por Bruno Capelas
Desde seu título, “Filho Teu Não Foge à Luta” (Intrinseca), livro do jornalista Fellipe Awi, tem uma intenção clara: mostrar como os brasileiros transformaram o MMA (da sigla em inglês ‘mixed martial arts’, ou artes marciais mistas) em um “fenômeno mundial”. Em pouco mais de trezentas páginas, o autor desvela essa trajetória, partindo do desenvolvimento do jiu-jitsu brasileiro pela família Gracie a partir do encontro de Gastão Gracie com o Conde Koma em Belém, nas décadas de 1920 e 1930, até os dias de hoje, nos quais Anderson Silva reina no octógono do UFC (e também nos comerciais).
Com boa didática, Fellipe Awi, que é repórter do canal por assinatura SporTV, inicia seu livro explicando como os Gracie, uma família que “nunca levou desaforo pra casa”, alimentaram durante décadas os confrontos entre modalidades. Essas lutas opunham algum integrante da família (o patriarca Hélio, ou Carlson Gracie, sobrinho dele, por exemplo) aos praticantes da luta-livre, da capoeira e de outras artes marciais, procurando provar que o jiu-jitsu era a melhor das lutas.
Nos anos 40 e 50, essa postura fez com que o jiu-jitsu ganhasse prestígio popular (graças às lutas promovidas pelos Gracie, muitas vezes sediadas em estádios de futebol) e político – homens como Carlos Lacerda e Getúlio Vargas foram alunos da família. Na época, os confrontos – muitas vezes propagandeados como “sem regras” e anunciados como “vale-tudo” – eram transmitidos pela televisão, com bons índices de audiência.
Entretanto, em 1962, a exibição ao vivo de um braço quebrado levaria à proibição do vale-tudo no Estado da Guanabara, dando início a um longo período de reclusão e ojeriza ao esporte no Brasil. A saída encontrada por um dos filhos de Hélio Gracie, Rorion, foi partir para os Estados Unidos, e lá tentar mostrar o jiu-jitsu, inicialmente através de aulas na garagem da casa onde morava.
Em 1993, Rorion criaria o UFC, junto ao Semaphore Entertainment Group (SEG). Entretanto, naquela época, o cinturão era disputado por lutadores de diferentes modalidades, que se enfrentavam em modelos de quartas de final, semifinais e finais, em apenas uma noite. Em sua primeira edição, o evento foi um sucesso no pay-per-view, chegando à casa de 86 mil famílias americanas, com a vitória de Royce Gracie, irmão de Rorion. Em 1995, na mesma época que o senador republicano John McCain promove uma cruzada contra a violência do UFC, tornando o vale tudo proibido em 36 estados americanos, Rorion se desliga do evento, ao não concordar com mudanças pedidas pelo SEG. Entretanto, outro brasileiro transformaria o vale-tudo em MMA: Marco Ruas, vencedor do UFC 7.
“The King of the Streets”, como ficou conhecido, foi inovador ao misturar elementos de diversas lutas, e não apenas usar golpes e movimentos de uma única técnica dentro do ringue – ele era faixa preta de judô, tae-kwon-do e luta livre, além de ter sido campeão carioca de boxe. Tal habilidade lhe dava a capacidade de lutar bem tanto em pé, trocando socos e chutes, quanto no chão, procurando encaixar chaves de braço e finalizações. Em “Filho Teu Não Foge à Luta”, fica clara a ideia de que o termo ‘mixed martial arts’ se deve a ele – e mais do que isso, Ruas faz com que a pergunta essencial por trás do UFC deixa de ser “qual é a melhor luta?” para ser “quem é o melhor lutador?”.
Porém, o livro exagera quando dá crédito demais ao Brasil: por mais que a primeira organização do UFC e a junção de diversas lutas em uma prática só sejam ideias tupiniquins, como mostra Fellipe, o “fenômeno mundial” que é o MMA hoje está longe de ser algo fabricado por nós. Isso se torna mais evidente quando, já na parte final do livro, Fellipe explica a estrutura por trás do Pride – campeonato japonês de MMA, que fez a fama e a glória de Wanderlei Silva e Minotauro, na primeira metade dos anos 2000 – e do próprio UFC, comandado pelas mãos espertas de Dana White e o dinheiro dos irmãos Fertita, donos de uma rede de cassinos em Las Vegas.
É Dana White, um lutador de boxe medíocre, quem transforma o UFC em um sucesso nos quatro cantos do mundo, através de novas regras e de um sistema de marketing perspicaz, incluindo a utilização das redes sociais – ele tem um vídeo blog no qual posta atualizações quase diárias sobre os bastidores do torneio, e muitas de suas impressões sobre as lutas.
Outro ponto fundamental da estratégia de White foi a realização do ‘The Ultimate Fighter’, reality show exibido desde 2005 nos Estados Unidos – e que agora tem sua primeira edição no Brasil. O programa é indispensável para se entender a mudança de lugar do UFC: se antes do reality o esporte era visto como extremamente violento, depois dele percebeu-se o drama humano de cada lutador, que aproxima o público do octógono com outro olhar.
Fellipe Awi não é ingênuo a ponto de deixar isso passar batido: os últimos capítulos do livro são dedicados a explicar o que é o UFC hoje, dando bastante destaque para Dana e seu empreendimento, mas a sensação que resta é que “Filho teu não foge à luta” tenta vender algo diferente do que acontece na realidade.
Vale ainda ressaltar que pouco destaque é dado aos lutadores brasileiros de sucesso hoje – Anderson Silva e Vítor Belfort aparecem bastante, mas as histórias de José Aldo e Júnior Cigano, atualmente detentores do cinturão de suas categorias, são explicadas em pouco menos de duas páginas cada. E também é necessário comentar a ausência completa de menções no livro ao “UFC Sem Limites”, programa da Rede TV exibido até o final de 2011, o primeiro da TV aberta brasileira a mostrar o campeonato, e bastante responsável por sua popularização.
Seja como for, “Filho Teu Não Foge à Luta” tem o mérito de ser editado no calor da hora, quando o MMA se torna um dos esportes mais populares do planeta. Com boa pesquisa, ótimas entrevistas e emoção cuidadosa, faz reconstituição preciosa da história da modalidade, explicando porque o UFC é um dos campeonatos mais lucrativos do mundo, sendo uma grife que fatura anualmente 400 milhões de dólares. É um livro de leitura recomendada tanto para aqueles que se emocionam com os chutes e socos de Anderson Silva, quanto para quem vê o esporte à distância, mas deseja entender seu sucesso, e de que maneira o Brasil pode lucrar com isso. Fellipe Awi não chega a conseguir uma empolgante chave de braço com “Filho Teu Não Foge à Luta”, mas vence bem por pontos ao final de quinze interessantes rounds.
– Bruno Capelas (@noacapelas) é jornalista, escreve para o Scream & Yell desde maio de 2010 e assina o blog Pergunte ao Pop.
Fotos: Lutadores / Divulgação MMA-Brasil – Do jornalista Fellipe Awi / Divulgação Intrinseca
quero ler esse. recentemente, li o livro do Anderson, vendido como “biografia”, mas que nao passa de um relato.
é interessante por desenterrar, sempre apenas na versao do lutador, histórias do começo da carreira dele, mas vai envelhecer em mt pouco tempo.
outra coisa chata, naquele, é a repetiçao contarante de frases como “sou assim, nao guardo mágoas” e outras coisas do tipo. haja saco.
Haja saco pra essa bosta de MMA.
Se a Globo não tivesse comprado os direitos desse lixo esse jornalista não teria feito esse livro.
É a máquina em ação. E não estou falando do negão de voz fina.
bacana. Não li o livro. mas gosto muito de MMA, assim como gosto de ver boxe e judô na tv. e é legal que haja livros que comecem a dissecar o fenômeno.
Caro Zé Henrique,
Vejo que vc deve ser um gordo, esquisito e recalcado…pois falar assim de um atleta que representa o seu pais…. e consequentemente é o melhor do mundo. Mas vivemos em um país que…quem tem boca falar o que quer…e vc se esconde atras de um computador….sendo assim é facil falar mal de qualquer um. Na real…haja saco para aturar pessoas como vc…..seu pela saco.