texto de Alexandre Lopes
fotos de Fernando Yokota
Na noite de terça-feira (17/12), o Theatro Municipal de São Paulo recebeu a banda paulistana Terno Rei para a segunda apresentação do evento Noites no Municipal, promovido pela Coala Music (o rapper FBC estrelou a noite anterior). A proposta da produtora visava aproximar a música contemporânea brasileira do público jovem no teatro, que foi construído para atender ao desejo da elite paulista do século passado.
Parecia um feito difícil para uma banda relativamente jovem como o Terno Rei, ainda mais em uma terça-feira à noite. Uma banda de rock dito “alternativo” pode estar mais acostumada com suor, barulho e imprevistos ao vivo, não com a pomposidade de paredes douradas e uma acústica que pode representar um risco para a espontaneidade.
Mas no momento em que Ale Sater (voz e baixo), Bruno Paschoal (guitarra), Greg Maya (guitarra) e Luis Cardoso (bateria) pisaram no palco do Theatro, às 20h47, tudo parecia fácil demais. A banda não estava tocando para fãs dos Smashing Pumpkins sedentos para ver a atração principal, como meses atrás no Espaço Unimed; o Terno Rei estava em uma apresentação solo com ingressos esgotados. E por mais que o grupo tenha letras melancólicas e crie algumas sonoridades mais densas, a música do quarteto é realmente bem leve e acessível. E o fator mais importante: a plateia estava totalmente com eles, sendo em sua maioria um público jovem, empolgado, que sabia muito bem as letras dos discos “Violeta” (2019) e “Gêmeos” (2022).
Acompanhados de seu produtor Gustavo Schirmer nos teclados e violões e de Oscar “Cuca” Ferreira no saxofone em alguns números, a Terno Rei iniciou sua apresentação de forma emblemática, com “São Paulo”. Assim que Ale Sater resolveu esticar a melodia final para convocar uma participação dos espectadores, ficou evidente como seria o resto da noite: aquele ambiente seria apenas mais uma plataforma para a banda se conectar totalmente com seu público. E a resposta foi imediata: os gritos e cantos da plateia em “Solidão de Volta” mostraram que, embora a atmosfera do Theatro fosse imponente, a conexão entre os músicos e os fãs não só era possível como era iminente.
Ao longo do show, a banda transitou entre momentos mais introspectivos e inquietos. A introdução de “Medo” no teclado deu lugar a um jogo de luzes que construiu um clima intimista, enquanto em faixas como “Trailers”, o público assumiu a liderança, criando um coro que permeava o ambiente. O saxofonista Cuca Ferreira também contribuiu com participações elegantes em “Retrovisor” e “Isabella”. Talvez inspirado pelas interações de Sater, Bruno se arriscou no microfone algumas vezes e disse que a banda parou a produção do próximo disco para fazer este último show no ano.
Ao final de “Dia Lindo”, Sater comentou “essa música é tão pequena, né?” e mais uma vez esticou a composição, cantando o refrão para compartilhar com os fãs. “Só Eu Sei” contou com outro bonito show de luzes e na sequência vários assovios da plateia – provavelmente flertes direcionados ao vocalista principal – e ele brincou de volta, assobiando também.
Após a execução de “Yoko”, o baixista fez uma breve reflexão sobre a estrofe “oi, como vai você?”; segundo ele, ao gravar a faixa em estúdio, revelou que não gostava da frase e gostaria de ter optado por outra coisa, mas hoje em dia essa é justamente a parte que o pessoal mais lembra da canção. Um exemplo de que o compositor não necessariamente guia a criação, ela apenas flui.
Após “Esperando Você” e “Vento na Cara”, a banda saiu do palco, apenas para Sater voltar minutos depois sozinho com uma guitarra e começar “Olha Só”. Os outros membros retornaram aos poucos do escuro e se juntaram ao refrão. “Criança”, única faixa resgatada do disco “Essa Noite Bateu Com Um Sonho” (2016), apareceu e foi “dedicada aos emos” e fãs mais antigos. Se essa composição não era uma grande conhecida dos presentes ali, a versão para o clássico “Lilás” de Djavan surgiu para retomar o coro da plateia.
O show se encerrou com “Dias da Juventude”, na qual a participação dos fãs se fez presente mais uma vez. A canção, de tom nostálgico, parecia capturar um espírito de juventude que, se não é o intuito principal da letra, ainda ressoava no entusiasmo coletivo, com o refrão “noite legal, viagem sem fim / da boca no ouvido e a cabeça na lua” repetido à exaustão.
A grande questão em uma apresentação no Theatro Municipal seria se a banda conseguiria traduzir seu som para um espaço que muitas vezes exige uma linguagem mais formal e elitizada. Mas o Terno Rei se saiu bem ao criar momentos de cumplicidade com o público e quebrar esses protocolos, e ao mesmo tempo mostrar que seu indie pop é acessível (talvez até mesmo inofensivo) para um Theatro Municipal, que ao menos desta vez estava ávido para se engajar com cada verso.
– Alexandre Lopes (@ociocretino) é jornalista e assina o www.ociocretino.blogspot.com.br.
– Fernando Yokota é fotógrafo de shows e de rua. Conheça seu trabalho: http://fernandoyokota.com.br