texto de introdução de Marcelo Costa
faixa a faixa de André L. R. Mendes
Em tempos de ChatGPT e IA, André L. R. Mendes é um… trovador (punk) medieval (headbanger). Enquanto muitos compositores cedem às regras do mercado da música, uma atitude que muitas vezes mata a criatividade e a espontaneidade, André continua seguindo seu instinto e, no modo mais DIY possível, compondo e produzindo sua arte de maneira completamente independente, como demonstra “It ‘s Only Artesanato (But I Like It)”, seu 12º álbum (e seu segundo disco em 2024).
Uns 10 anos atrás, aqui mesmo no Scream & Yell, perguntei para André o que tinha ficado de seu “passado” metaleiro, e a resposta parece continuar valendo até hoje: “Ficou tudo. Eu ainda sou aquele carinha radical e dono da verdade como qualquer headbanger é. Claro que as duas décadas que me separam de quem eu era naquela foto me deram um verniz, mas o feeling ‘punk’ do ‘eu vou fazer o que eu quero, porra’ ainda está aqui”.
“It ‘s Only Artesanato (But I Like It)” é um trabalho baseado não apenas na canção ao violão, com raras intervenções de outros instrumentos (uma pandeirola aqui, palmas ali), mas sobretudo nas relações do ser-humano com a arte e a tecnologia. “São canções que falam de ansiedade (vinda do consumo exacerbado das redes sociais), amor, o papel da arte na vida do artista e nos dias atuais de rápido consumo e descarte”, explica André, que fez tudo sozinho no disco (das canções à capa até produção e masterização).
Vocalista e compositor de uma das bandas mais legais do cenário nacional da segunda metade dos anos 1990, a Maria Bacana, André exorcizou o fim da banda lançando um punhado de discos, até reunir os amigos do Maria Bacana para um segundo álbum, em 2018. Sua carreira solo, no entanto, é sua propriedade, e faz total sentido trazer para ela canções de sua ex-banda, como fez com “Repeat, Please” e “Luvas”, lançadas em formato acústico pouco depois do álbum.
Abaixo, André L. R. Mendes passeia pelas 12 canções que compõe “It ‘s Only Artesanato (But I Like It)”, um trabalho que, segundo André, foi feito para ser ouvido do começo ao fim: “Esse não era um disco para ser destrinchado em singles no Spotify”, explica. “É um disco para ser ouvido do começo ao fim… tipo Pink Floyd”, brinca. Abaixo, André comenta, faixa a faixa, seu novo trabalho.
01) A Máquina da Ansiedade: Fala sobre a hyper utilização das redes sócias e seus efeitos: ansiedade, insegurança e consumo de ilusão como se verdade fosse… a canção aponta a saída: o convívio real e a valorização da vida off-line
02) Misturando: Uma canção sobre a vida de um casal apaixonado, sobre sexo e convicções.
03) Instantâneo: Sobre a valorização das imperfeições
04) Chato: Uma sobre a sensação de inadequação e falta de conexão com seu ambiente ou cidade
05) Claro | Redemoinho: Essa canção tem duas letras na mesma música: “claro” fala sobre a admiração pelo relacionamento verdadeiro vivido pelo narrador e “redemoinho” fala sobre os altos e baixos da vida e suas oportunidades de aprender e crescer.
06) Canto de Aclamação: Esta faixa que fala sobre a escolha do compositor de registrar a vida real e não fazer canções ficcionais
07) Era Sol Que Me Faltava: Canção mântrica que brinca com uma frase muito comum nas redes sociais, principalmente no verão : “era sol que me faltava”… na letra, o narrador fala o poder da música de mudar o clima do ouvinte e ajudar a enfrentar os pequenos e grandes problemas da vida. O tom da canção é Sol Maior.
08) Previsão do Tempo: Usando a metáfora das condições climáticas (e intempéries) o narrador fala sobre a emoção que certas canções despertam nele, levando inclusive ao choro emocionado
09) Menestrel Lobisomem: Canção que narra um rapto consentido, comportamento do século XIX que consistia num “sequestro combinado” entre os enamorados: o rapaz raptava a sua namorada (já que a família dela não aprovava a união do casal) e somente depois do casamento a mulher avisava sua família.
10) O Pai da Canção: Fala sobre o ofício do compositor e sua relação intensa com sua obra.
11) Tipo Miguilim: Canção inspirada no personagem Miguilim de Guimarães Rosa e sua compreensão do mundo pessoal frente à sua condição de dificuldade visual… até o momento em que ele, finalmente, enxerga o mundo de forma cristalina
12) Descarte: Canção que uso do sarcasmo pra perguntar: qual o valor da arte em tempos de IA e algoritmos?
– Marcelo Costa (@screamyell) é editor do Scream & Yell e assina a Calmantes com Champagne.
Que matéria bacana! André Mendes é um verdadeiro menestrel da atualidade!