por André Azenha
Em seu último longa, George Clooney interpreta Jack, assassino profissional norte-americano que vai à Itália aguardar um novo trabalho, reflete sobre o passado, se apaixona. E diz ao contratante que encerrará a “carreira” depois da missão. Só que no cinema sabemos que esse tipo de desejo nem sempre termina bem para o matador.
“Um Homem Misterioso” (“The American”, título original) é sobre um personagem que vemos com frequência em filmes: o assassino profissional, atividade nem um pouco honrosa. E porque será que os produtores insistem tanto em filmá-lo de novo e de novo? Alguns dirão: o público gosta de violência. Nem sempre. Talvez tal resposta valha para blockbusters como “O Chacal” e “Assassinos”, em que Bruce Willis e Antônio Banderas respectivamente vivem assassinos que agem sem o menor peso na consciência. Não é o caso de Jack.
O Jack de Clooney pertence à outra linha de assassinos da sétima arte. Um grupo formado, entre outros, pelo Jean Reno de “O Profissional”, Matt Damon da trilogia “Bourne”, Uma Thurman de “Kill Bill”, Andy Lau de “Profissionais do Crime”, Colin Farrell de “Na Mira do Chefe”, e até Stallone, do próprio “Assassinos”. Sujeitos que, em determinado momento de suas vidas, decidem pular fora, recomeçar. Buscam redenção. Não se orgulham do que fazem.
Alguns realizadores devem ter percebido que esses personagens refletem anseios do público. Afinal, se esses caras, naquela que provavelmente seja a mais execrável “profissão” do planeta, em algum momento dizem basta, reconhecem os erros, se arrependem, querem algum perdão; porque nós, com nossos erros menores do dia-a-dia, não podemos encontrar nossa redenção, seguir em frente? Eis uma identificação que muitas vezes nos escapa, passa despercebida. Por isso nos pegamos, geralmente, torcendo por pessoas (ou personagens) que moralmente deveríamos reprovar.
Anton Corbijn, cineasta cujo trabalho anterior, “Control”, retratou outro homem típico das tragédias gregas, o vocalista do Joy Division, Ian Curtis, sabe onde pisa. Pegou o excelente roteiro de Rowan Joffe (baseado em livro de Martin Booth), com raros e certeiros diálogos, e junto a belas imagens (das paisagens italianas e das mulheres italianas) e uma atuação inspirada de George Clooney, concebeu uma obra inspirada.
Tudo foi milimetricamente calculado. As pausas, o silêncio, a ação. Nada é esticado demais, ou rápido demais. “Um Homem Misterioso” não é o último filme protagonizado por um assassino profissional que deseja parar, mas certamente é um dos melhores que soube retratar o sentimento de culpa do homem. No cinema, em muitos casos, a culpa não é perdoada. Na vida real, ao menos contamos com o livre arbítrio para, no instante seguinte, tentar recomeçar do zero.
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– André Azenha (@cinezen) é jornalista e edita o site CineZen Cultural
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