por Marcelo Costa
“Nobody’s Daughter”, Hole (Universal)
Courtney Love, que não é lá muito original, copiou o amigo e parceiro Billy Corgan remontando sua banda sem chamar os ex-integrantes (o bom guitarrista Eric Erlandsonm, a charmosa baixista Melissa Auf der Maur e a baterista Patty Schemel). “Nobody’s Daughter” não bate a força do nervosismo de “Live Throught This” (1994) nem as canções pop guitarreiras do brilhante “Celebrity Skin” (1998), mas está quilômetros à frente do exercício de egocentrismo do fracassado “America’s Sweetheart” (2004). A regra é a autocópia. Guitarrinhas nervosas, mas comportadas, fazem a cama para Courtney dizer que tudo “está podre” (na faixa título, que tem Martha Wainwright nos backings), desancar uma “putinha” (em “Skinny Little Bitch”), falar em amor e esperança (na bonita “Honey”), em solidão e falta de sexo (na breguinha “Pacific Coast Highway”), em medo da morte e fim do mundo (no blues estilizado “Someone Else’s Bed”) e cantar uma carta para Deus (canção de Linda Perry, amiga, parceira e produtora de algumas canções do álbum). A ironia é que a melhor música do disco, “Never Go Hungry”, está transcrita na capa como bônus track. Levada à base de violões, a canção traz uma Courtney comportada (ou seja, sem berrar) que promete nunca mais passar fome. Será?
Nota: 6
Preço em média: R$ 30 (nacional)
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“El Turista”, Josh Rouse (Bedroom Classics)
Josh Rouse começou o século 21 sendo apontado como uma promessa do folk norte-americano por álbuns delicados como “1972” (2003) e “Nashville” (2005), além de embalar o romance de Tom Cruise e Penélope Cruz no filme “Vanilla Sky” (com a música “Directions”, até hoje seu maior hit). Foi então que decidiu abandonar o álcool e os EUA e partir em direção a uma cidadezinha da Espanha, às margens do Mediterrâneo, onde recomeçou a vida gravando discos como “Subtítulo” (2006) e “Country Mouse, City House” (2007). Ah, o amor. Josh casou-se com a cantora Paz Suay, mudou-se para Valência e a cada disco torna-se mais espanhol. “El Turista” é o próximo passo da conversão do passaporte (em formato de encarte) do compositor, que sai logo avisando em seu My Space: “Eu sei que é engraçado um cara do centro-oeste tocando canções brasileiras em espanhol”. Josh foi buscar inspiração em João Gilberto (mais precisamente no disco “Getz/Gilberto”), mas também esbarrou em Paul Simon e no Louis Armstrong cubano Bola de Nieve para compor as canções bonitas de “El Turista”. Ele foge corajosamente de sua persona na batucada de “Las Voces” e “I Will Live On Islands”, e no samba “Valencia”, mas também encanta quando quase soa Josh Rouse, como em “Lemon Tree“ e “Cotton Eyed Joe”.
Nota: 8
Preço em média: R$ 40 (importado)
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– “The Best of The Rykodisc Years”, Josh Rouse, por Marcelo Costa (aqui)
“Beat The Devil’s Tattoo”, Black Rebel Motorcycle Club (V2)
“Abra suas pálpebras, deixe seus demônios correrem”, ordena o baixista e vocalista Robert Levon Been em “Beat The Devil’s Tattoo”, canção que dá nome ao quinto álbum do Black Rebel Motorcycle Club, e que abre o disco com uma batida country chapada ambientando o freguês. Na segunda faixa, a estonteante “Conscience Killer”, o ouvinte já está deitado no balcão, nocauteado e sorrindo feliz. O trio (que ainda conta com o guitarrista vocalista Peter Hayes e, agora, com Leah Shapiro, ex-baterista de turnê do Raveonnetes) voltou ao mesmo estúdio em que pariu seu álbum de ruptura, “Howl” (2005), para abraçar o country e o folk outra vez, sem abandonar as guitarras. Elas retornam fortes e sujas em canções como “War Machine” e “Mama Taught Me Better”, que deixam uma densa nuvem de microfonia flutuando no ar. Do outro lado do boteco, em números suaves como “Sweet Feeling” e “Long Way Down”, que abrem espaço para harmônica e violão, o grupo soa como um Jesus and Mary Chain que vendeu sua alma na mesma encruzilhada que Robert Johnson – e encontrou Johnny Cash. Um exagero psicodélico fecha o disco: “Half-State”, mais de dez minutos de delírios em que o grupo diz procurar “um sinal de paixão”. Essa busca rendeu – novamente – um disco sensacional.
Nota: 8,5
Preço em média: R$ 40 (importado)
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– Black Rebel Motorcycle ao vivo em Viena, 2010, por Marcelo Costa (aqui)
– “Baby 81”, do Black Rebel Motorcycle Club, por Marcelo Costa (aqui)
Eu gostei muito deste Nobody’s daughter, daria um 8 para ele.
Quanto ao BRMC, elogiar é chover no molhado. É disparada a melhor banda de sua geração. Este Beat the devil’s tattoo é maravilhoso, ouvia direto depois que o baixei. E agora deu vontade de ouvir de novo.
Mas teve uma coisa no texto que me deixou grilado. Fala que este é o quinto disco dos caras. Fui lá no site deles e realmente confere. Mas e o doidão “The Effects of 333”? Foi ignorado por todos, inclusive a banda?
A primeira vez que ouvi o Nobody’s daughter não desceu. Pareceu que a Courtney estava gritando muito, mais do que nos outros discos. Mas agora a audição foi muito melhor agora quando fui reouvir.
Quanto ao BRMC, sua dúvida é legitima. Pra mim, The Effects of 333 parece mais um experimento, como os discos que o Sonic Youth lançam pela gravadora deles, e que não fazem parte da discografia. Talvez devesse ser contado sim na discografia.
Eu lembro do início do BRMC que todos criticavam a semelhança com o JMC e posso até me incluir neste time. Hoje fico feliz que eles parecem ainda mais com o JMC e mesmo assim são disparado a melhor banda dos últimos tempos. Acho que desde o Howl a banda está num outro patamar de qualidade.
A Courtney Love parece uma professora universitária doidona, vivendo as mesmas loucuras a 17 anos. Já o Black Rebel, ah, o Black Rebel… Mais indecentemente classudo nessa decada, não há.