sempre teve. E ele curtia as coisas de vanguarda da MPB, então tinha o Tamba Trio nos anos 60, a gente conhecia muito bem o som dos anos 70 que nos interessava. Outro dia eu ouvi o primeiro disco do Egberto (Gismonti), que eu não conhecia, ouvi agora e fiquei chocado. É o tipo de coisa que se eu tivesse ouvido na época teria tido algum tipo de influência. Milton Nascimento. Eu ouvia muito rádio nos anos 60 porque eu sou bem mais velho que eles. Era música brasileira, então não é uma virada de chave só, é uma virada totalmente justificada. Foi ideia do Thomas e caiu como uma luva.
Thomas: É interessante também dizer que foi um disco que causou um puta estranhamento. Quando você abre com “O Adeus de Fellini”, que é um disco de rock, pós-punk, e de repente vem um treco. O Calanca falou que um monte de gente devolveu o disco. Eu me lembro que o José Augusto Lemos fez a crítica desse disco na Bizz e colocou nas alturas, então havia um fuzuê em torno do disco, mas acho que muita gente achou estranho demais e alguns devolveram. É uma coisa que eu nunca fiz na minha vida, devolver um disco, eu nem sabia que era possível.
Quanto tempo demorou o processo de gravação do “Fellini Só Vive 2 Vezes”?
Thomas: Fizemos entre o final de 85 e o início de 86. Algumas coisas eu fiz na casa dos meus pais, eu peguei uma hepatite e mudei pra casa deles, eu lembro de gravar os violões de “Domingo de Páscoa” na sala de jantar da casa dos meus pais. Eu acho que ao todo durou uns dois meses.
O terceiro disco, “Três Lugares Diferentes”, teve uma influência cubana nas letras?
Cadão: A minha primeira mulher tinha morado em Cuba seis anos, os pais dela era da ALN (Ação Libertadora Nacional), se não me engano, e ela primeiro se exilou no Chile, de onde saiu junto com o Gabeira, inclusive, do Consulado da Suécia. Ela era muito nova e havia todo um clima que ela me contava, de uma Cuba idílica, eu acho que é a visão de Cuba do ponto de vista de uma criança. Isso me parece que tá no disco, uma poesia ligada a uma infância que não era minha, mas que me contaminava.
O disco também parece guardar uma conexão com o anterior.
Cadão: É a música brasileira, provavelmente. Os melhores sambas do Fellini estão ali no “Três Lugares Diferentes”. Ou pelo menos os mais conhecidos, você tem “Teu Inglês” e “Ambos Mundos”.
Thomas: “Rio-Bahia”.
E essa escolha pela música brasileira foi consciente? Era uma forma de se diferenciar um pouco do resto da geração dos anos 80?
Cadão: A ideia era mesmo fazer uma coisa diferente. A gente não devia nada a ninguém. Estávamos sempre querendo nos transformar de alguma forma. Nunca estávamos satisfeitos com o modelo estabelecido.
Thomas: E os discos refletem bem as condições em que eles foram gravados. São discos lo-fi, que é uma coisa que já diferencia muito o som do Fellini dos outros discos da época. E essa mistura de ritmos eletrônicos com samba foi uma coisa que pegou muito bem, as pessoas gostaram muito, principalmente o pessoal do Manguebeat. Esse é o disco que fez a cabeça da rapaziada lá. Eu não tô exagerando, não. Tem até programas aí, se você for ver todo mundo cita o “Três Lugares Diferentes”. E é nessa mistura entre som lo-fi, ritmo eletrônico com música brasileira que eu acho que as pessoas começaram a perceber que você pode fazer uma combinação encantadora, tem uma mistura legal que contrasta com o mainstream do rock na época, como os Titãs. Eu acho engraçado que o empate no primeiro lugar na lista de melhores do ano da Bizz em 1987 tenha ficado entre o “Três Lugares Diferentes” e o “Jesus Não Tem Dentes no País dos Banguelas”. São dois discos que mostram bem as duas faces, a cara do Rock Brasil e uma coisa diferente, um caminho alternativo, feito em casa. Ritmos brasileiros, letras incrivelmente legais e diferentes.
Vocês acham que essa escolha pelo caminho da MPB foi visionária?
Cadão: Eu acho que a gente estava muito à frente no tempo. Pra mim é uma evidência e isso só foi se provar 30 anos depois, isso é o mais engraçado. Se a gente fosse viver de música na época estaríamos ferrados. Tempos depois virou uma coisa “puxa, que incrível, a gente foi descoberto”, as coisas sempre acontecem muito tarde. O Thomas, na época, meio que já vaticinava. Tem uma frase dele que ficou famosa na Bizz: “nós vamos virar cult”.
Thomas: Eu acho difícil falar em uma banda à frente do seu tempo. Eu acho que as bandas são produtos do seu tempo.
Cadão: Eu digo isso por uma constatação posterior, não porque na época a gente achasse isso, mas essa coisa do “cult” tá na revista, foi publicado isso, você falou isso, e virou cult mesmo. Porque era uma sensação que a gente tinha nas conversas de que realmente estava fazendo uma coisa muito diferente. Você era o cara que mais botava fé nessa história.
Thomas: Eu não tenho dúvida. Eu tinha convicção, isso sim, de que as coisas que a gente estava fazendo eram super legais. Isso talvez porque eu gostasse de ouvir essas coisas. Eu adorava ouvir os nossos discos. Os quatro discos eu ouvi sem parar, ouvi muito. E essa convicção, de que eram músicas legais (e graças a Deus eu estava certo nisso), me deu talvez a impressão de que iria demorar um tempo para as pessoas curtirem. Daí talvez eu tenha dito de ser banda cult, porque o cult tem essa coisa de ter sido algo que aconteceu no passado.
Cadão: Exatamente, você apontou pro passado que era bem possível mesmo, mas a gente não era tão otimista assim naquela época também porque tinha um problema, a gente não conseguia tocar uma carreira. Cada um trabalhava no seu próprio negócio, não tinha muito futuro. Esse “cult” a que você se referiu também tem a ver com o fato da banda não ter uma continuidade. Essas coisas que desaparecem prematuramente criam um ar de eternidade. Acho que com o passar dos anos a gente foi sentindo isso. As pessoas ouviram e isso só aconteceu por conta dos discos, porque nós gravamos discos e registramos isso. Imagina quantas bandas daquela época não gravaram? Elas nunca foram lembradas e desapareceram simplesmente.
Thomas: Você vê hoje o Mateus (Mondini), da Nada Nada Discos, ele está fazendo esse trabalho arqueológico de resgatar demo tapes de bandas dessa época porque ele sacou que há um grande interesse mesmo, e nada melhor do que mostrar gravações dessas bandas. Tá saindo aí LP duplo dos Agentes, dos Ratos do Beco, bandas que mal tocaram ao vivo, mas eu mesmo indiquei algumas bandas, o Metropolis, que era uma banda super legal do Rodrigo Andrade, Paulo Monteiro e Supla. Eles compuseram “Garota de Berlim”, que depois foi gravada pelo Supla. Tinha o Diorama, tinha o Rosa Luxemburgo, uma banda que eu indiquei também, que era a banda do Redson do Cólera. Pouca gente sabe disso, o Redson tinha uma banda pós-punk, meio gótica, com o Carlos Strobin no baixo. Um dos discos mais legais dessa época foi a primeira demo que As Mercenárias gravaram no estúdio do Placa Luminosa, que a Nada Nada Discos lançou em compacto. Tudo isso pra dizer que, de fato, o que essas bandas fizeram nessa época realmente continua interessando muito.
Cadão: Acho que tem a ver com esse espírito desbravador. O rock quando a gente começou a tocar era desprezível. As pessoas não davam a mínima, elas queriam saber da MPB. MPB bem cafona, por sinal. Eu acho que não existia um ambiente de música jovem. A gente apareceu exatamente nesse momento, antenados com uma coisa internacional, que era a Inglaterra, que era um pouco os Estados Unidos. Acho que isso colocou a juventude brasileira no mapa. Porque o que aconteceu é que a ditadura não permitia que você tivesse acesso à informação, então a gente vivia como um náufrago, sendo obrigado a ouvir música do Gonzaguinha, aqueles bolerões, umas coisas deprês pra caramba. A música brasileira estava em um ambiente super depressivo no fim da ditadura. A gente apareceu justamente aí, era um jato de novidade com esse triângulo Brasília, São Paulo e Rio. Tem todos os elementos mitológicos e eu acho que tinha gente muito talentosa nesse meio. E muito jovens, as pessoas tinham 21, 22 anos. Essa era a média. Todo mundo muito jovem.
Thomas: Aqui na Inglaterra também há um interesse muito grande pelo o que se fazia nos anos do pós-punk. Não só aqui como nos Estados Unidos também. Essa época dos pós-punk privilegiou experimentos e misturas, então acaba interessando muito.
E o “Amor Louco”? É o disco favorito de muita gente. O que vocês acham que ele tem de especial?
Jair: Foi um disco longo nas gravações. Demoramos muito, a gente trabalhou primeiro com o R. H. Jackson, depois ele viajou, ficou o Akira (S) produzindo, isso aí deu muita demora, mas foi um trabalho que a gente considera mais técnico. Foi um álbum que trouxe também de volta um pouco a coisa do rock, que não esteve nos dois álbuns anteriores, foi uma transformação. O disco marca o meu retorno ao Fellini, em 1988, após dois anos de nossa temporária separação. Foi, afinal, a volta da formação original da banda. Esse retorno nos lavou a alma e conseguimos estar num estado de graça e liberdade emocional para compormos seu conteúdo com grande desenvoltura e alegria. Pra mim, em particular, foi uma enorme realização e sair divulgando o trabalho novíssimo, em 89 e 90, por algumas capitais como Rio, Belo Horizonte e Porto Alegre foi um sonho realizado.
Cadão: “Amor Louco” é um termo dos surrealistas. Eu sempre fui ligado nos surrealistas, o título veio daí, não lembro se foi ideia minha ou se o Thomas que sugeriu.
Thomas: Foi sua.
Cadão: É um disco que apela às pessoas porque tem um lado romântico. Ele tem um amor meio esquisito, porque em geral ele é um amor que vem pela beirada, ele não é uma coisa absolutamente lírica, tem um senso de humor. Talvez seja o álbum mais voltado para uma confissão, tem muitas coisas ali que são bem derramadas.
O Thomas em 2006, na entrevista sobre o “Amor Louco” publicada aqui no Scream Yell, disse que você estava bastante inspirado nesse momento.
Cadão: Na verdade todos os discos eu estive bem inspirado e bem apaixonado.
Thomas: São as musas. O “Amanhã é Tarde” também foi muito inspirado.
Cadão: Um atrativo que eu acho de todos os discos é que a gente não se furta em falar de alguns assuntos que o rock não costumava tratar. Em nenhum disco você vai encontrar gente falando as coisas que eu falo, isso é real. Acho que tem esse impacto. E isso também porque os caras toparam fazer assim, eu achei uma banda em que eu pudesse me expressar dessa forma. Eu me expressei de acordo com as minhas leituras, de acordo com o que eu gostava. Eu fiz uma coisa completamente voltada a uma espécie de fidelidade a mim mesmo. Algumas vezes é até cifrado e eu não tô nem aí. Nunca estive, na verdade, o que eu queria era a emoção de estar compondo, porque todas as músicas foram feitas em um momento de emoção, isso é real. Quando a gente compunha juntos, quando eu ia pra casa com aquele “lá, lá, lá” na cabeça que eu nem gravava e precisava compor em cima disso, era todo um projeto emocional. De quem gosta das músicas, de quem tá se empenhando naquilo. A independência era exatamente isso. Era poder dizer as coisas que eu disse, que às vezes são até confessionais demais, mais cifradas do que deveriam ser, surrealistas, mas eu sou capaz de explicar todas as letras pra você. A origem delas. Uma coisa que me incomoda no “Amor Louco”, não sei se vocês já falaram disso alguma vez na vida, é a parte rítmica do disco. A coisa da bateria eletrônica do jeito que ela foi colocada no disco não é algo que me deixa feliz pra caramba, mas independentemente disso, as músicas são tão legais, que elas poderiam ter sido gravadas debaixo d’água que ia ter algum efeito. Como o passar do tempo eu sempre falo “é o meu disco favorito”, mas você ouve de repente aquele lo-fi bem vagabundo do “Três Lugares Diferentes”, ou mesmo do “Fellini Só Vive 2 Vezes”, ou mesmo voltando pro primeiro disco, como eu fiz no meu livro, você percebe que ali tem coisas “que barato!”, e eu acho que é esse tipo de barato que bate nas pessoas. Ter feito com uma puta alegria. Quando você trabalha com uma coisa que você gosta, o efeito mais cedo ou mais tarde atinge outras pessoas.
No disco, a questão da “paixão” é também muito latente com a questão da “cidade”. Canções como “Città Più Bella” permitem um outro nível de leitura da paixão para além do amor romântico.
Thomas: Eu nunca vou esquecer da reação do Rene Ferri (Selo Wop Bop) quando ouviu o disco pela primeira vez. O que a gente queria era produzir o disco com condições profissionais. A gente chegou pro (Luiz) Calanca e perguntou se ele topava bancar um estúdio e ele falou que não. Aí eu fui na outra loja da outra galeria falar com o Rene e ele nem pestanejou, falou “claro!” e bancaram. Eu fiquei com o número de 20 mil dólares na cabeça durante anos, mas não foi isso. O Miguel Barella, que era dono do estúdio OBJ, depois me falou que foi bem menos, talvez 10 mil dólares ou 8 mil, não sei, mas o fato é que bancaram. O fato também é que a gente fez um disco em condições profissionais, ter demorado foram outras coisas, o Jack foi viajar, a gente ia continuar com o Akira, mas viu que não deu certo, resolvemos esperar o Jack voltar. Nós ficamos dois meses esperando ele voltar. Ele ficou até honrado com isso, mas o que eu queria mesmo falar era o que o Rene falou quando ouviu o disco: “Meu, me lembrou Adoniran Barbosa”.
Cadão: É isso mesmo.
Thomas: Quando ele falou isso, eu pensei “caralho!”. Sério?
Cadão: “Cidade perdida, joga as cascas pra lá”, era assim que os Demônios da Garoa começavam a cantar “Saudosa Maloca”. “Joga as cascas pra lá”, entendeu? É isso.
Thomas: Acho que tem mais do que isso. Essa ligação com a cidade, com a vida boêmia. O tipo de comentário que você faz numa letra e que tem a ver com as letras do Adoniran. Da observação ou de alguma experiência pessoal, amorosa ou mais profunda, não sei. Acho que tem uma ligação com São Paulo via Adoniran Barbosa. Outra coisa que eu queria falar é que eu acho impressionante que um disco gravado em condições tão melhores, tão mais sofisticadas que os outros discos, se coloca no mesmo patamar deles. Isso que eu acho incrível. Eu não consigo achar que um disco é melhor do que o outro. Na verdade, eu consigo achar quais são os meus preferidos em determinados momentos da minha vida. Muita gente compartilha dessa visão, é aí que está o elemento do mistério. O Fellini tem um mistério, tem alguma coisa que só dá para explicar com um mistério que atrai as pessoas. Elas ficam intrigadas. “Como é que pode? Os caras fazem discos completamente diferentes com bons resultados”. Eu acho o “Amor Louco” um puta disco e isso que o Cadão falou do ritmo eletrônico incomodar, me incomodou também uma época. Eu achava que tornava ele, por incrível que pareça, o disco mais datado. Eu já não acho mais isso, mudei de ideia porque eu acho que o som eletrônico faz parte do disco, ele é tão inerente aos sambas, funciona tão bem com o baixo, que é também tão importante nesse disco. Ficou um samba meio…
Cadão: Alemão. (risos)
Thomas: Não é um ritmo eletrônico discreto.
Cadão: Sabe por que eu falei isso? Eu lembrava que os nossos ensaios dessas músicas tinham mais pegada, o ritmo não tinha uma importância tão grande. Não ficava tão aparente.
Thomas: A gente tocava ao vivo, eu lembro de um show em São Carlos, por exemplo, se você ouve as gravações, do show em Belo Horizonte também, a música começava assim “tun-ta-ti, tun-ti-tun-tati”. (risos). Quase todas as músicas são assim, alguém apertando um botão e entra aquele som “tun-qui-tun-tá, tun-qui-tun-tá”.
Cadão: Era exatamente assim (risos).
Jair: As programações ficaram muito boas dessas baterias.
Cadão: É um ruído que fica realmente interessante. Nunca tinha pensado nisso.
Thomas: Nesse disco, se fôssemos remixar, eu acho que poderia valorizar mais os violões, eu faria isso, mas pra que mexer nesses quatro discos? É até um sacrilégio.
E como surgiu a ideia de gravar o “Amanhã É Tarde” mais de dez anos depois?
Cadão: Eu lembro que o Thomas teve a ideia. Eu recebi em casa um CD com todas as músicas. Ele tinha colocado todas as músicas em um CD e dito tipo “faz todas as letras aí”. Eu fiz as letras em cima do CD e fui a Londres já com as letras preparadas e inclusive com os vocais que eu tinha imaginado que poderiam estar em todas as músicas. A gente gravou no esquema sala de visitas como é o segundo disco, mas com essa preparação anterior. As músicas estavam prontas, o que o Thomas fez foi gravar as minhas vozes e alguma coisa ou outra, se a gente for ver as fotos da época ele tá fazendo um instrumento ou outro. Foi uma época muito legal.
Thomas: Foram duas semanas.
Cadão: Eu fiquei na casa do Thomas e a gente praticamente não saiu de lá. A gente deu uma incerta ou outra em um pub ali perto, outro dia a gente foi ao Centro de Londres, andou por ali, mas no geral a gente ficou concentrado nessa vida familiar do Thomas e trabalhando essas músicas na sala de visitas. É um disco que eu gosto muito e tem uma das minhas músicas favoritas que é “As Peles”. Essa, de fato, dá um tremendo orgulho de ter feito. Eu tinha a letra, mas quando nós chegamos para gravar não dava muito certo. Aí o Thomas sugeriu que eu fizesse os vocais em cima de uma música antiga que não tinha sido gravada, que era “Milho”. E caiu como uma luva. Tinha um sample da Elizeth Cardoso.
Thomas: Esse é o disco dos samplers. Várias músicas o ritmo é um sample. Eu tinha descoberto o sampler. Eu fazia loops, mas usava de uma forma bem rudimentar mesmo. Eu usava o sampler pra montar um loop, chupava uma bateria de um CD e depois fazia ali um loop e tocava isso eternamente para usar como ritmo da música. Foi o primeiro disco do Fellini que a gente fez assim. Eu lembro que tinha um berimbau d`Os Ipanemas, a Elizeth, tem um sample de um músico de jazz em “Ventre Livre”, tem um compacto da coleção dos meus pais de Europop, de uma dupla chamada Esther & Abi Ofarim, que era um duo israelense, um compacto dos anos 60, eu lembrei e fiz um sample para a última música, “Canção”.
Thomas: A discografia tem ainda o “Você Nem Imagina”, que curiosamente na época a gente achou um flop, que não vendeu nada, mas eu soube depois que muita gente descobriu o Fellini por esse disco, muita gente jovem. Ele tem uma pegada mais pesada e como é uma coleção das músicas mais conhecidas, as que a gente consolidou no repertório ao vivo, ficou bem tocado, ficou legal, com peso. Então muita garotada se ligou no Fellini por esse disco.
Jair: E o “Posta Restante”?
Thomas: O interessante do “Posta Restante” é que foi um disco feito para o Orkut, com raridades registradas (e não lançadas) entre os anos 80 e 90 (nota do editor: que, inclusive, traz a primeira versão do “novo velho” single, “Leave Me Alone”).
Para encerrar, a banda vai chegar aos 40 anos em 2024. É muito tempo de carreira e amizade. O que vocês tiram disso para a vida de cada um?
Cadão: O Fellini me deu um monte de coisas. Eu fui trabalhar na televisão por causa do Fellini. Uma pessoa foi ver um show e achou que eu levava jeito e me convidou para apresentar o Metrópolis (TV Cultura). As manifestações de carinho de pessoas que conheceram o trabalho ao longo do tempo são inúmeras e sempre muito valiosas. As pessoas realmente foram tocadas por aquilo que a gente fez. As melhores coisas que eu fiz devem estar relacionadas com o Fellini de alguma forma. Sem contar que é uma história de quatro amigos. De vez em quando a gente briga, a gente acabou de brigar, inclusive (risos), e isso é legal porque somos quatro amigos mesmo, a importância deve ser para todos eles, é importante para a vida, a gente era jovem e isso ficou. O legal foi ter acontecido de uma forma muito nobre. A gente fez o que quis, do jeito que quis, e sempre foi assim.
Thomas: A banda permitiu que eu pudesse dizer o seguinte: “Eu sou o Thomas Pappon do Fellini”. Não é qualquer um que pode falar isso.
Jair: É uma amizade de 40 anos, tem esse peso, a nossa militância trotskista, antes da banda a gente já estava militando juntos há uns três anos. Pra mim tem uma importância muito grande, Fellini é um dos grandes amores da minha vida.
– Manoel Magalhães (@manoelmagalhaez) é músico e jornalista. Vive no Rio de Janeiro. A foto que abre o texto é de Lorena Calabria
Demais conhecer tantos detalhes de cada disco!
Sempre achei superestimada demais essa banda. Talvez por ser do udigrudi paulistano. Acho que os cinco discos davam um baita disco. Mas lembro que tive uma banda e tocávamos “rock europeu”. Era uma canção legal. Teu inglês também se sobressai. Mas fui reouvir dia desses alguns sons para baixar algumas músicas e realmente continuei não vendo isso tudo que a imprensa (carregada pela bizz) dizia.
concordo com vc
Eu era um daqueles poucos gatos pingados que foi em alguns shows. Na época o Fellini destoava um pouco das demais bandas. Soava mesmo como algo solto e amador, mas ao mesmo tempo capturava todo o espectro pós punk, sem necessariamente ter essa pretensão (ao menos uma pretensão fabricada ou arrogante). Tinha alí uma espontaneidade muito honesta e referencias que poderiam soar arrogantes, mas o ‘não se levar tão a serio’ me devolvia a simpatia e afastava qualquer suspeita de contradição. Tinha também uma áura que já soava ‘cult’ desde aquela época pra mim. Depois, com os demais discos eu fui me distanciando e hoje percebo que faltou maturidade pra entender as tendências que acabaram seguindo. Gosto da sutileza da música e das letras e de como é preciso imergir na estética sonora (propositalmente tosca ou não) para descobrir e entender a beleza poética meio que disfarçada de amadorismo puro e simples.
Amadores com talento. E ficaram meio que escondidos de grande parte da galera que poderia ter apreciado. O Jair Marcos sempre ficou triste com o fim da Banda, mas até hoje ele fala com entusiasmo de tudo isso. Mas cá entre nós – essa não era a única banda que tinha entre a turma. E eu acho que poderiam entrevistar outros, mas enfim, gostei da entrevista do pessoal, em relação ao Fellini
Valeu povo bonito.