Entrevista: Conheça a Pythies, trio grunge de Paris que combina feminismo e esoterismo

entrevista de João Pedro Ramos

Se os oráculos de Delfos não chamam a sua atenção, talvez três vozes poderosas gritando contra o patriarcado possam chamar. Pythies, um trio grunge de Paris, está abrindo seu espaço na cena musical com riffs crus e letras ferozes que defendem o feminismo e o esoterismo. Conhecidas por seus shows cheios de intensidade e volume ensurdecedor, as Pythies combinam a influência do grunge dos anos 90 com um toque místico, trazendo uma voz urgente ao rock francês.

Seu EP de estreia, “Disillusion” (2024), é tanto uma introdução quanto um desafio, capturando a desilusão e as frustrações de jovens mulheres navegando em um mundo dominado por homens. Fundada pela baixista e vocalista Lise.L, que encontrou suas companheiras de banda Anna B. Void (baterista) e Alice Adjutor (guitarrista) através das redes sociais, a banda busca inspiração em nomes como L7, Hole e 7 Year Bitch, mas seu som é cheio de personalidade, pulsando com uma mistura de rebeldia punk e fascínio bruxesco. Agora, enquanto embarcam em sua primeira turnê pelos EUA, as Pythies estão prontas para levar sua energia carregada e mensagem a um novo público, um mosh pit de cada vez.

Conversei com o trio parisiense durante esta primeira incursão da banda pela América do Norte:

Sua música é movida por temas de feminismo e esoterismo. Como esses temas influenciam o processo de composição e criação da banda?
Lise.L: A música e as letras são escritas por mim, e acho que sou inspirada pelo que pratico no meu dia a dia. Tento incorporar o feminismo o máximo possível no meu relacionamento com os outros, e também pratico um pouco de esoterismo, como tarot, oráculos, pequenos rituais aqui e ali… (risos)

Pode nos contar mais sobre a inspiração por trás do seu EP de estreia, “Disillusion”? Quais foram algumas das principais experiências ou observações sociais que influenciaram as letras?
Lise.L: “Disillusion” retrata o que passei como uma mulher de 20 anos experimentando a cena do rock em Paris. Muitas pessoas mais velhas, principalmente homens mais velhos, acham que você não vale nada, então você sempre precisa provar a si mesma, o que é exaustivo, e parece que nunca acaba. É disso que trata este EP.

A cena grunge dos anos 90 tem uma grande influência no seu som. O que há nessa era e estilo de música que ressoa tão fortemente com vocês?
Lise.L: Acho que o que mais gosto nessa cena é a poderosa raiva que essas bandas, especialmente as femininas, tinham, como L7 ou 7 Year Bitch. Acho que foi uma das primeiras vezes que as mulheres realmente tiveram uma voz no rock, e elas puderam fazer o que realmente queriam, porque nos anos 70 muitas bandas femininas eram lideradas por homens mais velhos e eram muito restritas. E gosto muito dos sons de guitarra crus e agressivos dessa época.

Alice Adjutor: Eu gosto da simplicidade aparente da música grunge, do valor dado às letras, das melodias vocais incrivelmente inteligentes e delicadas, das progressões harmônicas únicas, e do cuidado com as harmonias vocais. Além disso, a cena grunge sempre foi acolhedora para as mulheres.

Anna B. Void: L7 é uma das minhas bandas favoritas. A música e a atitude deles me inspiraram quando eu era adolescente. Gosto da energia da música grunge, algo muito visceral. Sinto muito isso quando estou no palco: a necessidade de me doar, de me perder na intensidade da música, de me soltar emocionalmente.

Como uma banda que visa desafiar as normas sociais, como vocês esperam que sua música impacte os ouvintes, especialmente as mulheres mais jovens?
Lise.L: Espero que as mulheres se sintam empoderadas quando ouvem Pythies, e especialmente se nos verem ao vivo. Espero que sintam que também podem fazer o mesmo, sair e gritar. Elas também precisam ser ouvidas.

A faixa “Blondinette” confronta estereótipos em torno das meninas loiras e “bimbos”. O que motivou essa música, e como ela foi recebida até agora?
Lise.L: Bem, essa música foi inspirada por uma situação muito específica em que me senti humilhada e ridicularizada por um homem. Porque é isso que eles geralmente fazem, os homens: eles te colocam em uma caixinha pequena, e a minha, por algum motivo, é o clichê da Barbie. Não sei se as pessoas entendem a letra na França (risos), então não faço ideia do que pensam dela.

Como cada uma de vocês se envolveu com a banda, e o que as levou a trabalharem juntas como um trio?
Alice: Eu estou na cena há algum tempo, liderando as bandas de grunge SheWolf e agora Jelly Dive, como cantora, compositora e guitarrista. Quando me ofereceram entrar na banda como guitarrista para substituir a ex-guitarrista, aceitei naturalmente. Achei que a banda tinha ótimas músicas, uma identidade forte, e integrantes incríveis trabalhando duro para fazer tudo funcionar.

Lise.L: Eu fui quem criou a banda e encontrei as outras através das redes sociais e de conexões mútuas. Acho que é o amor pela música grunge que nos uniu e a vontade comum de destruir o patriarcado.

Anna: Faço parte das Pythies desde o início, como baterista. Também tenho habilidades em administração e contabilidade, o que ajuda o grupo. Já tive várias experiências com bandas, tocando, gravando, adquirindo equipamentos, criando redes de contatos. Não comecei do zero, e acho que isso ajudou a banda também. Estou muito feliz em ver o quão longe as Pythies chegaram, com todos esses shows e oportunidades. Ser uma banda 100% feminina e fazer grunge é um verdadeiro prazer.

Que bandas vocês diriam que influenciaram o som da banda?
Lise.L: PJ Harvey, Veruca Salt, 7 Year Bitch.

Alice: Hole.

Como está a cena do rock parisiense hoje em dia? Vocês poderiam recomendar algumas bandas da sua região?
Lise.L: A cena do rock parisiense é complicada, está realmente sendo afetada pela grande ausência de sororidade e pela grande presença de pessoas ricas tentando fazer rock porque estão entediadas. Eu recomendaria bandas como Venus Worship, Seesters, Antimoine, Blastfem e Madam (de Toulouse).

Alice: A falta de dinheiro e consideração pelos artistas, as regras da indústria musical, problemas de saúde mental, tornam tudo muito mais complicado para bandas talentosas alcançarem o sucesso ou mesmo conseguirem viver disso. Todo mundo tende a perder o foco, a pressão é muito alta. Você precisa estar com tudo em ordem se quiser fazer a banda crescer enquanto lida com a vida cotidiana, talvez um segundo emprego, uma família… Recomendo Jelly Dive, Steve Amber, Grandma’s Ashes, Liquid Bear, Rest in Gale.

Anna: Eu recomendo Total Leopard, Shienn, Coal Noir, Spaghetti Kiss. Essas bandas são lideradas por mulheres comprometidas que tocam um rock muito bom.

Fazer turnê é uma grande parte do momento atual de vocês, e estão prestes a iniciar sua primeira turnê nos EUA. O que mais esperam ao trazer as Pythies para um novo público?
Lise.L: Estamos na turnê nos EUA enquanto respondo a essa pergunta (risos). Acho que aqui as pessoas entendem melhor a nossa música, pois conhecem a cultura grunge e entendem o que estou dizendo. Então, é muito mais fácil para nós, ou pelo menos para mim, tocar aqui.

Anna: Eu adoro o público americano, eles são muito entusiasmados. Mesmo quando há poucas pessoas na sala, elas dançam, sorriem, aproveitam. Eu realmente adoro! Estar em Seattle, conhecer músicos dessa cidade, ouvir histórias sobre Temple of the Dog, Nirvana, Soundgarden, Sub Pop e Jack Endino… tudo isso é realmente incrível! É como se as Pythies agora fizessem parte dessa história.

Alice: Parece que estamos voltando ao berço da música que tocamos e gostamos. Vejo essa turnê como uma grande celebração! Estou também muito animada para conhecer pessoas novas.

O que vem a seguir para as Pythies após o lançamento deste EP e a turnê? Vocês têm uma visão para o futuro da banda ou algum objetivo específico em que estão trabalhando?
Lise.L: Acho que vamos lançar algumas músicas novas, talvez alguns singles. O objetivo é nos expormos o máximo possível!

– João Pedro Ramos é jornalista, redator, social media, colecJionador de vinis, CDs e música em geral. E é um dos responsáveis pelo podcast Troca Fitas! Ouça aqui

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