Três Perguntas: Fábio Cardelli

entrevista por Cainan Willy

Fábio Cardelli acaba de lançar seu mais recente trabalho, “Cardellicious” (2018), registro já disponibilizado nas principais plataformas de streaming (ouça no Spotify) e precedido pelos singles “Depois da Chuva” (abril de 2016) e “Depois de Nascer” (janeiro de 2018). Gravado no Estúdio Dissenso, em São Paulo, “Cardellicious” conta com Iuri Freiberger na produção e é marcado por uma sonoridade anos 90, com traços de grunge, mod e britpop, paixões de Fábio.

Acompanhado nos shows por Fabio Tito (baixo, vocal) e Marlon Marinho (bateria, vocal), Fábio Cardelli gravou cinco canções para “Cardellicious”, que é aberto com o single “Depois de Nascer”, em que ele canta sobre sobreviver na cidade de São Paulo e fala de vaidades modernas como a problematização. O disco segue e parece ter sido feito para quem conhece essa megalópole, ou para quem vive em qualquer outra cidade e enxerga as pessoas e ouve suas histórias.

Sucessor de “A Palavra dos Olhos” (2015), álbum de estreia solo de Fábio (que desenvolveu trabalhos com as bandas Wasted Nation, Visitantes e o coletivo Cabezas Flutuantes), que era um disco mais sútil e auto analítico, nas palavras do músico, “Cardellicious”, por sua vez, “é mais pra fora, ele quer te chacoalhar, tem mais guitarra, fala da garçonete, do caminhoneiro”, ele explica. Em três perguntas, Fábio Cardelli fala sobre rock latino, “Cardellicious” e mais.

Ouvindo “Cardellicious”, não pude deixar de reparar em algumas influências bem trabalhadas do rock latino, principalmente o que tem sido feito na Argentina nos últimos tempos, da pra citar bandas que adoro como Bestia Bebé e El Mató a Un Policia Motorizado. Como é sua relação com o rock latino?
Esse movimento de ouvir os vizinhos foi bem importante pra mim. Até 2010, eu não manjava quase nada de rock latino, até virem o Mutandina e o Superchería pro Brasil. Eu fui no show dessas bandas no SESC Consolação e troquei bastante ideia com eles, ficamos amigos… Foi então que o guitarrista do Superchería, pelo Facebook trocando ideias, foi me dando uma aula de história do rock argentino. Pirei muito com a trajetória do Luis Alberto Spinetta, é um dos grandes mestres. É uma pena que muita música boa de fora acabe não chegando nas pessoas em geral aqui no Brasil por estar nessa hashtag de “rock latino”, esses algoritmos danados. A verdade é que, com “cara de latina” ou não, se faz muita, mas muita música boa na nossa vizinhança.

Geralmente vejo bandas usando o primeiro disco como o momento de experimentar diversas sonoridades e temáticas, você não fez muito disso em “A Palavra dos Olhos” (2015), mas em “Cardellicious” vejo uma criação mais ousada, tanto no que diz respeito à sonoridade e temática. Isso foi proposital?
Engraçado que o processo de produção foi exatamente o contrário – em “A Palavra dos Olhos” fiquei mergulhado durante anos na criação experimentando várias pegadas e instrumentos diferentes, e “Cardellicious” foi mais prático, gravando praticamente o instrumental inteiro ao vivo em um dia. Mas o “A Palavra dos Olhos” acabou sendo mesmo mais sutil, mais auto-analítico. E “Cardellicious” é mais pra fora, ele quer te chacoalhar, tem mais guitarra, fala da garçonete, do caminhoneiro… tem a ver com meu momento como pessoa em cada disco. Então, resumindo, acho que se tem essa sensação mais de impacto não é tão proposital, mas é simplesmente o jeito que eu estou curtindo fazer as coisas neste momento.

Desde seu descobrimento como artista solo em dezembro de 2012 já se passaram quase seis anos. Como é ser artista solo no Brasil agora?
É procurar cada vez menos me enxergar numa trincheira de artista “solo” ou “autoral” ou “independente”, e cada vez mais olhar esse ecossistema da música como um todo – como um fenômeno incrível dessa vida, que faz as pessoas pensarem, rebolarem, desabafarem, cantarem, se sentirem parte de alguma coisa. É complicado pra qualquer um que se propõe a ser artista no Brasil, né? Não é fácil. O próprio mercado em si já é super difícil, e ainda temos que lidar com essa mentalidade de gente hoje em dia no Brasil que tem a ideia que todo artista é vagabundo, por exemplo. Mas vejo muita gente que pensa além, que enxerga pra fora da matrix – é pra essa galera que eu quero falar, cantar as histórias das pessoas e comunicar com as pessoas através da minha linguagem que é o rock.

– Cainan Willy (www.facebook.com/CainanWily) e editor chefe do site Pacovios. A foto que abre o texto é de Anna Bogaciovas / Divulgação.

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