por Marcelo Costa
Tentei buscar em alguma gaveta da memória, e não me consigo me lembrar a primeira vez que fui a Casa do Mancha. Deve ter sido alguma das vezes que o Supercordas ou a Stela Campos ou Os Últimos Românticos da Rua Augusta tocaram no lugar, e curti a atmosfera realmente caseira, em que você esbarra com uma pessoa no bar e passa horas conversando sobre o cenário musical brasileiro, novos discos que estão saindo, sobre o show que vai ver ou acabou de assistir, você o desespero dos discursos tresloucados dos deputados na votação do impeachment (sim, eu estava na Casinha nessa hora, transtornado) e muito mais.
Apesar da memória falha, uma história para mim é inesquecível. Um amigo do Rio havia vindo para São Paulo para ir ao Lollapalooza. Ele chegou na quinta e emendei a apresentar para ele alguns picos da cidade que estavam dando espaço para a nova e brilhante música brasileira. Lembro que o levei para ver Wado, no Puxadinho da Praça, e O Terno, na Casa da Mancha. Na hora ele não comentou nada, e fiquei sem saber o que ele tinha achado, quando na segunda pós Lollapalooza, ele escreveu em seu Facebook algo mais ou menos assim: “O que mais valeu a pena na viagem foi ter conhecido o Puxadinho e a Casa do Mancha, lugares que valorizam e dão espaço pra música brasileira, lugares que fazem falta ao Rio de Janeiro”.
Acho que a minha visão da Casa do Mancha é bem por ai, e nesse ponto concordo com a visão do grande Maurício Pereira, um músico brilhante, ex-eterno Mulheres Negras, com uma carreira solo lindíssima, que foi chamado pelo Mancha para ser o patrono do festival, e tascou nas respostas abaixo: “Sempre que uma cena musical tá forte tem essas casas que abrigam o espírito dessa cena, a novidade, a inquietude. E a Casa do Mancha é uma delas”.
E se já bastaria vasta programação da Casinha agitando São Paulo toda semana, o Mancha ainda inventou, no ano passado, de fazer um baita festival com o “crème de la crème” da nova cena nacional! É o Festival Fora da Casinha, que neste domingo (07/08) chega a sua segunda edição, desta vez abrigado na Unibes Cultural, que será transformada numa área de convivência com DJs sets, barraquinhas de comidas e bebidas, além de bancas de publicações independentes e lojinha das bandas.
Abaixo você confere um bate papo rápido meu com o Maurício Pereira (salve, mestre!) especial para o Facebook do Spotify. No fim tem a programação completa e todas as infos do Festival Fora da Casinha II. A gente se encontra por lá, certo? Fala, Mauricio!
Mauricio, uma curiosidade: como você conheceu a “Casinha”?
Primeira vez que eu entrei lá foi pra participar da gravação do disco duma banda de rock aqui de São Paulo, os Rock Rockets. Eu já conhecia a casinha de nome, tava só esperando a chance de ir lá. Sempre que uma cena musical tá forte – e os últimos anos tem sido bem fortes em SP – tem essas casas que abrigam o espírito dessa cena, a novidade, a inquietude. E a Casa do Mancha é uma delas. Assisti muita coisa legal por lá, fiz belos shows também, sempre tem uma conversa interessante, com os artistas ou com o público. Sem falar que o povo do Mancha é sensacional, a vibe da casa é pacífica, plural, acolhedora. Enfim, uma pequena grande casa, onde ver ou fazer show é sempre uma experiência forte.
Como você recebeu o convite para ser patrono do festival? Você participou da escolha do line-up? E o que você está ansioso para ver e recomenda para o público aqui do Spotify?
> O Mancha é um figura… Ele tem um carinho grande pelo meu trabalho, que me deixa supercontente, e ele sabe também quanto eu acho precioso o trabalho da Casinha pra a vida musical da cidade. Então ele me chamou pra abrir o Festival. Puxa, uma honra… Talvez de algum modo eu ali simbolize um pouquinho o diálogo e a atenção que artistas da minha geração (eu venho dos anos 80) tem com os artistas mais novos, com a cena atual. E a Casinha é um cenário onde essa conversa se dá intensamente. Uma tremenda troca de figurinhas, música, comportamentos, jeitos de trabalhar. Não participei. Mas o faro do Mancha tá perfeito. O Festival traz um belo panorama de artistas que estão despontando, como a Luiza Lian ou As Bahias e a Cozinha Mineira, e de outros que já tem a carreira consolidada, como o Cidadão Instigado, o Hurtmold ou o Kiko Dinucci. Então não vou recomendar um show em especial. Vou sugerir que o público venha com fôlego e tente ver o máximo de shows que der pra ver. Pra abrir a porta pra a curiosidade de conhecer melhor o trabalho de cada um desses artistas (e mais outros), seja em shows no Mancha ou aí mesmo dentro do Spotify…
O Festival Fora da Casinha 2016 segue o padrão da primeira edição e da própria curadoria da Casa do Mancha, muita gente independente, que não está “bombando” na grande mídia, mas está enchendo de ar fresco o pulmão da música brasileira. Como você vê esse momento da nossa música?
> De uns dez anos pra cá, talvez um pouco mais, teve essa explosão na cena musical paulistana, em especial a cena autoral ganhou mais visibilidade. Gente daqui, gente de fora que veio pra cá, teve aquele momento forte do baixo Augusta. Uma boa fase da vida cultural da cidade: o DNA de SP é muito indie, tem gente com curiosidade, pequenas casas antenadas abrigando artistas novos, a internet como ferramenta pra pensar coletivo, pra produzir em coletivos. Essa geração nasceu num mundo que já pensa dum jeito meio independente. A qualidade dos trabalhos é mesmo alta: esses artistas que oxigenam o cenário musical do país e que não lançam pela grande indústria até por opção geram uma cena forte. E a curadoria da Casinha reflete essa cena e essa mentalidade, dá voz a ela. Acho que a gente tá num momento super rico, em especial da canção: gente compondo bem, produzindo bem, gente experimentando com a linguagem sem deixar de ser popular.
Serviço
Fora da Casinha II
7 de agosto de 2016 – domingo
a partir das 15h
R$ 70 (segundo lote) e R$ 90 (terceiro lote/ porta)
Venda online – http://bit.ly/ForaDaCasinhaII
Unibes Cultural – rua Oscar Freire, 2500 – Pinheiros
Ao lado da estação Sumaré do Metrô