Junho
2001
Verdades
e mentiras do novo rock nacional
Rock gaúcho é
a salvação?
O programa Garagem é
legal?
Gosto não se discute?
Os editores do Scream &
Yell são uns gatos?
A gente esclarece tudo sem
fazer prisioneiros.
Se você chegou a esse texto,
nessa revista e-zine, com certeza já está careca de saber
da briga que rolou entre os membros da Bidê Ou Balde com os jornalistas
que apresentam o Garagem no fim do mês passado. Provavelmente você
já deve ter dado a sua opinião e discutido a atitude de ambas
as partes nas inúmeras listas de discussões que dominam o
andar de baixo do rock brazuca. Quem tem a razão? Não sabemos.
Mas ainda assim podemos discutir algumas coisas. Não somos a Folha,
mas é nosso dever mostrar a coisa como ela é.
O ROCK INDEPENDENTE
É inegável que o cenário
independente brasileiro vive um bom momento. Não mercadologicamente
falando, mas sim, de movimento e ação. Todo mundo resolveu
se coçar e as coisas estão saindo. As festas da London Burning,
por exemplo, atraem um número cada vez maior de pessoas que até
pouco tempo nada tinham a ver com o universo independente. Até mesmo
músicos estabelecidos começam a se interessar pelo potencial
da festa. Os shows, pelo menos em São Paulo, de bandas que fazem
pouco sucesso até mesmo em seus países de origem,
têm ingressos esgotados rapidamente. Festivais bacanas como o Bananada,
em Goiânia, enchem os olhos de quem tem o rock na veia. E dão
também show em organização. No geral, a coisa vai
bem. Tá certo que boa parte da safra de bandas indie que pipocam
por aí não merece mais do que uma nota 5, e é assim
que a coisa começa, sempre, afinal o rock não prima por originalidade
e esta dita originalidade surge mesmo é com o tempo, mas a vontade
de se movimentar e dar a cara a tapa já é um bom começo.
A BRIGA DE EGOS
Como toda cena que se estabelece,
sempre tem os mártires e aqueles que adoram se aparecer. Um entrave
péssimo. Com o crescimento do rock alternativo, também seguiu
no vácuo a imprensa alternativa, uma tendência editorial
que cresceu assustadoramente graças à internet, tendo os
e-zines como carro-chefe. Com isso, aqueles que de alguma forma se destacaram
e são lidos por mais de mil leitores, se acham no direito de poder
opinar sobre tudo e, acreditam que para alguma coisa dar certo, é
imprescindível que o produto tenha o seu aval. Uma guerra
foi declarada contra a grande mídia, que, de guru, passou a ser
estúpida. Afinal, nós da mídia alternativa é
que sabemos das coisas. Assim, todo mundo resolveu reclamar o seu lugar.
Desenhistas, publicitários, jornalistas fajutos, designers, djs
e toda a fauna clamou por atenção. Mas como não cabe
todo mundo no fusquinha indie, o motor emperrou e muita gente legal abandonou
a viagem.
Não raramente, você
costuma ouvir nos meios underground, frases do tipo: como você
não me conhece? Eu fiz a capinha da demo da banda ...
Sem contar a briga de egos entre
as bandas. Enquanto alguns se pegam para descobrir quem copia o rock inglês
melhor, outros preferem ficar espinafrando todo mundo que conseguiu algum
espaço, sem apresentar nenhuma idéia concreta. Críticas
gratuitas são recorrentes. Para completar, inventaram as listas
de discussões indies, onde centenas de e-mails por dia, falam, falam,
falam e não dizem nada. Enfim, a coisa se complicou antes mesmo
de ter dado certo.
O ROCK GAÚCHO
Bah, rock gaúcho é triafudê.
Particularmente, a redação Scream & Yell sempre
foi fã das bandas do sul. Já gostávamos de TNT, Replicantes,
Graforréia Xilarmônica, Nei Lisboa e sabíamos que os
Cascavellettes eram mais do Neguinha Bom-Bom. Até mesmo uns
discos do Humbertão costumam rolar por aqui. E todo mundo tem que
ir a Porto Alegre um dia. É disparado a capital mais bacana e rock
do país. O rock rola direto e as festas são cheias de mulheres
bonitas se acotovelando. Além de que em POa você não
precisa ficar se rendendo as Kaisers da vida (lá tem Budweiser de
garrafa!)
Talvez sejam os gaúchos, os
roqueiros que mais entenderam a essência do rock. Querem que tudo
se exploda e fazem músicas divertidas recheadas pela típica
fina ironia. Eu disse fina ironia, bom-humor, saca, essa coisa que os críticos
paulistas topeiras entenderam como rock engraçadinho. Mas o fato
é que essa safra puxada pela Bidê Ou Balde, Vídeo Hits,
Wonkavision, Tom Bloch, Winston e tal, é a melhor que surgiu no
mapa indie brasileiro. São as bandas mais bem resolvidas que aportaram
nos palcos do underground. Como diria o camarada Macedo, eles mostraram
que Pavement e Weezer também pode ser divertido. Cair de pau em
cima dos caras é atitude copo meio vazio. Mas é compreensível.
A grande mídia nunca absorveu o rock nacional. Qualquer mané
pode montar sua banda, desde que não seja brasileiro, é a
máxima. Triste. E de uns tempos pra cá (será culpa
do Quase Famosos?), o próprio
público, indie diga-se de passagem, convencionou-se que é
preciso sair falando mal de todo mundo para mostrar atitude. Ui!
O PROGRAMA GARAGEM
O Garagem é um programa legal,
não adianta negar, mas só até certo ponto. O besteirol
infantil que assola o programa trata o público rock como imbecil.
É um antoganismo cruel: eu toco boas músicas, mas você
terá de ouvir as bobagens que eu digo. Mesmo assim tem seu valor,
afinal é um programa de uma turma (se são legais ou chatos
são outros quinhentos) de amigos que fala o que quer, toca o que
gosta, quebra o que tiver vontade e faz piadas sem graça que divertem
apenas eles mesmos. A propósito, o quebra-quebra de cds promovido
no programa é totalmente imbecil, mas é rock. Tem atitude.
Num paralelo, Jerry Lee Lewis tacar fogo em um piano é completamente
absurdo e imbecil, mas ganha ares de sensacional (e é sensacional)
porque é rock. O programa Garagem é imbecil, mas é
rock. Enfim, a rádio Brasil 2000 deu a liberdade para os caras fazerem
o que quiserem e eles estão fazendo. O Garagem também não
tem a obrigação de levantar a bandeira indie ou ensinar alguma
coisa, como muitos pensam. E o site é extremamente bacana. Basicamente,
é isso.
A BRIGA
Ah, foda-se quem teve razão
ou não, o importante é que foi legal pra caralho! Rock! A
vida tá um marasmo, não existem mais anti-heróis no
mundo. Todo mundo é bonzinho, ouve Travis e Coldplay, não
fala mal de ninguém, mede as palavras, é romântico.
O mundo virou uma grande boiolice. Tinha que aparecer alguém para
agitar as coisas, por isso, voto no Rossatto para o grande anti-herói
do momento. É isso aí, tem que tirar satisfação
de quem não gosta de Weezer. É a era dos torcedores do rock!
Podem falar o que quiser da Bidê, mas nenhuma banda indie teve atitude
até hoje. Enquanto ficam reclamando nas listas, a Bidê
foi lá peitar cara-a-cara. Provavelmente o Rossatto ia tomar uma
puta surra do Paulão, mas é isso aí. Sou a favor de
mudar o nome do lugar para Dj Club da Luta. E além, ele ir
lá, dizer vários impropérios para o jornalista, é
rock. Pode não ter sentido nenhum, mas é rock. Assim como
a banda não gostou de ter seu cd quebrado, o jornalista não
gostou de encarar um dedo em riste. Inevitável, se ambos querem
vida sossegada, cheia de sombra e água fresca, mudem-se prum sertão
qualquer. O enfrentamento é inevitável quando alguém
tem culhão. É legal ver o Sid Vicious enfiando seu baixo
na cabeça de um jornalista, é histórico, é
rock, mas tudo demonstra que aqui pode acontecer o mesmo. Bom? Ruim? Você
decide. Pra nós é atitude. Fazia tempo que roqueiro brasileiro
não mostrava atitude. Uhn, acho que desde o dia em que o vocalista
do Ira!, Nasi, invadiu a redação da Bizz para pegar o André
Forastieri...
OPINIÕES
Dois colaboradores nossos emitiram
suas opiniões. André Takeda foi fundo na ferida e nós,
amplamente, discordamos dele. Mas ele tem camisa garantida no time S&Y
e todo direito de demonstrar sua opinião. A outra opinião
é do amigo e colaborador Eduardo Palandi. Assinamos embaixo do texto
do cara. No mais, dentre as bobagens que andaram dizendo após a
tal briguinha, a que mais nos incomodou foi a de um mala aí que
acha que o mundo é ruim com ele porque ele mora em São Paulo.
Ui. O babaca tenta convencer que por culpa da poluição, da
falta de mulheres estonteantes andando pela rua, da falta de amizade e
de mais um punhado de coisas idiotas, nós, paulistanos, somos
neuróticos, complexados e complexos, mal-humorados, ranzinzas e
angustiados. Bem, não sei de vocês, mas a gente não
tem nada a reclamar sobre mulheres, estamos pouco se fodendo para poluição,
temos vários amigos e esses adjetivos perfilados aí em cima
não tem nada a ver conosco. É bem o que sempre dizemos: enquanto
o rock dos pampas é desencanado, o rock paulista é sério
demais, o rock carioca é metido à malandro demais e o incensado
rock de Brasília é Renato Russo demais. Mas, melhor assim,
afinal, sobram mais mulheres e os bares não ficam tão cheios
porque esse povo fica todo em casa, trancado no quarto, ouvindo Suede,
Pulp e Nick Cave. Não faz o nosso tipo, definitivamente.
Estou cagando
pra essa briga no mundo indie - Por Eduardo Palandi
Chega de rock
gaúcho - por André Takeda
CONCLUSÃO
Apesar dos pesares, já que
estamos falando de torcedores, em algum momento, você leitor terá
que tomar a sua posição. Uma hora você terá
que achar o seu lugar. É claro, que tudo isso não seria necessário,
se todos tivessem consciência que trata-se apenas de música
pop. Não vai mudar o mundo, não vai baixar o dólar,
mas vai nos entreter. Nem que seja na porrada.
Marcelo Costa
e Alexandre Petillo
Editores
Ps. Quem
quiser ouvir rock nacional na noite paulista pode aparecer no DJ Club
da Luta no dia 30 de junho, sábado. Marcelo Costa estará
comandando as pick-ups e entre uma do Nirvana, uma da Ronnetes e uma do
Beastie Boys, você poderá ouvir Astromato, Bidê ou Balde
e outras pepitas nacionais que não rolam no programa Garagem e nem
recebem elogios nos cadernos de cultura por aí. Ok, a gente vai
tocar Strokes e Ramones... E se aquele mala do zine Lo-Fi quiser aparecer
pra porrada, o local é propício. |