Em noite histórica, Jerry Cantrell faz alegria dos fãs ao passar carreira solo a limpo e tocar clássicos do Alice in Chains

texto de Luiz Mazetto
fotos de Doug Mosh

Passava um pouco das 22h40 quando um sorridente Jerry Cantrell falou ao público de São Paulo que não queria ir para casa. Apesar da afirmação em tom brincadeira, que mostrou a forte conexão entre público e artista nesta noite já histórica, o músico e sua banda saíram do palco logo depois, sob muitos gritos e aplausos. Mas não sem antes prometer aos milhares de fãs que lotaram a Audio que todos se veriam de novo em breve – provavelmente com uma nova tour do Alice in Chains.

Mas o que levou lendário vocalista e guitarrista a se declarar ao público brasileiro neste dia 12 de novembro? Bom, um daqueles shows que dificilmente sairá da memória de quem pode estar na casa da zona oeste paulistana para acompanhar a estreia solo de Jerry no país após quatro visitas com o Alice in Chains (a última em 2018, com o Judas Priest), banda da qual é fundador e principal compositor desde 1987.

Ao longo de cerca de 1h45 de show, Jerry e sua competente banda tocaram um set que passeou por todos os quatro discos solo do músico, com mais foco no recém-lançado “I Want Blood” (2024) e em seu antecessor “Brighten” (2021), além de alguns clássicos essenciais do Alice in Chains escolhidos a dedo que levaram um público devoto a níveis altíssimos de empolgação.

Seguindo um roteiro parecido com os shows anteriores dessa mini-turnê pela América do Sul, que passou antes por Santiago e Buenos Aires, a abertura da apresentação aconteceu com a hipnótica e pesada “Psychotic Break”, que também abre o celebrado segundo disco solo “Degradation Trip” (2002), seguida pela pesadíssima “Them Bones”, que, por sua vez, abre o clássico absoluto “Dirt” (1992), do Alice in Chains, cantada a plenos pulmões por todos os presentes.

A sequência conta com as duas primeiras músicas do seu último disco solo, “I Want Blood”, “Villified” e “Off the Rails”, que, mesmo lançadas há menos de um mês, já foram entoadas pela empolgada plateia de São Paulo. Tantas músicas de abertura de discos em seguida no começo de um show mostram a preocupação em manter um ritmo forte o tempo todo, o que foi alcançado com muito sucesso.

O bloco seguinte intercalou cinco músicas um pouco mais “calmas” dos seus três últimos discos solo, com destaque para a sempre muito pedida “Angel Eyes”, do já citado “Degradation Trip”, e “Afterglow”, um dos singles do último disco. Além disso, a sequência mais tranquila trouxe ainda uma trinca do antecessor “Brighten”, que tem uma vibe mais relaxada: “Atone”, “Siren Song” e “Had to Know”.

Logo depois as coisas voltaram a ficar mais agitadas e barulhentas com a faixa título do último disco, que mostrou todo o poderio do baterista Roy Mayorga (ex-Soulfly, Amebix, Nausea e atual Ministry). E se a temperatura já estava alta, então tudo foi para as alturas quando soaram as primeiras notas de “Man in the Box”, primeiro grande hit não só do Alice in Chains, mas de toda a cena de Seattle (a faixa foi lançada em 1990, antes do sucesso pesado de Nirvana, Pearl Jam e Soundgarden). Ao longo dos quase cinco minutos da música, foi difícil ouvir a voz de Jerry e do guitarrista Zach Throne, que fez as vezes de segundo vocalista na ausência de Greg Puciato (Dillinger Escape Plan, Killer be Killed), em turnê com o Better Lovers, tamanha a força com que o público cantou.

O show seguiu com uma dobradinha do seu primeiro disco solo, “Boggy Depot”, lançado no já longínquo ano de 1998 e que contou com participação dos colegas de Alice in Chains, Mike Inez (baixo) e Sean Kinney (bateria), além de outros músicos do mais alto quilate. Tanto “Cut You In” quanto “My Song” foram muito bem recebidas e cantadas em alto e bom som pelos fãs – um fato curioso foi um pequeno atraso para Jerry poder tocar a introdução marcante de “My Song”, já que por duas vezes seguidas suas guitarras estavam com as cordas desafinadas.

A fase final antes do bis trouxe duas das melhores e mais pesadas faixas de “I Want Blood”, “Held Your Tongue” e “It Comes”, que novamente mostraram como o novo disco caiu nas graças dos fãs e foram intercaladas pelo clássico absoluto “Would?”, do Alice in Chains, mais uma música a colocar a Audio abaixo desde as primeiras notas da icônica introdução no baixo.

Alguns minutos após sair do palco e ter seu nome gritado pela centésima vez na noite, Jerry voltou ao palco com a banda para tocar a faixa-título de “Brighten”, provavelmente a melhor música do seu disco antecessor. E aí veio a surpresa que deixou todo mundo em uma mistura de incredulidade e felicidade genuína, com abraços e gritos empolgados acontecendo aos montes ao meu redor. Nada menos que “Sea of Sorrow”, outra faixa do “Facelift”, que só tinha sido tocada em alguns poucos shows da turnê norte-americana com o Bush no meio deste ano. Para muita gente, esse foi o ápice de uma noite que só teve pontos altos. E que foi fechada em grande estilo com “Rooster”, uma das mais inspiradas composições de Jerry com o Alice in Chains. Agora resta esperar que o “rei dos riffs” cumpra o que disse ao final do show e volte logo ao Brasil, seja sozinho ou com o Alice in Chains – e de preferência para mais do que apenas um show.

–  Luiz Mazetto é autor dos livros “Nós Somos a Tempestade – Conversas Sobre o Metal Alternativo dos EUA” e “Nós Somos a Tempestade, Vol 2 – Conversas Sobre o Metal Alternativo pelo Mundo”, ambos pela Edições Ideal. Também colabora coma a Vice Brasil, o CVLT Nation e a Loud! 
– Doug Mosh é fotógrafo, produtor executivo e roadie. Acompanhe seu trabalho: instagram.com/dougmosh.prod

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.