por Adriano Costa
“Veja bem, você está gordo, tem que emagrecer. Não é somente uma questão de saúde, mas você precisa se adequar as normas e regras atuais da nossa sociedade. Você não vê as fotos no Facebook ou no Instagram diariamente? Pessoas “treinando” loucamente em academias atrás desse biotipo ideal. Ah, você tem que sair mais também. Ser mais social. Sorrir para todos, mesmo quando não quer, faz parte do processo. E por fim, era bom cortar o cabelo, fazer a barba diariamente e usar roupas melhores, uma camisa polo cairá bem em você, e isso “com certeza” lhe ajudará a achar o caminho da felicidade”.
Pois é: não há mais saída. Temos que entrar no modus operandi da sociedade e sermos felizes a todo custo, a toda hora, mesmo que você seja feliz do seu jeito e que não esteja nem um pouco preocupado em entrar nessa corrida por uma felicidade imaginada que ninguém sabe ao certo como é. Como bem ressaltou a psicanalista Maria Rita Kehl em entrevista: “do direito a felicidade, passou para a obrigação”, assunto também frequentemente tratado pelo psicólogo Arnaldo Cheixas Dias no blog “Em Terapia”.
A banda paraense Aeroplano explora essa questão no seu segundo disco, “Ditadura da Felicidade” (2014) (download gratuito aqui), que chega depois de dois EP’s e o disco de estreia, “Voyage” (2011). O novo trabalho foi produzido pelo guitarrista Diego Fadul, masterizado por Ivan Jangoux e conta com o (ótimo) projeto gráfico de Talitha Lobato. Se em “Voyage” a banda concebeu coisas realmente boas como “Dorme”, “Estou Bem Mesmo Sem Você” e “Vermelho que é Rosa”, por outro lado apresentou faixas confusas que influenciavam negativamente no resultado final. Isso felizmente não acontece em “Ditadura da Felicidade”.
Eric Alvarenga (vozes, violões e guitarras), Felipe Dantas (bateria, percussão e vocais), Bruno Almeida (baixo), Erik Lopes (guitarras) e Diego Fadul (guitarras, teclados e vocais) são responsáveis por um disco coeso que equilibra de bom modo melodias e trabalho instrumental buscando valorizar as letras, pequenas, mas certeiras (todas de Eric Alvarenga, com exceção de “11”, de Diego Fadul). O trabalho das guitarras flui muito bem como se pode perceber na ótima “Bazar” e na estupenda faixa título, que abre o trabalho e traz os versos: “Essa é a ditadura da felicidade, todo mundo sorrindo mesmo sem vontade”.
Outras, porém, também merecem realce. “Drogaditos”, por exemplo, é uma sacada precisa – e pop até a medula – que fala sobre drogas legais usadas no dia a dia como Dorflex, Tandrilax e Dramin, que servem para lidar com a dor, para dormir melhor ou para forjar uma tranquilidade. “Blasé” é outra pequena pérola. Destroça toda a pretensão cult de determinados indivíduos que acham que tem resposta para tudo concluindo que: “Meu amigo cult vai ensinar ao mundo como ser alguém diferenciado”. “11” é mais uma que se sobressai com uma tristeza arrebatadora e a constatação de uma geração desnorteada que não sabe muito bem para onde quer ir.
“Ditadura da Felicidade” mostra uma banda que cresceu de modo impressionante entre um trabalho e outro, e que passou de bons lampejos para uma produção mais homogênea. Em pouco mais de meia hora, “Ditadura da Felicidade” é uma sucessão de acertos tanto nas faixas mais enérgicas, quanto nas mais lentas, assim como na questão dos assuntos abordados nas letras. Com um pé no indie rock dos anos 2000 e outro em bandas como Violins, Radiohead e até mesmo Wilco, “Ditadura da Felicidade” está na lista dos melhores discos nacionais de 2014 até agora. É um disco para se ouvir feliz, triste, alegre ou deprimido. Você que escolhe. Nele não há ditadura alguma embutida.
– Adriano Mello Costa (siga @coisapop no Twitter) e assina o blog de cultura Coisa Pop
Gostei do disco! Ótima indicação!
Já tinha ouvido através de indicação de outro site, e vou te falar viu… Me surpreendi demais, é realmente um discaço.