por Marcos Paulino
Samuel Rosa precisa interromper por uns instantes a entrevista em que fala sobre o novo disco do Skank, “Velocia”, para atender o filho adolescente, pelo celular. Faz uma série de recomendações e pede cuidado, postura típica de um respeitável pai de família de 47 anos. Por outro lado, mesmo após os 23 anos de carreira da banda, Samuel discorre sobre o mais recente álbum e sobre música de um modo geral com entusiasmo de um jovem iniciante.
“O Skank ainda se entusiasma muito com a possibilidade de compor uma música, de ver o público cantando”, conta Samuel, que viu sua banda surgir com um álbum independente em 1992 e atravessar as décadas se transformando em um dos principais nomes do pop brasileiro, com dezenas de hits no repertório e público imenso e fiel, fato que o registro ao vivo no Mineirão em 2010 e os elogiados shows no Rock in Rio referendam.
“Velocia”, primeiro álbum de inéditas do Skank em seis anos, traz Dudu Marote novamente na produção (em sua quarta parceria com a banda) e conta com participações especiais de BNegão, Nando Reis e da cantora paulista Lia Paris além de novos parceiros: Lucas Silveira, do Fresno, divide a autoria de “Do Mesmo Jeito“ enquanto Emicida marca presença assinando “Rio Beautiful” e “Tudo Isso” ao lado do vocalista. Confira o bate papo com Samuel:
Por que vocês demoraram seis anos para gravar um disco de inéditas?
Sempre existe um hiato maior entre o lançamento de dois discos de inéditas intercalados por um disco ao vivo. Foi o que aconteceu desta vez. É preciso respeitar o tempo da banda, mais do que qualquer possibilidade de atender uma demanda de regularidade ou de presença na mídia. Não faz sentido uma banda consolidada, depois de mais de 20 anos de carreira, ter pressa em lançar um álbum. Este disco começou a ser feito em 2013, quando achamos que estava na hora.
Mesmo após tanto tempo de carreira, ainda dá um frio na barriga quando vocês lançam um novo disco e ficam esperando a reação do público e da crítica?
O Skank ainda se entusiasma muito com a possibilidade de compor uma música, de ver o público cantando. Isso é sempre surpreendente, pode ser pra 80 mil pessoas, como no Rock in Rio, ou pra 3 mil, como em Ipatinga, no interior de Minas Gerais. O mesmo vale para o lançamento de um álbum, que é uma fase deliciosa, porque é o fim de um trabalho, e aí você começa a ver como aquilo reverbera nas pessoas, no rádio, nos seus amigos, na família. É um momento de receber críticas e elogios, de passar pelo crivo das pessoas. É um dos momentos mais legais da nossa carreira.
Este disco passeia pelos vários momentos do Skank, tem rock, reggae, eletrônica. Durante a composição das músicas, vocês seguiram alguma linha ou deixaram fluir naturalmente?
Este disco é muito fruto do processo dele, não teve nada premeditado, uma ideia prévia do que deveríamos fazer ou não, como já existiu em outros álbuns. Isso é natural pra uma banda de tanto tempo, mais autoconfiante. Interessante que, mesmo sem nada planejado, a gente acabou de novo namorando as várias facetas pelas quais a gente expressou nossa música.
O disco foi gravado em Belo Horizonte, ganhou arranjos em Londres, foi mixado em Nova York, a capa foi feita na Espanha. É um privilégio chegar num estágio em que se pode aproveitar o que de melhor há em qualquer parte do mundo?
Quem passou certas privações no início da carreira, tendo que gravar disco com recursos próprios, agora quer se lambuzar (risos). Mas obviamente existe uma ideia saudável nisso, que é acreditar no disco como uma obra. É um contraponto ao que a gente está vendo hoje, com a música instantânea, a velocidade das coisas. O cuidado com a embalagem e com os processos periféricos aponta para o cuidado da banda com ela própria. É muito legal constatar que uma direção artística norteou o trabalho de uma banda. O álbum é hoje uma forma até sofisticada de ouvir música, é difícil imaginar ter um tempo pra escutar um disco.
O Nando Reis participa de várias composições, quase como um quinto componente da banda. Essa presença maciça dele também veio naturalmente?
Isso foi uma das poucas coisas planejadas (risos). Eu e ele já tínhamos ideia de fazermos mais coisas juntos pro Skank. O índice de aproveitamento dele é absurdo, as músicas do Nando sempre são as que fazem mais sucesso. A partir de um especial que a gente gravou há uns três anos, isso despertou mais nosso entusiasmo com a parceria. Ele é um cara que ajudou a escrever nossa história.
Por outro lado, há a participação de novos parceiros, como o Lucas Silveira, da Fresno, e o Emicida. Isso é uma forma de aproximar o Skank do público mais jovem?
Não acho que o Skank dependa dessas pessoas pra chegar ao público mais jovem. Mas dependemos das diferenças desses encontros pra avançar na nossa música, pra soar diferente, pra sair do lugar. Não é à toa que tenho feito isso com diferentes pessoas ao longo da minha carreira. Se por um lado não tenho essa fluência pra escrever letras, por outro é um privilégio poder tabelar com outras pessoas a partir dessa dificuldade. Desta vez, privilegiei novos parceiros, porque também quero descobri-los. E eu também tenho alguma coisa pra contribuir com eles.
Já há uma turnê programada para o disco novo?
A partir de setembro, começaremos a temporada pelas principais capitais, com tudo novo, cenário, luz. Até lá, a ideia é ir experimentando as músicas novas no show atual.
– Marcos Paulino é jornalista e editor do caderno Plug, do jornal Gazeta de Limeira
Leia também
– Henrique Portugal: “As bandas ficaram mais independentes” (aqui)
– “Calango” é o disco mais importante de toda carreira do Skank (aqui)
– A mesma música: Bob Dylan x Skank (aqui)
– “Estandarte” carece de unidade e soa um disco menor do Skank (aqui)
– “Multishow ao Vivo no Mineirão”, Skank, é só pra quem estava lá (aqui)