por Pedro Salgado, de Lisboa
Durante duas semanas, o Pega Monstro estabeleceu residência no Brasil e concretizou uma das mais interessantes excursões de uma nova banda portuguesa em território brasileiro. Numa entrevista realizada por email, Maria e Júlia Reis manifestaram o seu entusiasmo pela experiência vivida, mostraram interesse na cena local e revelaram otimismo sobre um maior intercâmbio entre as cenas musicais emergentes dos dois países.
A Gira Brasil 2016, do duo roqueiro português, iniciou-se em 4 de Novembro, com uma participação no Festival Se Rasgum, em Belém do Pará (de onde saiu a foto que abre o texto, de Bruno Carachesti), abrangendo igualmente apresentações em casas de shows de Brasília, São Paulo e Rio de Janeiro. Um dos desafios que se colocava ao Pega Monstro era a eventual dificuldade da pronúncia portuguesa. “No início, eu ainda tentava falar com sotaque brasileiro, mais por gosto do que necessidade, mas rapidamente entendi que não era de todo necessário e se calhar até roçava o ridículo. Mas habituamo-nos a utilizar mais gerúndios e algumas expressões: massa!”, explica a baterista Júlia Reis.
Gradualmente, a banda atraiu novos seguidores, que se encantaram com a energia e intensidade dos seus shows. “Saía muita gente satisfeita dos espetáculos, comprando discos, tirando fotos, pedindo até autógrafos… Para nós, da mesma forma, foi também uma experiência bastante positiva”, conta Júlia. Para além do encontro com Pedro Bonifrate, dos Supercordas, em Belém do Pará, a estadia do grupo no Rio de Janeiro rendeu igualmente uma jam session com Lê Almeida e Bigú Medine, no clube Escritório (propriedade da Transfusão Noise Records), gravada na noite de 11 para 12 de Novembro e disponivel para download gratuito aqui.
Sobre a possibilidade da estadia brasileira influenciar a composição de novos temas, a banda lisboeta revela alguma prudência. “Até agora ela ainda não chegou (a inspiração), mas claro que fomos influenciadas”, refere a guitarrista Maria Reis. No entender de Júlia, a questão temporal poderá ser o fator decisivo para a criatividade: “Talvez nos inspiremos mais na hora que fizermos uma residência artística no Rio de Janeiro”. Relativamente à hipótese de regressarem ao Brasil, as duas irmãs partilham a mesma opinião: “Quanto mais cedo melhor!”. De Lisboa para o Brasil, o Pega Monstro conversou com o Scream & Yell. Confira:
Como surgiu a possibilidade de fazerem este tour pelo Brasil?
Houve um rapaz, o Rafael, de Brasília, que estava interessado em ter um concerto do Pega Monstro e ajudar a montar o tour. Depois surgiu a hipótese de participarmos do Festival Se Rasgum, que tornou a turnê possível. Este trabalho foi feito pelo nosso lindo agente da Associação Cultural Filho Único, Afonso Simões.
A atuação no Festival Se Rasgum, em Belém do Pará, representou a vossa estreia em palcos brasileiros. Que aspectos mais vos marcaram nesse dia?
Chegámos há Belém três dias antes do nosso concerto. Deu para passear um pouco, fomos à ilha do Combú (linda!). Para nós foi o primeiro contato com o Brasil, sem ser através das novelas e da música. No dia da nossa apresentação estava imenso calor, tipo sauna e humidade a 100%. O pessoal curtiu imenso e foi sobretudo maravilhoso poder conhecer o pessoal de lá, como os responsáveis da loja de discos Discosaoleo. Em todo o lado nos receberam com simpatia, curiosidade e valeu a pena só por lá estar. Tivemos oportunidade de assistir a um bate-papo na Discosaoleo e perceber um pouco sobre a indústria musical no Brasil deste momento e do vinil em particular. Os discos são mais caros do que em Portugal, talvez quase o dobro, porque em todo o país existem cerca de duas fábricas de vinil e sem preços competitivos fica tudo muito caro. Apesar disso, o público continua comprando (tal como cá ou até mais) e há uma vontade muito forte para que a coisa se oriente de outra forma. Nesse sentido, este intercâmbio é legal para perceber que as coisas se podem passar de outro jeito e haver maior união e comunicação.
Na última entrevista que vos fiz, disseram-me que tinham seguidores brasileiros no Facebook. Isso resultou numa boa adesão aos shows de Brasília, São Paulo e Rio de Janeiro?
Sim! Houve shows mais cheios que outros, claro, mas no Rio e em São Paulo notou-se bastante quem já nos conhecia. Até cantavam as letras!
A mídia brasileira acompanhou o vosso percurso?
Fizemos algumas entrevistas lá, na Rock FM, no programa do lendário Kid Vinil, em São Paulo, para a Globo Online e no Festival Se Rasgum também.
Acham que existe espaço para as novas bandas portuguesas entrarem no Brasil?
Acho que sim, até porque eles querem essa aproximação, obviamente, e vice-versa. Para além do dinheiro, não há nenhuma razão para esse trabalho de intercâmbio não existir. E só com o contato direto com as bandas dos dois países é que isso vai mudar. Por muita vontade que haja (e há!) em querer conhecer bandas brasileiras, e do vosso lado, portuguesas, só dá mesmo para aprender quando vemos os shows, tendo contato com os circuitos, os lugares e as pessoas. A internet ajuda a descobrir nomes e a entender um pouco da música, mas acaba ficando tudo meio disperso. A gente precisa promover mais este intercâmbio, mas o preço das viagens é um fator determinante.
Que balanço fazem desta experiência?
Foi um investimento grande da nossa parte, mas valeu a pena a 100%. Tocar no Brasil é incrível, cada atuação foi diferente mesmo com três shows na mesma cidade e tentámos sempre mudar o setlist. Foi uma experiência inacreditável.
– Pedro Salgado (siga @woorman) é jornalista, reside em Lisboa e colabora com o Scream & Yell contando novidades da música de Portugal. Veja outras entrevistas de Pedro Salgado aqui. A foto que abre o texto é de Bruno Carachesti / Divulgação Festival Se Rasgum. Veja mais fotos.
Muito bom artigo!