'Jardineiro Fiel'
por
Marcelo Costa
Fotos - Site Oficial
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16/10/2005
Jardineiro Fiel, adaptação para o cinema do livro de John Lê Carré, marca a estréia internacional do cineasta brasileiro Fernando Meirelles, indicado ao Oscar como Melhor Diretor por seu trabalho em Cidade de Deus. E Meirelles não poderia ter feito uma escolha melhor: Jardineiro Fiel transporta o microcosmo do bairro carioca filmado com personalidade por Meirelles para o macrocosmo das intrigas internacionais envolvendo grandes países, a ONU, mega-empresas e um território "abandonado" pelo resto do mundo: a África.
Mais do que qualquer outra coisa, Jardineiro Fiel é teoria
da conspiração das boas. E não só: atuando em território conhecido,
o brasileiro cria uma pequena fábula de fidelidade e honra, amparado
nas excelentes atuações de Ralph Fiennes (Justin) e, principalmente,
Rachel Weisz (Tessa), no bom roteiro de Jeffrey Caine (baseado em
um pré-roteiro do autor do livro) e na fotografia de César Charlone,
"parceiro" em Cidade de Deus. Bráulio Montovani, roteirista
de Cidade de Deus, aparece nos créditos como consultor. O
resultado deste pequeno "trabalho de equipe" (que credita, ainda,
Ralph Fiennes como segundo câmera) é excelente, investigativo e
até polêmico, embora resvale na pieguice melodramática, principalmente
em seu trecho final, o que chega a quebrar o ritmo e tirar a agilidade
da história, mas não compromete totalmente o filme.
Jardineiro Fiel conta a história do diplomata Justin Quayle, que ao substituir seu chefe em uma palestra, acaba sendo "atacado" pela ira da ativista Tessa. Da "saia justa" pública surge uma relação amorosa, e quando o diplomata é transferido para a África, a ativista segue junto, como parceira e esposa. Na África, mais precisamente Quênia, Tessa conhece o Dr. Arnold Bluhm (Hubert Koundé), e com ele mantém seu ativismo vivo, procurando informações sobre remédios, a conexão de governos e empresas, e o que isso tudo acarreta para o povo africano. Paralelamente, Quayle nada sabe das atividades da mulher.
Através do olhar de Meirelles, somos apresentados a uma África não
muito diferente do Brasil de Cidade de Deus. De câmera na
mão e com cortes rápidos, o cineasta flagra uma profusão de cores
que não esconde a derrocada social. Em outras passagens, longas
tomadas de cartão postal da paisagem do Quênia. Em um trecho significante,
enquanto homens ricos discutem valores e contas em banco, em um
campo de golfe, do outro lado de um trilho de trem é possível vislumbrar
milhares de telhados de famílias pobres, com poucos metros separando
as duas ações. A pobreza lado a lado com a riqueza. Nas entrelinhas,
essa é a verdadeira África, e não a que o diretor escocês Danny
Boyle exibiu no fraco Caiu do Céu. Ponto para o brasileiro.
Porém, a questão primordial de Jardineiro Fiel não é a pobreza
do povo africano, e sim a maneira como as grandes empresas controlam
os governantes, que por sua vez controlam o povo. E as relações
desta equação com os povos do terceiro mundo. Em um território em
que a falta de informação é "bem comum", dizer o que o povo deve
ou não fazer pode valer milhões de dólares. É nessa especulação
que reside a força do livro, e por conseguinte, do filme. O escândalo
do mensalão brasileiro deixou aos olhos de milhões de brasileiros
a quantia exorbitante de dinheiro que circula por trás do governo.
Mais do que isso: praticamente provou que a grande maioria daquelas
pessoas tem um preço. E que o povo é joguete na mão de pessoas que
desconhecem fidelidade, honestidade e honra. Quem controla quem,
cara pálida?
Mais do que realizar um bom filme, Meirelles acertou na escolha
de sua obra de estréia como cineasta de Hollywood. O outro grande
brasileiro recrutado pela indústria, Walter Salles, não pôde
mostrar tanto assim a sua destreza em Água Negra, que no
final acabou custando mais caro que Jardineiro Fiel, e arrecadando
menos, mas cifras não são nenhum sinal de qualidade (muitas vezes
é o contrário). No entanto, como obra cinematográfica, Água Negra
está tão distante de Central de Brasil e Diários de Motocicleta
quanto O Jardineiro Fiel está próximo de Cidade de Deus.
Talvez não queira dizer muito, ou mesmo nada, mas permitiu a Fernando
Meirelles, dirigindo em um território conhecido, realizar um bom
filme. Basta, não?
Links
Site Oficial do filme
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Água Negra, por Marcelo Hessel
Cidade de Deus, por Marcelo
Costa
Caiu do Céu, por Marcelo Costa
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