Um
Adolescente Nos Anos 80 #1
"The Whole Of The Moon", The Waterboys
por
André Takeda
Spectorama
2000
Minha
mãe sempre disse para eu falar sobre o tempo. Com certeza
não é o assunto mais apropriado para uma noite
de sábado. Principalmente quando você tem quinze
anos e quer conhecer uma garota. Mas eu não tinha outra
opção. Por isso, ignorei toda minha timidez e,
com as pernas bambas de tanto nervosismo, fui em direção
ao terraço. E lá estava ela: Julia, com aquele
seu jeito de adolescente, um copo de vodca barata em uma mão
e um cigarro na outra, acompanhando com os pés as músicas
que algum babaca do terceiro ano estava colocando no som. E
eu fiquei ali, parado na entrada do terraço, com as mãos
nos bolsos do jeans, pensando seriamente em começar a
fumar. Julia olhava para o céu, seus olhos faziam zigue-zague
por entre as estrelas, como se estivessem inventando um caminho
em busca da lua. Percebi que já era hora de deixar todo
aquele medo estúpido para trás e tomar alguma
atitude. E, então, lembrei do conselho de minha sábia
mãe.
"Que
noite do caralho", eu disse.
"É verdade."
"Pois é."
"Eu conheço você?"
"Não sei. Talvez. Acho que sim."
"E você me conhece?"
"Você é a Julia."
"Eu mesma. E você quem é?"
"Eu sou o João da turma 92."
"Sei."
"Bem, vou nessa."
"Peraí. Você fica dez minutos me observando e tudo
o que tem a dizer é isso?"
"Não. Quero dizer, é. Sei lá."
"Você tem medo de mim?"
"Medo?"
"Sim, medo."
"Acho que sim."
"Por quê? Qualquer babaca do terceiro ano consegue conversar
com uma menina, por que você tem medo de conversar logo
comigo?"
"Porque se os babacas do terceiro ano gostassem um pouquinho
só das outras meninas como eu gosto de você, aposto
que eles também sentiriam medo."
Pronto,
pensei, agora eu estraguei tudo. Ficamos eu e Julia em silêncio
por alguns minutos, ela bebeu o resto de vodca em um gole só,
ofereceu meu primeiro cigarro da vida, riu com a minha tosse
e disse para eu esperar um instante porque ela iria até
o babaca que estava cuidando do som e pedir para colocar uma
música decente. Voltou e continuamos em silêncio,
apenas a voz de Mike Scott cantando "The Whole Of The Moon",
e, pela sua respiração, pude perceber que eu já
não era a única pessoa que estava com medo e não
sabia o que falar naquele terraço.
"Que
noite do caralho", ela disse.
"É verdade."
"Olha só a lua. Existe alguma coisa mais bonita neste
mundo?"
"Existe."
"O quê?"
"Você."
E,
finalmente, consegui fazer a única coisa que os babacas
do terceiro ano faziam que eu tinha inveja. Foi assim, ao som
de "The Whole Of The Moon" com os Waterboys, em uma noite do
caralho, foi assim, dramatizando tudo como venho fazendo desde
que me conheço por gente, que eu dei meu primeiro beijo.
Minha
mãe é que tinha razão: na dúvida,
fale sobre o tempo.
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