texto de Bruno Lisboa
Everett LeRoi Jones foi um poeta, escritor, músico, dramaturgo e crítico cultural que nasceu (em 1934), viveu e morreu (em 2014) em Newark, nos Estados Unidos. Com o codinome de Amiri Baraka, ele foi um dos poucos negros a integrar a caravana Beat promovida por Jack Kerouac e Allen Ginsberg, era vigiado pelo FBI e foi um dos precursores do hip-hop e do rap.
Transitando entre vários gêneros textuais, Baraka escreveu ensaios, críticas culturais, peças de teatro e poesias. Sua versatilidade produtiva tinha como elemento comum o fato de que, em sua escrita, ele conseguiu, de maneira pontual, analisar a cultura afro-americana em textos que, no decorrer dos anos, se tornariam atemporais.
Baraka também se aventurou no universo da música gravando com jazzistas renomados como David Murray, William Parker e Billy Harper e lançando discos como “It’s Nation Time – African Visionary Music” (1972), um álbum de spoken-word que mistura poesia com free jazz, percussão africana e R&B tendo sido gravado logo após o Congresso dos Povos Africanos de 1970, lançado pelo selo Black Forum, subsidiária da Motown Records, e reeditado em 2018 pela própria Motown/UMe.
Sua voz também pode ser ouvida em faixas “Something in the Way of Things (In Town)”, canção que está presente no disco “Phrenology” (2002) do grupo nova-iorquino The Roots.
Várias de suas obras são referências para estudos ligados a cultura afro-americana, e uma das mais celebradas é o livro “Black Music”, de 1968, uma compilação de artigos jornalísticos publicados em veículos como a Jazz Review, Down Beat e Metronome.
Em “Black Music”, o escritor se debruça sobre a cena nova-iorquina de jazz do final dos anos 1950 até 1967 nos Estados Unidos, acompanhando, in loco, toda a efervescência de um dos momentos históricos importantes da música do século passado.
Entre entrevistas, críticas de shows e de discos, o autor descreve de maneira minuciosa, crua e inspiradora toda a vivacidade da cena free jazz do período. E o faz de maneira ímpar através da análise do trabalho de figuras lendárias como John Coltrane, Wayne Shorter, Ornette Coleman, Sun Ra, Charles Mingus, Thelonius Monk, Sonny Rollins e Cecil Taylor, dentre outros. Cada um dos musicistas, a sua maneira, revolucionaram a forma como a música em si poderia ser vista ao adotar uma estética livre que desafiaria aos padrões mercadológicos vigentes.
Para além dos textos de Baraka, a obra traz um belíssimo prefácio escrito pela pesquisadora Nathália Grilo que, há muitos anos, estuda a obra do escritor e é uma das maiores referências nacionais quando o assunto é a cultura negro-africana. Inclusive, é altamente recomendável a audição do episódio “Black Dada Nihilismus”, do podcast Balanço e Fúria, no qual Nathália analisa de forma minuciosa a trajetória de LeRoi Jones.
Outro atrativo do volume é uma nova introdução escrita pelo autor para a reedição de “Black Music” em 2009, em que ele reflete sobre o período no qual a obra foi escrita, o jazz e sua relação com os dias atuais.
“Black Music – Free Jazz e Consciência Negra” (1959-1967) ganhou edição nacional via Sob Influência, e pode ser adquirido no site da editora. Esta playlist, com curadoria do podcast Balanço e Fúria, serve como introdução ao universo dos artistas.
Baraka fez do exercício de sua escrita um instrumento de mobilização social contra o racismo e em defesa da liberdade inspirando gerações até os dias atuais. Ele faleceu em 2014, mas o seu legado segue sendo celebrado por toda uma gama de artistas e leitores que tem seu inflamável trabalho como referência.
– Bruno Lisboa escreve no Scream & Yell desde 2014. Escreve também no www.phono.com.br