Biquini
Cavadào volta à cena em dose dupla
por Marcelo
Silva Costa
Primeiro foi o Titãs, depois
Ira! e Capital Inicial. Agora é a vez do Biquíni Cavadão
tentar a sorte e conquistar o público de 2001 tal qual fez na década
de 80. Para isso, a banda insiste em uma fórmula que começa
a soar batida, a de regravações, para marcar a volta a gravadora
Universal Music. Por outro lado, o novo álbum coincide com o relançamento
dos quatro primeiros, e melhores, trabalhos da banda, em um box set.
O Biquíni surgiu na boa leva
de bandas do início dos anos 80. Batizados por Herbert Viana, que
ainda se inspirou em tocar guitarra no sucesso "Tédio", o
Biquíni emplacou dezenas de sucessos até o começo
da década de 90, alternando vendas de 50 a 70 mil discos. Essa é
a fase englobada no box set lançado pela Polygram.
Sintomaticamente, daí em diante
algo desandou e a banda, que seguiu lançando discos e fazendo shows,
ficou a margem.
Essa "nova" volta não poderia
ser mais antagônica. Se, por um lado, traz o supra sumo de uma banda
bacana no Box set, frustra o ouvinte em "80".
Questão de 'timing'
Bruno Gouveia, vocalista da banda,
diz que as músicas em "80" foram regravadas para ter a cara
da banda. E se prepara para críticas e elogios. "Naturalmente algumas
musicas serão mais do agrado do que outras. Natural em qualquer
disco. Porêm, acredito que as comparações com as musicas
originais serão inevitáveis. Ouviremos com prazer todas as
criticas e elogios. Talvez alguns acabem curtindo mais nossas versões.
Talvez não. O importante é que elas foram feitas para ter
a nossa cara", diz Bruno.
A idéia de "80" brotou
em 1999, quando o Biquini realizou o projeto "À vontade no Ballroom",
no Rio. "A cada quarta-feira tocávamos com convidados especiais.
Foram encontros históricos com Herbert, Frejat, Benjor, Kid Abelha,
Zé Ramalho e muitos outros", relembra.
Depois disso, muita sessão
nostálgica com os amigos. "No Rock In Rio III, convidamos nosso
grande amigo Marcelo Hayenna, do Uns e Outros, para cantar seu sucesso
"Carta Aos Missionários" conosco. Nos camarins conversávamos
sobre a importância das bandas que surgiram naquela época
e hoje se tornaram referência para grupos mais novos", diz. E completa.
"Finalmente, veio a decisão: com as rádios infestadas de
popozões e bunda music, consideramos a idéia de mostrar em
CD uma época em que as canções primavam pelas letras
e pela atitude".
Para o vocalista, "80" não
é oportunista, mas oportuno. "Para mim, é uma questão
de 'timing'. O Biquíni Cavadão nunca lançou um disco
ao vivo sequer. Todos nossos trabalhos foram autorais até agora.
Resolvemos lançar um disco assim porque deu vontade. Acho oportuno,
jamais oportunista", conclui Bruno.
O vocalista conversou com o S&Y.
No bate-papo, carreira, a caixa Box Set e o novo álbum.
S&Y -
Vcs tiveram envolvimento no relançamento do box set pela Polygram?
Bruno - Não muito. Ao entrarmos
na gravadora o projeto já estava em andamento. Apenas acompanhamos
a parte gráfica. Chegamos a sugerir algumas faixas bônus e
raridades mas vai ficar para outra ocasião...
S&Y
- O que representa esses quatro primeiros álbuns na carreira do
Biquini Cavadão?
Bruno - Representa nosso período
de adolescência e amadurecimento. Começamos com 18 anos. Éramos
adolescentes cantando musicas para adolescentes, mas como banda e não
como boy band.
S&Y
- Quais suas canções preferidas desse box?
Bruno – "Inocências", do "Era
da incerteza", "Meu reino", do "Zé", "Descivilizacao", do disco
homônimo e "Hotel" (que há muito eu não ouvia) do "Cidades
em torrente". Tem sido uma ótima experiência voltar a ouvi-las
remasterizadas.
S&Y
- Vocês não chegaram a parar, certo? Vocês sempre estiveram
fazendo shows?
Bruno - Isto. Nosso meio de vida é
o Biquini. Nunca paramos. Tocamos em muitas cidades fora do mapa quando
ficamos fora da mídia, mas parar de tocar nunca rolou.
S&Y
- Por que o rock nacional perdeu espaço nos anos 90?
Bruno - Porque o Brasil, desde o seu
descobrimento, vive uma monocultura extrativista. Do Brasil colônia,
tivemos as épocas do pau-brasil, da cana de açúcar,
do algodão, da borracha, do café....
No campo musical, também passamos
por esta onda de mono-cultura. Só axé, só pagode,
só sertanejo, só funk... todo modismo exagerado é
um erro. O rock perdeu espaço nos 90 porque reinou nos anos 80.
S&Y
- Por que a volta de bandas veteranas como vocês, o Ira!, o Capital
Inicial? Não há nada novo no rock nacional?
Bruno - Em primeiro lugar, claro que
há! Que o digam Rappa, Pato Fu, Charlie
Brown Jr, Los Hermanos, Sideral, Penélope,
Video Hits, Tihuana e muitos outros. Em segundo lugar, que volta? Nunca
fomos, nem o Ira! ou mesmo o
Capital (cuja volta, se existiu, foi só a do Dinho à
banda). Quem voltou mesmo foi a propria mídia. Não fomos
nós que pisamos no palco, apenas os holofotes mudaram seu foco.
S&Y
- Por que a crítica especializada gosta de massacrar o rock nacional,
principalmente as bandas dos anos 80?
Bruno - Porque não o ouviu.
S&Y
– E você, anda ouvindo o que ultimamente?
Bruno - Radiohead, XTC, Jellyfish,
Weezer, U2, Kara's Flowers, Ween, Los Hermanos, Penelope, Video Hits...
S&Y
- E mudou muita coisa desde que vocês começaram até
hoje? Qual a principal diferença que você vê do tempo
que a banda começou para hoje em dia?
Bruno – O Sheik, baixista, saiu no
fim do ano passado. Agora somos um quarteto. No mais, ganhamos experiência,
vivência, aprendemos com a 'Estrada', realizamos o que muitos não
conseguem: viver de música. E isto por si só já é
a nossa prova maior de sucesso.
Duas histórias diferentes
Por Marcelo Silva Costa
Box Set
O Box set é um prato cheio
para qualquer fã do rock nacional. Todos os cds trazem um excelente
trabalho gráfico, com letras e informações. E boas
músicas. O primeiro álbum do pacote é a estréia
de 1986, "Cidades em Torrente". Traz os hits "Tédio", "No
Mundo da Lua" e "Timidez". Herbert Viana toca guitarra na primeira e, ainda,
na paranóica "Inseguro da Vida". Renato Russo duela com o vocalista
Bruno em "Múmias" e Celso Blues Boy faz o solo de guitarra na balada
de levada oriental "Caso". O segundo álbum, "A Era da Incerteza"
(1987),
é mais conciso. Tem a leve "Ida e Volta", crítica a Igreja
em "Catedral" e a bela balada "Inocências". "Zé" (1989),
o terceiro disco, é o melhor trabalho do Biquíni em estúdio.
Traz a suave ode a casa "Meu reino", a bacana "Teoria" e a desilusão
com a indústria em "Bem vindo ao mundo adulto". Fechando o álbum,
o folk rancheiro "Meus dois amores" e a bluesy "Direto pro Inferno", uma
das melhores músicas do Biquíni Cavadão. Para fechar
o pacote, "Descivilização" (1991). O quarto álbum
da banda já mostra sinais de cansaço, mas mesmo assim emplaca
a populista "Zé Ninguém", a balada rock "Impossível"
e o regaee "Vento Ventania". Traz de bonús, uma versão leve
e eletrônica para "Meu reino". O grande destaque do disco é
a bela "Arcos", que traz Roberto Menescal tocando violão numa letra
que mistura Paris com Rio de Janeiro.
"80", o álbum de regravações
Primeiro foi Paulo Ricardo, com o
mediano "Rock Popular Brasileiro" em 1996. Depois tivemos, quase que simultaneamente,
os ótimos "Isso é amor" do Ira!,
"O Barulho dos Inocentes", do Inocentes e o fraco "As
10 mais" do Titãs. Agora é a vez do Biquíni Cavadão
enfiar as mãos nos anos 80 e sair de lá com 13 versões.
O resultado, infelizmente, frustra. O Biquíni pouca acerta em "80".
Consegue descaracterizar boas canções como "Toda forma de
poder" do Engenheiros do Hawaii, "Juvenília" do RPM e "Camila, Camila"
do Nenhum de Nós. Chega a incomodar em "Quem me olha só"
(um bluezaço na versão original do Barão Vermelho)
e "Hoje" do Camisa de Vênus. E nem mesmo a participação
da Penélope Érika Martins salva a regravação
de "Educação Sentimental II", do Kid Abelha (aquela que no
original "empresta” toda introdução de baixo de "London Calling"
dos ingleses do The Clash). Seja mantendo os arranjos originais, seja tentando
novos arranjos, o resultado fica aquém do esperado. Das 13 faixas,
apenas "Armadilha", dos candangos da Finis Africae, convence. E não
precisavam ter regravado "Me Chama" ( até João Gilberto gravou)
e nem jogar a voz de Renato Russo a frente na regravação
de "Múmias" (do próprio Biquíni). Não bastasse
o artifício, o rap piegas de Suave, do grupo Jigaboo, no meio da
canção, ainda diz: "Aproveitando nossa liberdade de expressão,
Renato Russo, Suave e o Biquíni Cavadão". Frustrante. |