Três perguntas: Nina Maia fala sobre seu novo single, “AMARGO”

entrevista de Renan Guerra

O canto e as canções de Nina Maia têm uma estranheza que seduz, esse é o primeiro encanto de seu trabalho. Com timbre bastante único, a cantora e compositora paulistana cria seu universo com a ajuda de seu piano, mas também navega pelos sons e ruídos de baixo e guitarra, tudo isso se unindo para criar um som bastante singular que dialoga com as cantoras clássicas da MPB, mas que também mira aquele arquétipo das singer-songwriters dos anos 1990 que ficavam no limiar entre o pop e o indie. Agora Nina está lançando a canção “AMARGO”, composta por ela em parceria com Yann Dardenne e interpretada por Nina com a participação em voz e violoncello da musicista Francisca Barreto.

A faixa foi produzida pelos três artistas em setembro de 2023, na Espanha, conforme conta Nina: “Chica e eu somos amigas e parceiras musicais de longa data. Ela agora está em tour internacional, acompanhando Damien Rice, mas ano passado eles reservaram alguns dias em Ariant, na ilha de Maiorca, na Espanha, para se dedicarem a um processo criativo dele. Acabou que Damien não pode seguir com as gravações e sugeriu que Chica utilizasse o estúdio como quisesse”. O local era um estúdio caseiro que havia sido montado por Chica e Damien num cômodo silencioso dentro de uma residência histórica de Ariant. “Era tipo um pequeno castelo, uma construção antiga, rodeada por uma criação de cabras e por uma paisagem linda. Estávamos isolados de tudo, não tinha internet nem luz na casa, com exceção do estúdio, que era alimentado por energia solar. Isso tornou a experiência imersiva e única”, detalha Nina. Com isso, a faixa foi gravada ao vivo, os três artistas tocando em conjunto e no resultado final é possível ouvir o som ambiente do lado externo da casa.

Para acompanhar esse lançamento, Nina também gravou um clipe para “AMARGO”, feito com registros capturados pela própria artista em Maiorca, e assinado por ela e por Gabriela Boeri, com quem já havia trabalhado em 2023, no clipe da canção “SUA”. Vale citar aqui que a relação entre Nina e o audiovisual já vem de outros tempos e vai além dos clipes: a artista já colaborou em trilhas sonoras de seis longas-metragens nacionais, incluindo uma versão de “I Will Survive”, gravada ao lado das cantoras Maria Gadú, Iza e Liniker, para o filme “Todas as Canções de Amor” (2018), de Joana Mariani. Em 2021, Nina decidiu investir de vez em sua carreira solo, com o single “De Dentro”, co-produzido por ela em parceria com Lúcio Maia, ex-Nação Zumbi. Dois anos depois lançou a música “Gosto Meio Doce”, com a cantora e amiga Francisca Barreto e o single e clipe “SUA”, a primeira amostra do seu disco de estreia, que deve sair por completo ainda em 2024.

Para o Scream & Yell, Nina Maia respondeu nossas três perguntas e contou mais sobre suas referências e sobre o seu processo de criação. Leia abaixo:

“Amargo” foi produzida em 2023, na Espanha, durante uma estadia em Maiorca, em um estúdio caseiro montado em uma residência histórica, por isso gostaríamos de entender como os ambientes impactam a sua música e a sua criação artística? Pois o resultado final, para nós ouvintes, é realmente essa criação de uma ambiência muito única – algo que até tem a ver com seus trabalhos com trilhas sonoras de cinema, não?
Acho que o ambiente e a atmosfera onde se grava uma música, onde se constrói uma música, é muito importante e às vezes a gente acaba não conseguindo ter ambientes imersivos que, de fato, influenciem poeticamente e/ou artisticamente na gravação de uma música, mas esse foi o caso de “Amargo”. A gente estando lá naquele lugar, entendendo a beleza disso, nos fez ficar muito atentos para tentar realmente captar o que a música trazia estando naquele lugar, sendo gravada naquele lugar. Acho que a gente conseguiu deixar a mágica acontecer, o que foi muito legal. Acho que as minhas experiências com trilha sonora me ensinaram um pouco disso, a estar atenta ao ambiente, às atmosferas, às circunstâncias sobre a qual a música é feita.

O seu som mescla jazz, pop e outras interessantes estranhezas, nos levando a fazer conexões de seu trabalho com diferentes artistas – especialmente uma linhagem de cantoras-compositores que vem de um universo de muita unicidade. Nesse sentido, quais são as suas referências basilares? Quais artistas estão sempre no seu repeat?
Eu tenho referências e influências diversas, mas, de fato, cantoras mulheres que cantam suas vidas, suas poesias, suas histórias (me influenciam). Mergulhar na discografia de cantoras sempre me fascinou muito desde nova. Desde Nina Simone até Rosalía e Billie Eilish, são artistas que me influenciam muito. Marisa Monte, Gal Costa, Maria Gadú, são influências, assim, no canto, na voz, e são artistas que não saem dos meus ouvidos.

Em “Amargo” você toca mellotron, já vimos shows em que você toca piano, guitarra, baixo, queria entender qual a sua relação com esses instrumentos, você estuda música há muitos anos? Além disso, como os instrumentos entram na hora de suas composições? As canções costumam surgir pela letra ou pela melodia?
Comecei a estudar piano quando eu tinha nove anos. Ganhei uma guitarra aos 12 e comecei a compor. Ali, meu universo começou a se expandir na música quando a composição chegou na minha vida. Depois, voltei a estudar piano mais forte, ele é o instrumento que eu tenho mais familiaridade, mais facilidade. Acaba sendo o instrumento em que eu componho mais as músicas. Assim, as composições nascem de formas diferentes. Às vezes, começa de uma melodia que está na minha cabeça, e as palavras vão chegando e depois encaixo uma harmonia nisso. Às vezes é o contrário, nasce de acordes no piano, e tenho vontade de colocar palavras e melodias naquilo. Acho que as minhas músicas nascem de uma vontade de expressar um sentimento específico. Acho que a ordem das coisas varia, mas é sempre isso. “Amargo” foi isso, tinha esse sentimento de gosto amargo na boca e eu precisava botar para fora, é o que eu estava sentindo, a situação que eu estava vivendo. Então, “Amargo” nasceu aí.

– Renan Guerra é jornalista e escreve para o Scream & Yell desde 2014. Faz parte do Podcast Vamos Falar Sobre Música e colabora com o Monkeybuzz e a Revista Balaclava. A foto que abre o texto é de Leon Rehman.

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