texto por Marcelo Costa
fotos de Diogo Burilio
vídeos de Bruno Capelas
Na quinta-feira, véspera do show de lançamento do álbum “Bacuri” (2024) no Cine Joia (que, na verdade, só iria começar quase na primeira hora da madrugada de sábado), uma chamada jornalística na capa do portal UOL destacava: “Boogarins: ‘A gente é a melhor banda de rock do Brasil. Foda-se o rock!”. Em uma época em que pouca gente no cenário musical bate no peito e assume posições, não deixa de se admirar a coragem da banda em se assumir melhor em algo, mesmo que esteja se “fodendo” pra isso – contextualizando a entrevista, segundo Dinho, “Boogarins tem esse lugar de que quem gosta de nós gosta de tudo. Essa coisa de uma coisa só morreu”, frase que vai ao encontro da ótima resenha do jornalista Ricardo Schott no Pop Fantasma: “Impossível não pensar em Dorival Caymmi ao começar a ouvir ‘Bacuri’, disco carregado de brasilidade e baianidade”.
Ainda assim, o excelente público que lotou o Cine Joia para assistir ao quarteto apresentar ao vivo o novo álbum, fresquinho (lançado oficialmente duas semanas antes), na integra, viu, essencialmente, uma apresentação de Rock com R maiúsculo (com direito a solos portentosos e muito “chifrinho heavy metal”). E se alguém quiser questionar a postulação de “melhor banda de rock do Brasil” do Boogarins (a discussão pode ser longa), uma coisa fica difícil contestar: o melhor som de guitarras ao vivo no país hoje é dos caras.
Distribuídos todos esses gatilhos, o que fica da noite é a sensação de presenciar não só uma banda poderosa ao vivo em comunhão com seu público, que cantou todas as novas tão ou mais alto do que os hits que vieram na depois, mas também o início de uma nova fase que soa quase como um acerto de contas dentro “de casa”: se Dinho Almeida atraiu a atenção dos fãs nos primeiros anos, e Ynaiã Benthroldo passou a se destacar – com mão pesada e muita técnica – assim que sentou no banquinho da bateria, a fase “Bacuri” parece colocar Benke Ferraz (guitarra e voz) e Raphael Vaz (baixo, moog e voz) não apenas em pé de igualdade com os companheiros, mas sim como destaques (em muitos momentos da noite, os riffs de Benke suplantaram a condução de Ynaiã, algo que ficou bastante nítido quando o novo repertório silenciou e as canções mais antigas surgiram).
A mântrica e bela faixa título abriu a noite com a voz de Ynaiã mais enterrada na mixagem (diferente da versão do disco, em que ela se destaca) e o coro do vocal dos companheiros mais alto, o que deu um belíssimo colorido ao momento, que também trouxe Benke fazendo uns fraseados interessantes na guitarra. Lançada como single pré-álbum, “Corpo Asa” foi saudada com urros e cantada em coro pelos presentes. Outra das grandes canções do novo álbum, “Chuva dos Olhos” também foi levada no gogó pelo público. O rockão “Chrystian & Ralf (Só Deus sabe)” trouxe Benke fatiando o ar com riffs enquanto “Poeira” surgiu mais intrincada, com as guitarras altas, bateria forte, e solinho a lá Yngwie Malmsteen que, no disco, está encoberto na mixagem, mas no show surge à frente – para delírio da ala metaleira.
Com exceção das duas últimas faixas do álbum (“Crescer” e “Deixa”), as outras oito já haviam sido testadas ao vivo anteriormente, principalmente, “Me Dê Um Som”, que surgiu mais densa, mais psicodélica e shoegaze e recheada de efeitos e também de ecos de Clube da Esquina (facilmente perceptíveis aqui e ali no álbum, lembrando que o Boogarins vem circulando, também, com um show em que recria o repertório do “melhor disco brasileiro de todos os tempos”), que se estende a “Amor de Indie”, que ganhou ao vivo uma longa introdução recheada com os fraseados de guitarra que marcam o arranjo. Mais mântrica, e conduzida pelo assovio de Benke, “Compartir” encaminhou o show para o final com os dois números inéditos da noite: “Crescer”, com Benke regendo o coral do público, e “Deixa”, com seu riff forte e ótimo vocal de Dinho. Show findo, e o público retornou com o coro de “Crescer”, de maneira bonita.
Finda a parte de lançamento do disco novo, o Boogarins presenteou os fãs com “Noite Bright”, “Auchma”, “Invenção”, “Falsa Folha de Rosto” e “Foimal”, e ainda que os “velhos hits” tenham colocado um enorme sorriso no rosto dos presentes, o frescor das faixas novas deu o tom para a noite, e ainda deixou no ar a certeza de que se agora, unidas como um álbum, as canções já soam fortes (e muito mais “intensas” que a delicadeza vista em muitos momentos de “Bacuri”), a estrada tende a deixa-las ainda mais redondas conforme a banda se apresente ao vivo em vários cantos do Brasil e do mundo. Ou seja, foi um show bom (porque as canções são boas e o disco é bom), que só tende a melhorar. O Boogarins está começando uma nova fase, e se eles se consideram a melhor banda de rock do Brasil hoje, vai ser praticamente impossível tirar o cinturão deles daqui nove, dez meses. Acompanhe a evolução, não deixe de vê-los ao vivo!
– Marcelo Costa (@screamyell) é editor do Scream & Yell e assina a Calmantes com Champagne.