por Marcelo Costa
“Pequeno Dicionário Amoroso 2”, de Sandra Werneck (2015)
Cada país tem o “Antes do Amanhecer/Antes do Pôr-do-sol” que merece. O “nosso” é este, cujo primeiro filme, correto e eficiente, foi lançado em 1997, e a sequencia chega agora imaginando a vida de Luiza (Andrea Beltrão) e Gabriel (Daniel Dantas) 16 anos depois. O frescor da história, infelizmente, ficou no século passado, e “Pequeno Dicionário Amoroso 2” peca por ser penosamente simplório. O roteiro segue a estrutura do primeiro filme (“emprestada” de “Fragmentos de um Discurso Amoroso”, de Roland Barthes) e, diferente da trilogia de Richard Linklater, não foca apenas nos personagens adultos, mas tenta (equivocadamente) atualizar a visão romântica através de pequenos núcleos de personagens jovens. O ponto de partida é o enterro do pai de Luiza, que marca o reencontro do ex-casal. Agora, Luiza vive com o engenheiro Alex, com quem teve um filho, mas o casamento desgastado está nas últimas. Gabriel namora Jaqueline, uma mulher mais nova, por quem não é totalmente apaixonado (mas há o sexo). O vazio de suas vidas atuais os aproxima e dá-lhe confusões românticas. Na trama secundária, Alice (Fernanda Vasconcellos) descobre as agruras de um triangulo amoroso e João (Miguel Arraes), um garoto de 13 anos, se passa pelo quarentão Samurai numa sala de bate papo da internet, e marca um encontro com a experiente Lady Jane (Elisangela). Bem intencionado, mas piegas, blasé e monótono, “Pequeno Dicionário Amoroso 2” é como uma velha canção de Chico Buarque emoldurando imagens de cartão postal do Rio: entediante.
Cotação: *
“Ricki and the Flash”, de Jonathan Demme (2015)
Não será dessa vez que Meryl Streep irá receber sua 20ª indicação ao Oscar, e a “culpa” não é da atriz, que, claro, se sai bem nesse suave drama familiar, mas sim da direção (monótona) de Jonathan Demme (“O Silêncio dos Inocentes” e “O Casamento de Rachel”) e do roteiro raso de Diablo Cody (“Juno”), que na ânsia de fugir do óbvio acaba inserindo elementos na trama que não são aprofundados deixando de discutir o que deveria importar na história: sonhos vs maternidade. Meryl vive a roqueira Ricki, líder da banda The Flash, um quarteto de classic rock que desde a era mesozoica toca no mesmo boteco de Los Angeles, sem fama, mas com um pequeno público fiel. Para completar o orçamento, Ricki trabalha como caixa em um supermercado, e a monotonia de sua vida é alterada quando o ex-marido liga pedindo ajuda para confortar a filha do casal, que acabou de ser abandonada pelo marido, e não está lidando bem com a situação. Ricki enfrentará a mágoa dos filhos que abandonou, mas, claro, os reconquistará (Zzzzzzzzzz). Os argumentos são frouxos, mas o carisma de Meryl salva um filme menor, que ainda traz o ótimo Kevin Kline como ex-marido, Rick Springfield como guitarrista e namorado e o lendário Rick Rosas, baixista da Crazy Horse, banda que tocou com Neil Young por décadas, falecido ao final das gravações. Não dá pra condenar um filme que abre com uma canção de Tom Petty e tem uma música de Bruce Springsteen no clímax, então a palavra aqui é descompromisso: assista sem grandes expectativas.
Cotação: **
“Que Mal Eu Fiz a Deus?”, de Philippe de Chauveron (2014)
Maior sucesso de bilheteria na França em 2014, o ponto de partida desta ótima comédia de costumes é bastante interessante: um casal católico provinciano, os Verneuil, teve quatro filhas. Para desgosto deles, a primeira se casou um argelino muçulmano; a segunda subiu ao altar com um judeu; e a terceira filha decidiu juntar os trapos com um chinês. Ainda há esperança para a quarta filha, que por fim atenderá ao desejo dos pais e se casará com um católico – “infelizmente” marfinense. Colocando o racismo em pauta com extrema delicadeza (francesa), o diretor Philippe de Chauveron (também responsável pelo roteiro) exibe em “Qu’est-ce qu’on a fait au Bon Dieu?” uma divertida história de choques culturais numa torre de Babel familiar. Comédias de costumes se baseiam notoriamente em expor pessoas de uma determinada cultura aos pontos marcantes de outra, e em “Que Mal Eu Fiz a Deus?” esse retrato é divertidamente pintado de cinco maneiras extraindo de cada uma delas pequenos símbolos das diferenças de uma sociedade cada vez mais multicultural. Ainda que as expectativas dos pais sejam frustradas e acabem trazendo a tona o racismo que eles guardavam pra si mesmos, “Que Mal Eu Fiz a Deus?” é esperto o suficiente para mostrar que há racismo em todos os cantos, em maior e menor grau, sugestionando que a saída é a convivência e o respeito – sem esquecer o humor. Extraindo comédia de um tema sério, Chauveron diverte, entretém e faz o espectador perceber que, apesar das “diferenças”, somos todos iguais.
Cotação: ***
– Marcelo Costa (@screamyell) edita o Scream & Yell e assina a Calmantes com Champagne
“Pequeno Dicionário Amoroso 2” pode até ser tudo o que foi dito, quanto a “entendiante” canção de Chico Buarque acho que o autor se equivocou confundindo com a produção atual do compositor, pois justamente as antigas que são as melhores da sua carreira…
O autor não disse que a canção é entediante, AL Souzza. Ele escreveu que “é como uma velha canção de Chico Buarque emoldurando imagens de cartão postal do Rio”, ou seja, a junção de uma música x com imagens y rende um resultado w, que é igual a tédio.