Medo e tensão sexual parecem ser os principais fios condutores de ”Kiss Land” nova obra de Abel Tesfaye, mais conhecido como The Weeknd. Quarto álbum do projeto, “Kiss Land” já caiu na web e tem lançamento oficial marcado para o dia 10 de setembro.
O produtor canadense despontou na internet no final de 2010 com uma série de mixtapes que chocavam soul e pop com eletrônico, resultando em uma nova releitura do R&B contemporâneo, território também frequentado por gente como Frank Ocean e o rapper Drake, que reconheceu o talento do amigo colaborando com Abel em diversas canções – e inclusive no novo álbum.
A partir daí, o cantor começou a exibir e definir a sua assinatura musical. Os três primeiros registros em estúdio: “House Of Balloons”, “Thursday” e “Echoes Of Silence” (todos de 2011, lançados em 2012 no pacote “Trilogy”) são intrigantes, misteriosos, e por muitas vezes obscuros e mentalmente perturbadores, valorizando um discurso hedonista repleto de referencias a sexo e drogas, outros dois traços marcantes na personalidade de Tesfaye.
Abel Tesfaye optou por continuar a abordar as temáticas acima, mas oferece uma nova roupagem no tratamento de produção em ”Kiss Land”, dessa vez menos caseiro e, por conseguinte, mais rebuscado. Com evidente influência de artistas como o Portishead (a canção “Belong To The World”, novo single do cantor “pega emprestado sem autorização” os samples de “Machine Gun”) o álbum também traz uma aproximação visual com a temática oriental, flertando com colagens de animes, pandas coloridos e ideogramas japoneses.
”Kiss Land” é um disco sobre fantasias misóginas, expressando sentimentos de cansaço e de afobação em uma espécie de looping, apresentados em um modelo que utiliza estruturas sonoras futuristas enquanto discute com grande vigor a hipersexualidade – seja ela excêntrica, egocêntrica, triste ou devastadora. Beneficamente, o resultado de todas essas percepções e características transborda em uma música viciante e fascinante.
Além disso, o narcisismo, o individualismo e a era digital são outros pontos construídos em torno da culpa, dos excessos de substâncias ilícitas e de relações sexuais frias vividas e analisadas pelo músico na faixa “Adaptation”, onde o timbre de Abel se assemelha mais do que o de costume com o de Michael Jackson.
No entanto, uma nova questão entra em pauta em “Kiss Land”. Todas as músicas do disco exploram o medo de Tesfaye. Em entrevista a revista americana Complex, o produtor fala sobre a inspiração ao produzir o quarto disco: “Muito do álbum é inspirado em trabalhos de cineastas como John Carpenter, David Cronenberg e Ridley Scott, pois eles sabem muito bem como capturar o sentimento de medo. Para mim ‘Kiss Land’ é um honesto ambiente de medo. Eu não sei quem eu sou nesse momento, e estou me envolvendo em coisas estranhas com as quais ainda não estou familiarizado. Isso é muito assustador. Quando você escuta os gritos gravados no disco e ouve essas terríveis referências acaba sentindo medo. Eu quero que você escute a minha música para sentir o que eu sinto. ‘Kiss Land’ é um filme de terror.”
O produtor Pharrel assina o remix da ótima “Wanderlust”, presente como faixa bônus na edição luxuosa do álbum (junto a “Odd Look”), e o acerto não se repete em “Live For”, parceria com Drake, que abre espaço para as rimas corriqueiras do rapper que culmina em um refrão fraco, sem alcance ou identificação com o resto do álbum – por mais que a canção fragmente um pouco do processo de letargia e de transe do trabalho como um todo.
Porém, hipnotizar os ouvintes é o que Abel sabe fazer de melhor. Expert ao brincar com as preliminares, ele consegue deixá-las tão interessantes ou ainda mais prazerosas como se uma simples canção fosse um ato sexual. As histórias, simbologias visuais ostentadas nos videoclipes, letras e experiências de The Weeknd podem ser até imaturas ou vazias, mas ainda geram comoção e curiosidade do público.
Com a adição de “Kiss Land” a discografia quase impecável de Abel, o artista prova extrema relevância e contribuição ao cenário atual do R&B. O quarto projeto é um declaração nítida contra a chegada da fama – momento emblemática em que o músico (a exemplo de tantos outros) trava uma luta de amor e de ódio com o tema, além de um manifesto a favor da realização de seus sonhos, vivendo o momento presente (seja ele real ou fantasioso).
Talvez ”Kiss Land” não soe um disco de audição fácil para ouvintes que procuram por algo de rápida digestão (o que nunca foi o que Abel procura e oferece em sua musicalidade), mas tende a crescer conforme é ouvido. Por isso, separe um tempo para ouvir o novo trabalho do The Weeknd: ele soa mais apurado e maduro que os três trabalhos anteriores, revelando um cantor de timbre suave, provocante e frágil que merece atenção.
– Andressa Monteiro (Twitter: @monteiroac / Facebook: https://www.facebook.com/monteiroac) é jornalista e já escreveu para o Scream & Yell sobre Cold War Kids (aqui) e John Mayer (aqui) e entrevistou The Ugly Club (aqui) e Silva (aqui), entre outros.
Leia também:
– “Thursday”, The Weeknd: entrega um personagem agora completo, por Tiago Faria (aqui)
– “Take Care”, Drake: um disco megacorporativo e ultracomercial, por Tiago Faria (aqui)
Na minha modesta opinião teu texto expressou tudo que eu penso do meu amado Abel Tesfaye, confesso que não sabia de sua existência até me deparar com Wicked Games, mas não dei muita atenção na ocasião e deixei passar.
Mas um dia zapeando como doida com o controle remoto, parei no VH1 Mega Hits, e me vejo enfeitiçada pelo clipe “Belong To The World”, desse dia em diante me vi obcecada por The Weeknd.
House of Balloons (2011),Thursday (2011),Echoes of Silence (2011),Trilogy (2012)
Kiss Land (2013) e Kissland 2.0 já tem lugar cativo no meu coraçãozinho.