A vida fútil do Lacuna Coil

Por Danilo Corci

Tony Wilson, no finalzinho da década de 70, cunhou o termo “gothic” para definir o som do Joy Division. A epifania do gênio charlatão foi o que revistas e jornais necessitavam para dar o rótulo necessário a uma turma esquisita que estava tomando conta dos muquifos roqueiros da época.

No início dos anos 80, o rock gótico ganhou espaço e respeito e foi se subdivindo. Influenciadas por bandas como Sisters of Mercy, Christian Death e Fields of the Nephilim, da fase gótica inicial e por Paradise Lost, já em início da década de 90, surgiu a vertente goth metal preconizada pela banda poser Type O Negative. Em seguida, o estilo foi ganhando burilagem com nomes como Cradle of Filth e Lacrimosa, esta última que preconizou o elemento-chave do estilo no século 21: bandas calcadas na imagem feminina.

Mas foi a italiana Lacuna Coil que definiu de vez o gênero com os duetos entre vocal feminino e masculino, coisa que gerou uma das maiores vergonhas alheias da história da música: a versão de “Phantom of the opera” do Nightwish. Também pode atribuir-se aos italianos, mas não só, o afastamento da estética musical de Judas Priest para a proximidade ao New Metal do Korn, por exemplo. É por isso que o gothic metal é um gênero adolescente por excelência, capaz de gerar bandas inofensivas como o Evanescence e lotar estádios para assisti-la. Este boom popstar ainda passa raspando na trajetória do Lacuna Coil, mas eles estão, mais uma vez, tentando.

Com mais de dez anos de carreira, o Lacuna Coil chega agora ao seu quinto álbum de estúdio, “Shallow Life”. E a síndrome de Peter Pan e Sininho atinge com força a banda. Com seus integrantes se aproximando dos quarenta anos, o Lacuna Coil parece fazer um caminho Benjamin Button: cada disco fica ainda mais adolescente – mas sempre focando no retorno, não à toa chamaram Don Gilmore, produtor de Avril Lavigne, para “retocar” o produto.

Fatos que ficam evidentes na conversa, via e-mail, com Andrea Ferro, o inventor e covocalista do Lacuna Coil. “Ainda temos a mesma paixão por música como sempre tivemos, mas, obviamente, a música agora é nosso trabalho e temos de tomar conta de tudo, inclusive de coisas não relacionadas à música. Mas sempre seremos uma banda e nos divertiremos juntos.”.

Diversão ou não, o Lacuna Coil é, de fato, uma máquina pensada para agradar a molecada. “Survive”, canção que abre o disco, é quase um hino para pequenos obcecados cheio de problemas. “Uma voz dentro de mim continua me tentando. Tão doce como um sussurro dos lábios da dor”. A coisa é séria, feita sob medida para embalar muitas decepções adolescentes.

“Somos incansáveis, trabalhos duro, fazemos turnês por todos os lugares e só nos tornamos uma banda internacional porque pensando fora da caixa, sem ficar presos em nosso próprio clichê. Não temos medos de arriscar.” afirma categoricamente Andrea. E com razão.

O Lacuna Coil percebeu bem que depois do Evanescence, comparações serão inevitáveis – coisa que fãs mais árduos já tinham notado em “Karmacode”, o antecessor de “Shallow Life”. Andrea, entretanto, refuta “Desde de Comalies nos tornamos uma banda maior e estamos muito perto do mainstream. Isso nos traz novos fãs, fãs diferentes dos originais, tanto em idade como em gosto. Não acho que Karmacode seja mais suave que Unleaashed Memories, por exemplo.”.

Resposta azeitada porque o assunto parece incomodar bastante Andrea. “Viemos do gohtic metal, mas incorporamos novos elementos em nossa música. Hoje temos heavy, rock e atmosferas dark, o que nos permite, por exemplo, fazer uma turnê com praticamente qualquer tipo de banda.”. Por isso o som de vocês está mais pop então? “Considero Shallow Life um disco de rock/metal. Mas se você quer dizer que ele é mais pegajoso e direito, sim, eu diria que está mais pop.”.

Difícil mesmo é achar metal e atmosfera dark em “Shallow Life”, onde quase qualquer canção, em especial “Wide awake”, poderia fazer parte da trilha sonora de qualquer Dawson’s creek. “Sempre tivemos uma balada em nossos discos, elas são importantes para gente. Mas isso não significa que só elas são, temos muito carinho com todas as canções que colocamos em nossos discos.”.

Então o que seria essa vida superficial para o Lacuna Coil? “Às vezes é bom e necessário ser fútil e sentar no sofá para ver TV e tomar uma cerveja. Outras vezes, você tem de pensar sobre assuntos maiores, ficar de pé e lutar ou tomar posição. Fútil é a vida da maioria das pessoas nesta era moderna, especialmente em nossa sociedade.”. Discurso adorável para adolescentes que podem se “rebelar” sem, necessariamente, saberem contra o quê e por quê. “Sou como um soldado diariamente/ Acordando dentro da batalha” diz a letra de “Shallow Life”. Se numa análise atenta é fácil desmontar o discurso, por outro ela é o que é: MacDonald’s musical para teens.

E o Lacuna Coil também está ligado ao movimento prosingle que parece existir entre os fãs/consumidores. “Gosto da ideia de um álbum completo para contar uma história, mas é verdade que a música está, com os downloads e iPods, indo pro lado de singles. Temos de ficar atentos.”.

Depois da conversa, fica bem claro que o Lacuna Coil agora quer se acomodar na zona de conforto de bandas como o Evanescence e My Chemical Romance, ou seja, ter um público cativo, incitar e representar sentimentos de revolta ou compreensão de adolescentes, sem levar tudo ao extremo. Uma maquiagem confortável para se chamar de rock, emo, gothic metal ou seja lá o que for. E se depender de Andrea, Cristina Scabbia, ele e os companheiros devem passar pelo Brasil: “Queremos muito ir à América do Sul. Acho que com este disco novo é bem possível que, finalmente, consigamos aparecer.”.

No fundo, por que não? Um pouco de futilidade é sempre bom.

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Danilo Corci é jornalista e editor dos sites Speculum e Mojo Books

9 thoughts on “A vida fútil do Lacuna Coil

  1. vai lá, o cara tem de comer também. a itália já foi melhor servida neste setor quando the frozen autumn estava ativo. e pensar que eles devem ter parado apenas por conta de algum racionamento de gel imposto pelo berlusconi.

  2. Gosto de Lacuna Coil há alguns anos e realmente esse CD novo está bem mais leve do que qualquer coisa que já fizeram. Não considero ruim, apenas mediano perto dos outros trabalhos do Lacuna.
    Não sei se é só pra mim, mas eles me parecem um pouco americanizados demais. Será por causa do Shallow Life ter sido trabalho com alguém mais voltado para o pop/rock americano? Mas como toda boa banda, sempre há um trabalho mais fraco/mediano.

  3. realmente esse album ta pop de mais partiram pro tudo ow nd

    e triste ver uma banda q era a melhor no seu seguimento virar isso

    decepçao total

  4. Concordo com o que voce disse deganar novos som, e do Lacuna ter agora uma sonoridade mainstream…
    Mas dispensava o historico do gotico para gothic metal… O gothic metal nao tem nada a ve com o gotico, foi uma invencao das gravadoras isso.
    E o que diabos tm a ver phantom of the opera cm Lacuna Coil?
    Eles sempre foram contra esse tipo e vocais conhecidos como “A Bela e a Fera”
    Apesar de pop e tudo mais, depois de ouvr o cd varias vezes, eu gostei, nao eh um comalies, ms eh legal 😀

  5. fantástico post, excelente.
    Não sei o que diabos está havendo com as bandas que eu costumava gostar, atualmente todas acabam por me decepcionar em seus cd´s mais recentes. Não consegui ouvir shallow life inteiro mais de 2 vezes e de acordo com todos estes fatos e informações que vemos em outros lugares e você mesmo colocou aqui, só pode significar uma coisa: a real aproximação ao mainstream atirando para todo lado e agradando a um público maior, porém muito menos seleto e muito mais FÚTIL.
    Parabéns pelo texto.

  6. Simples.
    Envelhecemos e acabamos ampliando nosso conhecimento musical.
    Com o passar do tempo temos a impressão de que alguns dos sons que ouvíamos ficaram datados.
    Nem bom nem ruim, datado.

  7. axei q como vc começa criticando o lacuna, e apesar! da sonoridade na minha opinião ñ ter ficado tãoooo “datado”, porq vc retoma com uma bela critica? se um pouco de futilidade é sempre bom e ser ironico tbm…esse texto ficou assim..tipo…datado? seja direto como vc propoe…se quer dizer q este é o fim! ou se não?
    eu ñ entendi esse texto. qual o objetivo? discurso?
    porq se estão a procura de um som perfeito! faça e publique…..me mostre oq é ser bom em termos de letra e melodia, em termos de negócios! ñ seja datado e fútil… negócios são importantes p/ vc? quem axar q não, esta sendo hipócrita e ponto. e! sob medida p/ embalar muitas decepções adolescentes.. apens p/ lotar ‘estádios’, e revelar um discurso inofensivo.
    ou seja, ou se não, assim…tipo, tão pré-histórico como joy division! nada diferente e nada ruim do q já se ouviu…

  8. Fazer algo diferente, é normal. Não é se acomodar…
    Depois de anos, essa materia é muito sem sentido e precipitada por causa de apenas UM ALBUM.

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