texto de Bruno Capelas
Você pode até não saber quem é o cidadão carioca Marcello Mansur, mas atire a primeira pedra se nunca aumentou o volume do rádio ou esteve numa pista dançando ao som de uma de suas produções. Mais conhecido pela alcunha DJ Memê, o produtor, DJ e arranjador marcou época tanto no som da noite quanto no dial brasileiro ao longo dos anos 1980 e 1990 – e é uma das atrações do domingo, dia 19 de maio, do C6 Fest, com a honorável missão de abrir os trabalhos para a Sunday Mass de David Morales.
DJ desde os 11 anos de idade e um dos principais responsáveis pela introdução do termo “remix” no léxico da música pop brasileira, Memê está nos bastidores de grandes sucessos de pista dos anos 1990, dando uma nova cara para canções de nomes como Lulu Santos, Kid Abelha e Fernanda Abreu, ou mesmo ajudando revelações como Claudinho e Buchecha ou Gabriel o Pensador.
Neste texto curto que integra o esquenta do C6 Fest para o Scream & Yell (o festival está logo ali, hein), lembramos algumas vezes que você dançou e dançou mais um pouco ao som do Dj Memê. Nesta lista, obedecemos a um critério específico: trazer músicas em que ele participou da composição ou do arranjo. (Como toda regra, a gente também traz uma exceção especial no final… mas vamos com calma, um hit de cada vez). Um último conselho? Arraste o sofá e a mesa de centro e transforme sua sala numa pistinha enquanto lê.
DJ Memê é atração confirmada do C6 Fest 2024, que acontece no Parque Ibirapuera, em São Paulo, nos dias 17, 18 e 19 de maio. Conheça a programação completa dividida por dias aqui. Os ingressos estão à venda aqui.
01) “Assim Caminha a Humanidade”, Lulu Santos (1994)
A parceria de Marcello Mansur com Lulu Santos não foi a primeira que fez o nome do DJ Memê chegar até as paradas de sucesso – mas talvez tenha sido a que mais chamou a atenção para o trabalho do produtor carioca. Afinal de contas, Memê chegou a dividir um disco inteiro lado a lado com o guitarista, “Eu e Memê, Memê e Eu” – lançado em 1995, com dois ursinhos de pelúcia na capa, recheado de versões de Tim Maia (“O Descobridor dos Sete Mares”, “Sossego”), Roberto Carlos (“Se Você Pensa”) e Marina Lima (“Fullgás”) que tocaram muuuuito naquele verão. O momento mais brilhante da dupla, porém, foi um ano antes, com o hit “Assim Caminha a Humanidade”, em que os loops de Memê, violinos e o piano Rhodes de Lincoln Oliveti duelam em meio a uma das melhores letras dor de cotovelo escritas por Luís Maurício.
02) “Kátia Flávia, a Godiva do Irajá”, Fernanda Abreu (1997)
É verdade, é verdade: datada de 1987, a versão original de “Kátia Flávia, a Godiva do Irajá” talvez seja o único hit de massas de Fausto Fawcett (outro nome que faz parte da escalação do C6 Fest em 2024). Mas, dez anos depois, Fernanda Abreu tomaria por usucapião a posse da canção – e DJ Memê seria um de seus aliados ao produzir a faixa para o disco “Raio X”, de 1997. Não tem muito o que explicar aqui: com um arranjo potente e a interpretação sexy de Fernanda, basta o ouvinte fechar os olhos por alguns segundos para materializar a própria Godiva do Irajá usando calcinhas bélicas ao lado da caixa de som.
03) “2345MEIA78”, Gabriel o Pensador (1997)
A parceria de Marcello Mansur com Gabriel o Pensador é uma das mais longevas do produtor carioca: começou já na estreia do rapper em 1993, com Memê participando de oito das dez faixas, incluindo “Lôraburra” e “Retrato de Um Playboy (Juventude Perdida”). A escolha aqui, porém, foi viral: além de ter feito muito sucesso em 1997, “2345meia78” voltou a chamar atenção nos últimos tempos por ter virado moda no TikTok. Parte do mérito é de Memê, responsável pela boa sacada do sampler de “Good Times”, do Chic, para fazer a base aos versos sacanas de Gabriel.
04) “Só Love”, Claudinho e Buchecha (1998)
Outra revelação dos anos 1990 da qual Memê foi colaborador de primeira hora é a dupla Claudinho e Buchecha: no primeiro disco, de 1996, é o DJ quem produz o hit “Conquista” (“sabe, tchurururu…”) e a esperta releitura de “Tempos Modernos”, de Lulu Santos. No segundo, ele dá as caras também na incrível “Quero Te Encontrar” e na versão de “Uma Noite e ½”, de Marina Lima. Mas a escolha aqui ficou com “Só Love” por motivos óbvios: o arranjo de bateria eletrônica não só marcou época, mas também tem impregnadas o DNA sonoro de Memê. Duvida?
05) “Puro Êxtase”, Barão Vermelho (1998)
Então é só ouvir por alguns segundos “Puro Êxtase” ou “Por Você”, os dois hits de “Puro Êxtase”, disco da ex-banda de Roberto Frejat que Memê produziu em 1998, quando parecia ter o toque de Midas para roqueiros em crise fonográfica. Em alguns momentos, dá certo – como na faixa título, até hoje um bom momento em qualquer pistinha rock retrô. Em outros, a produção soa datada, como acontece na regravação de “Cena de Cinema”, de Lobão, ou… de “Por Você” (que ganhou nova vida poucos anos depois, em uma versão no curioso formato “Balada MTV”).
06) “Teletema”, Kid Abelha (2000)
O Kid Abelha foi outra banda que, em meio a uma fase menos criativa, recebeu o toque de Memê – a colaboração se estendeu por vários álbuns entre o meio dos anos 1990 e o final dos anos 2000, quando o trio de Paula Toller finalmente se dissolveu. Um dos melhores momentos da colaboração veio nessa delicada releitura de Antonio Adolfo & Tibério Gaspar, atualizando para a década de 1990 o romantismo especial originalmente registrado na voz de Evinha. Bonito, bem bonito.
07) “Baixo Rio”, Ed Motta & Conexão Japeri (1988)
Nas canções dessa lista até aqui, Memê contribuiu quase sempre como instrumentista, produtor e arranjador. “Baixo Rio”, que abre o lado B do disco de estreia de Ed Motta, não chegou a ser exatamente um hit. Mas é uma rara oportunidade de contemplar um lado curioso de Marcello Mansur: o de letrista, numa parceria com Fábio Fonseca, Ed e Luiz Fernando Comprido. (Para quem está ligado nas estatísticas, é também a mais antiga da lista).
Bônus Track: “Estoy Aqui (Extended Club Mix)” – Shakira (1997)
Muito antes de lotar estádios pelo planeta e enfileirar músicas-tema da Copa do Mundo, houve um tempo em que Shakira fazia grandes turnês pelo Brasil, tocando em cidades como Maringá, Barretos, Santo André, Uberlândia e Uruguaiana – além de ser figurinha fácil em programas de Gugu, Hebe, Faustão e Ana Maria Braga. Um dos responsáveis por ajudar a colombiana a mudar de status planetário foi justamente Memê: é dele o remix de “Estoy Aqui” que fez a música não só deslanchar no Brasil, mas se tornou um dos primeiros sucessos globais da cantora, com direito até a chegar às paradas da Billboard. A história é tão boa (e curiosa) que vale a exceção de ser o único remix que vamos citar neste texto, entre fotos e cadernos, coisas y recuerdos.
– Bruno Capelas (@noacapelas) é jornalista. Apresenta o Programa de Indie e escreve a newsletter Meus Discos, Meus Drinks e Nada Mais. Colabora com o Scream & Yell desde 2010.