Kill Bill Volume 2
por
Marcelo Costa
maccosta@hotmail.com
26/09/2004
Uma
das coisas legais do cinema do Quentin Tarantino é que não é preciso
ficar criando mil e uma teorizações a respeito de suas idéias. Tudo
que está na tela é o que você precisa ver. O épico Kill Bill,
repartido em dois quase que na última hora, é cinema pipoca dos
bons, principalmente porque você sai do cinema satisfeito com o
cara, com a mocinha, com o bandido, com a trilha sonora, com as
piadas, com as sacadas sérias, com a genialidade do texto: É só
o cinema e você, você e o cinema. E ponto final.
É claro que se alguém comparar (e comparar é preciso) Kill Bill
com clássicos como Cães de Aluguel
ou Pulp Fiction, irá se decepcionar. Eram outros tempos,
éramos mais jovens, mais malucos e tudo o que poderia nos acontecer
era quebrar a cara. Então era só levantar e tentar de novo. Agora,
não. Cada suspiro do cara é aguardado com ansiedade e uma queda
a essa altura da luta poderia ser fatal. Cada cena é analisada e
comparada a outra, anterior e melhor. E tudo isso pode ser reduzido
a pó com o simples comentário: Tarantino não é mais ou mesmo.
Bem, nem eu, nem você e nem o Presidente Lula somos os mesmos de
10 anos atrás. É fácil apontar o dedo na cara de outrem sem olhar
para o próprio umbigo. É certo que a função da crítica seja... criticar,
porém, é preciso um pouco mais que desprendimento para se entender
que, na prática, a teoria não funciona.
Dito tudo isto (ou nada, tanto faz), a dobradinha Kill Bill
é divertida, surreal, antológica e vibrante. A facada que obrigou
o diretor a partir a fita em duas funcionou como um belo tapa na
cara: o cara leva de um lado e, como diz a bíblia, oferece o outro.
Um lado da face de Quentin Tarantino é maquiavélico enquanto o outro
é romântico (sem ser piegas, por favor). Desta forma, o cineasta
deixou para Kill Bill Volume 1 as cenas violentas, escatológicas
e cheias de molho de tomate enquanto para o volume dois ficaram
os longos diálogos, as citações de vida comum, a força da mente
sobre as armas (e a madeira). E tudo isso funcionou que é uma beleza.
Se no primeiro, a Noiva (Uma Thurman) fazia jorrar sangue quente
matando indiscriminadamente, no volume dois ela continua matando,
mas com mais estilo. As artes marciais ganham mais profundidade,
assim como o caráter de todos os personagens. A história vai, volta
e vai de novo. Só mesmo Tarantino para colocar Samuel Jackson em
uma cena de minuto e meio, logo depois de ter feito uma homenagem
aos amantes da música. "Nada como ter uma loja de discos e ouvir
música o dia todo", diz a Noiva em certo momento.
Só para recordar, da listinha de pessoas que deveriam sentir o gosto
amargo de sua vingança, A Noiva matou duas no primeiro episódio
(O-Ren Ishii/Lucy Liu e Vernita Green/Vivica A. Fox), sobrando três
para este (Elle Driver/Daryl Hannah, Budd/Michael Madsen/ e Bill/David
Carradine).
No total, são 136 minutos de projeção que, unidos aos 111 minutos
do primeiro episódio, faz com que o filme ultrapasse 4 horas de
duração. Vamos combinar que, com uma boa enxugada, daria sossegado
para fazer dos dois volumes um só, com umas 2h30 de projeção, mas
com isso talvez se perdesse alguma coisa, principalmente os longos
diálogos e os longos closes nos pés de Uma Thurman (ok, pedólatras,
vamos deixar estas cenas).
A rigor, Kill Bill Volume 2 derruba o mito de que as seqüências
são sempre piores que o filme que dá origem a série. Aqui, temos
a conclusão da história e, ao menos, dois grandes momentos para
a história do cinema. O primeiro surge como a provável melhor cena
que Tarantino já filmou (e a disputa é complicadíssima). A tela
fica toda escura e o cineasta enterra um personagem (e o público)
a sete palmos do chão. Claustrofobico e inebriante. Já a segunda
é uma dissertação sobre a identidade dos super heróis, que remete
a boa e velha discussão sobre o que a garota da música Like a
Virgin, de Madonna, estava querendo dizer com tudo aquilo, de
Cães de Aluguel.
Só por estas duas cenas, Kill Bill Volume 2 já vale o ingresso.
Mas tem mais, muito mais. Entre a violência de Pulp Fiction
e o romance de Amor a Queima
Roupa, Tarantino trafega com sua ode aos filmes de artes
marciais embalada por sede de vingança. Talvez ele não seja realmente
uma pessoa normal. Quem vai saber? E quem vai dizer que A Noiva,
depois de feita sua carnificina, irá descansar sua espada,
sua arma e sua sede por briga? Se levarmos em conta as palavras
de Bill, antes de levar um golpe de cinco dedos no peito, o filme
deverá ter uma continuação futura, afinal, A Noiva não é uma pessoa
comum. Ela é uma "Natural Born Killer" (com Bill falando cada silaba
pausadamente). A gente se vê no caminho. Reticências.
Site Oficial Kill Bill Vol. 2
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