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CEL & o Limite
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Fim Do Mundo Na Fila Do McDonald's
por
Carlos Eduardo Lima
29/04/02
Alguém já disse que o fim das sociedades contemporâneas se dará através de pequenos detalhes,
mostrados discretíssimamente em pequenos indícios. Nada de guerras, mortandade de peixes, chacinas, assaltos e reality shows. Nos pequenos detalhes do dia a dia a coisa vai começar a ruir.
Impossível não pensar em Matrix e suas verdades disfarçadas
com linguagem de quadrinhos e visual extra-high tech. Em uma
cena chave do filme, Neo (personagem de Keanu Reeves) ouve de
Morpheus (vivido por Lawrence Fishbourne) a seguinte revelação:
"você sabe que algo está errado com o mundo, você não sabe exatamente
o quê, como ou onde, apenas sabe e é esta dúvida que o motiva".
Uma das mil coisas que acontecem na vida contemporânea que me
faz ter certeza de que algo de muito grave está acontecendo
na nossa bolota azul e branca é: por que diabos alguém vai ao
McDonald's e, quando vai pedir o sorvete de casquinha, que custa
um real, faz a seguinte observação – olha, por favor, é sem
casquinha. No copinho mesmo. Ou ainda, na hora de pedir um dos
hamburgers, escolhem o "especial". Neste caso, o "especial"
é o sanduíche amputado, sem algum de seus atrativos, como molho,
cebola, picles, algo que o torna diferente. É o mesmo que pedir
um cheeseburger sem o queijo, ou sem o "burger".
Pausa.
Não vamos questionar aqui as opções de escolha entre lanchonetes.
Alguém pode preferir o sorvete do Bob's ou do Dunkin Donuts.
Ok, sem problemas. Outros podem não gostar de sorvete – um outro
indício forte de que há algo errado no mundo – mas, tudo bem,
não tem problema também. Outros ainda talvez prefiram não tomar
um sorvete após o lanche. Mas, por que pedir um sorvete de casquinha
sem a casquinha? Se isto fosse uma cena de Matrix, o personagem
de Morpheus diria que é uma falha no sistema e que a qualquer
momento, o McDonald's vai estar coalhado de agentes da Matriz.
Desde que eu era criança o grande barato do sorvete de casquinha
é a casquinha. O mistério de se comer um biscoito crocante,
meio wafer, meio parecido com aqueles tubinhos que são vendidos
no sinal, superava a delícia gelada do sorvete. Este fator até
fica mais evidente quando o sorvete não apresenta variações
de sabor, caso do próprio McDonald's, que só oferece os sabores
baunilha, misto e chocolate. Então, quem não tem os trocados
para investir num sundae ou ainda num McMix, é obrigado a recorrer
à velha e boa casquinha de outrora. E quando o faz, pede para
ser no copinho?
Não há lógica aristotélica ou aplicada que me explique o motivo disso.
E os sanduíches? O que caracteriza um Big Mac e seus similares nacionais, tipo Big Bob é a combinação de molhos e coadjuvantes para a incrementação do pão e a carne. Do contrário, compra-se uma caixa de hamburguers congelados da Sadia ou Perdigão e manda-se bala com um bom pão da padaria da esquina. O charme e o "leitmotiv" de irmos numa lanchonete é, ou, pelo
menos deveria ser, o diferencial do que temos em casa para comer. Não adianta ir à lanchonete e pedir algo que se come em casa todo dia. O mesmo poderia dizer de turistas que vão aos Estados Unidos e pedem ao guia da excursão para comer num restaurante brasileiro. Frases como "eu quero o meu arroz com feijão" num templo a céu aberto da gastronomia junk food é o mesmo que ir à Roma e querer ver Dom Paulo Evaristo Arns.
Então vemos gente de todas as idades pedindo Quarteirões com Queijo sem queijo ou Big Macs sem o delicioso molho especial. Eu olho suas fisionomias, penso em seus passados e não encontro resposta. Exemplos similares dessa falta de vontade de ousar, aplicada à gastronomia podem ser vistos em rodízios de massas, nos quais o indivíduo rejeita raviolis, capelettis e rondellis e cai de boca no spaghetti a bolonhesa, que a avó serve todo domingo. Ou ainda naquele sujeito que vai à uma pizzaria requintada, cheia de sabores exóticos e castiga o garçon dizendo que quer "uma de mussarela". Pô, mussarela?
Talvez eu esteja vivendo um momento de "Teoria da Conspiração", ao dar importância a isso tudo, mas sinceramente penso que se o mundo está mal e estes casos citados acima são fortes indicadores disso. Por acaso alguém já viu se o Bin Laden gosta de casquinha? Qual pizza ele prefere? Ou se sua cafta marroquina é com carne de soja?
Investiguemos. Pode ser tarde demais.
Carlos Eduardo Lima tem quase 32 anos, é carioca e acredita que o mundo acabou há uns dez anos mas ninguém notou.
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