“Piracema”, Do Amor (Independente)
por Pedro Salgado, de Lisboa
No sucessor do álbum homônimo, de 2010, o Do Amor mantém as anteriores premissas melódicas, o caráter dançante da sua música e o cuidado nas letras, mas envereda também por um interessante experimentalismo sonoro em um disco que conta com as participações de Arto Lindsay, Alex Kassin e Moreno Veloso, entre outros. O trabalho do produtor Daniel Carvalho proporcionou ao grupo um suplemento de energia e confiança que atravessa a maioria das faixas apresentadas, e as primeiras músicas do disco são exemplares. Na pop atrevida de “Ofusca” canta-se: “Eu não te mastigo, te deixo no prato / Encho seu umbigo de amor temperado”, concluindo sem reservas: “Tudo o que a gente fez, vamos fazer outra vez”. Já o som seco e meio funky da faixa “Mindingo” remete para os anos 70, mas “Esse Fumo É Bom” arrebata o título de melhor canção conjugando tropicalismo, uma boa dose experimental e as letras mais ambiciosas do novo trabalho. Das músicas cantadas em inglês, merece destaque “I’m A Drummer”, na qual o baterista Marcelo Callado cria um jogo de palavras entre drummer (baterista) e o “drama” de não conhecer melodias. As harmonias vocais lembram um pouco os Beach Boys. Para além da abordagem e cruzamento de sonoridades como o rock, cumbia, baião, lambada ou carimbó, a banda carioca também marca pontos em faixas como “Quando Ele Chegar”, um encontro entre a pop e o psicodelismo, ou “Tears And Fears Away”, provando que os anos 80 constam nas influências do conjunto.A faixa título, uma homenagem à fazenda onde os autores de “Chalé” gravaram o álbum, serve como conclusão da aventura: “Piracema seja o que quiser, o que foi já é”. E “Undum” recupera as experiências de ‘crossover’ entre heavy metal e carimbó que já tínhamos visto na versão de “Movimento Perpétuo Associativo”, do Deolinda. “Piracema” ainda não é a obra-prima que o Do Amor idealizou, mas reforça a competência musical de Gustavo Benjão, Gabriel Mayall, Ricardo Dias Gomes e Marcelo Callado, lançando as bases para o ponto alto da sua criação.
Nota: 7,5
Download gratuito: http://doamor.bandcamp.com/album/piracema
“O Mais Feliz da Vida”, A Banda Mais Bonita da Cidade (Independente)
por Marcelo Costa
Dois anos após “Oração”, que hoje soma 12 milhões de visualizações no Youtube, o quinteto curitibano ainda colhe frutos da exposição: tem um público fiel e uma agenda organizada de shows (algo raro no cenário independente) como também sofre do descaso daqueles que pegaram birra da banda devido ao fenômeno do vídeo de estreia. Para o segundo grupo, um conselho: preste atenção em “O Mais Feliz da Vida”, segundo disco d’A Banda Mais Bonita da Cidade. Com trabalho gráfico cuidadoso e produção esmerada assumida pelo tecladista Vinicius Nisi, “O Mais Feliz da Vida” soa como um classudo trabalho de música pop contemporânea, uma música pop extremamente bem cantada, tocada e teatralizada. Com sotaque inconfundível de viola caipira num arranjo de pegada nova-iorquina, “O Mais Feliz Da Vida”, a canção (única produzida por Chico Neves), é daquelas músicas que gruda, destacando uma interpretação deliciosamente segura de Uyara Torrente, com inflexões e risos que valorizam a boa letra de Rodrigo Lemos. Da safra do poeta Luiz Felipe Leprevost surgem as ótimas “Potinhos” e “Deixa Eu Dormir Na Sua Casa”, esta segunda com Igor Ribeiro no flugelhorn. No quesito covers, a escolha não poderia ter sido mais acertada: “Que Isso Fique Entre Nós”, grande canção de Pélico, e “Olhos da Cara”, música de Nuno Ramos composta para o parceiro Romulo Fróes, ganham força em belos arranjos. Ainda vale citar as ótimas “Saindo de Casa” (uma das melhores canções do disco), de outro compositor curitibano, Alexandre França, “A Balada Da Contramão” (de e cantada por Rodrigo Lemos) e “Maré Alta”, boa parceria de Rodrigo e Castor Luiz com Tibério Azul, surpresa recente do cenário recifense, destaques de um álbum que exibe uma banda interessantíssima evoluindo enquanto os cachorros ladram.
Nota: 7,5
Download gratuito: http://www.abandamaisbonitadacidade.art.br/
“Impossível Breve”, Jennifer Souza (La Femme Qui Rote)
por Bruno Capelas
Uma das melhores bandas surgidas no Brasil nos últimos anos, a mineira Transmissor se destaca de suas contemporâneas por contar com não apenas um, mas três bons compositores em sua formação, como mostra o certeiro álbum “Nacional”, lançado em 2011. É natural, então que, além de duelar por espaço dentro do repertório da banda, eles deem vazão às suas carreiras solo. Se no ano passado foi a vez de Leonardo Marques mostrar “Dia e Noite No Mesmo Céu”, agora é a hora de Jennifer Souza cantar o seu “Impossível Breve”, um disco cheio de baladas emocionadas e confessionais. Produzido por Thiago Corrêa, o terceiro homem de letras da Transmissor, “Impossível Breve” passeia por uma sonoridade que mescla os momentos nublados do Clube da Esquina e da Bossa Nova com Elliott Smith, Belle & Sebastian e Bright Eyes. Como se pode prever pela descrição anterior, este é um disco para corações em tormenta. Ao longo do álbum, Jennifer mostra personagens que buscam respostas no acaso (“Sorte ou Azar”), se afundam em nostalgia (“Logo Tudo Acabado”), fazem parte de um casal distanciado (“Pedro e Lis”, em bela parceria com Fábio Góes), reconhecem-se sós (“Le Flaneur”) e percebem que a estrada é longa, mas pode ser o melhor caminho (na folk e quase feliz “Para Kerouac”). Ao final de suas dez canções, “Impossível Breve” mostra uma compositora dona de voz própria e sem medo de se abrir perante o microfone. Pode parecer redundante falar isso em um país que revela uma voz feminina a cada estação, mas poucas delas possivelmente mostraram a personalidade em uma estreia recente como Jennifer faz. Fique atento.
Nota: 8
Download gratuito: http://www.jennifersouza.com/
Leia também:
– Entrevista: Do Amor -> “Poderemos seguir um caminho mais experimental” (aqui)
– Do Amor faz piada, homenageia, diverte. Porém, parece ter perdido o timing. Será? (aqui)
– Estreia d’A Banda Mais Bonita da Cidade merece audição atenta e desarmada (aqui)
– Transmissor recupera o Clube da Esquina pela estrada do rock em “Nacional” (aqui)
– Belo Disco solo de Leonardo Marques é jogo de pingue-pongue entre BH e LA (aqui)
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