CDs: Soul Asylum, Kula Shaker, Violent Femmes

por Leonardo Vinhas

“Change of Fortune”, Soul Asylum (Entertainment One)
A trajetória do Soul Asylum, que já soma 35 anos, é daquelas histórias cautelares do tipo “cuidado com o que você deseja, pois pode conseguir”. Depois de anos insistindo no underground, atingiram o sucesso mainstream com seu sexto disco, “Grave Dancers Union”, no distante 1992, puxados pelo hit “Runaway Train”. E depois… apenas o ostracismo, em discos cada vez mais insignificantes e palcos cada vez menores. Pirner não aguentou a pressão para repetir o sucesso de “Grave Dancers Union”, o baixista Karl Mueller faleceu devido a um câncer na garganta em 2004 e o guitarrista Dan Murphy se aposentou em 2012. Décimo primeiro álbum da banda, “Change of Fortune” talvez não recoloque o Soul Asylum no topo, mas certamente entrega prazer, qualidade e frescor, características que andavam em falta na sua discografia mais recente. A grosso modo, é aquele power pop clássico dos EUA, seguidor tanto das escolas Cheap Trick como Replacements, mas com esmero e sinceridade. OK, já se sabe que essas são qualidades subjetivas, então aos fatos: “Ladies’ Man” é um pop luminoso com discretos detalhes de teclados, um personagem absolutamente crível e um refrão que funciona com precisão no rádio ou como trilha de uma série de TV ou filme hollywoodiano. “Supersonic” segue linha semelhante, ainda que com menos requinte e mais velocidade no arranjo. Tem guitarras mais altas, bem ao gosto do fim dos anos 90, em “Can’t Help It”, “When I See You” e “Make It Real” (que leva até um vocoderzinho). “Don’t Bother Me”, “Morgan’s Dog” e “Doomsday” remetem a sonoridades que a banda já explorou no passado. De tudo isso, o que não seduz de imediato ao menos funciona – à exceção da faixa-título, uma derrapada feia rumo a uma “modernidade” que não combina com a banda.

Nota: 7

“K 2.0”, Kula Shaker (Strange F.O.L.K.)
Desde que voltou em 2006, o Kula Shaker vem a cada disco assumindo o lado mais psicodélico de seu som, vide os discos “Strangefolk” (2007) e “Pilgrim’s Progress” (2010). As influências indianas, o lado chapadão dos Byrds, George Harrison solo e até Mahavishnu Orchestra entram no rol de referências, mas o filtro é o do momento presente. Daí o título esquisito de seu quinto álbum, “K 2.0”. Não se trata de uma reedição de “K”, álbum de estreia do Kula Shaker lançado em 1996, mas sim uma “reinterpretação do espírito” daquele disco. Segundo o vocalista Crispian Mills vem dizendo em entrevistas, o primeiro disco do Kula foi forçosamente guiado em direção a uma sonoridade britpop – para ser justo, já na época do grande sucesso de “K” eles já citavam o desconforto com o resultado final do álbum. Parece papinho para agradar jornalista, mas a verdade é que dá para enxergar as mesmas intenções com um tratamento sonoro diferente. E, verdade seja dita, pode não causar a conquista fácil de hits como “Tattva” e “Govinda”, mas “Oh Mary” e “Here Comes My Demons” estão entre as melhores coisas que o quarteto inglês já fez – para não falar de “Infinite Sun”, primeiro single do disco, de adesão imediata. Para não perder o hábito, há um breve e simpático mantra (“Hari Bo”), um belo tema acústico (“33 Crows”), espaço para as guitarras solarem (“Mountain Lifter”) e uma porcaria absolutamente dispensável (a risível tentativa funky de “Get Right Get Ready”). Não surpreende como “Peasants, Pigs & Astronauts” (1999), é verdade, mas está muito acima da média apresentada pelos trabalhos de seus companheiros de geração.

Nota: 7,5

“We Can Do Anything”, Violent Femmes (PIAS America)
Tudo que o fã do Violent Femmes aprecia na banda está em doses exatas neste que é seu primeiro álbum de material inédito em 16 anos: os riffs e harmonias acústicos, as pontes em escalas decrescentes, o humor sarcástico, a bronca anti-cristã, as melodias pop e as canções de amor desencantadas. O mais surpreendente é que esse período sem gravações foi de muito quebra-pau entre os ex-integrantes, devido a disputas judiciais envolvendo a autoria das canções. Gordon Gano (voz e guitarra) e Brian Ritchie (baixo), que trocaram farpas pesadas em público, se acertaram e voltaram para tocar em alguns festivais a partir de 2013. Na bateria, nem o fundador Victor De Lorenzo (que definiu a situação atual da banda como “perda de um ente querido”) nem seu substituto, Guy Hoffman: quem está nas baquetas é Brian Viglione, dos Dresden Dolls (no disco, porque ele já pulou fora, cedendo o lugar a John Sparrow). Tanta encrenca interna não se reflete na música. A malemolência de “Issues”, o vigor anti-Deus de “Holy Ghost”, a cara-de-pau de enfiar doo-wop no folk de “Untrue Love”, o apelo pop de “Memory”, o clima de festa caipira de “I Could Be Anything” e a delicadeza de “What You Really Mean” são boas razões para validar a impressão de quem diz que “We Can Do Anything” é comparável ao clássico disco homônimo de estreia, de 1980.

Nota: 9,5

– Leonardo Vinhas (@leovinhas) assina a seção Conexão Latina (aqui) no Scream & Yell.

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