Em grande noite, Smashing Pumpkins encavala hits e presenteia São Paulo com David Bowie

texto por Marcelo Costa
fotos por Fernando Yokota

Houve um tempo na música “pop” em que Billy Corgan era considerado o cara mais chato da cena, algo que foi amplificado com o sucesso avassalador da obra prima “Mellon Collie and the Infinite Sadness”, em 1995: bastou que uma senhora o parasse para pedir um autógrafo para que Billy percebesse que tinha ultrapassado a barreira do indie rock e que agora todos queriam falar com ele – e pirasse. A saída foi fazer um disco mais eletrônico (“Adore”, 1998, um pré-“Kid A” dos abóboras) e, depois, implodir a formação clássica para entregar-se ao rock burro (em “Zeitgeist”, de 2007). Aquela banda que muitos amavam havia praticamente morrido…

Corta para 2015, e uma foto de um Billy Corgan mal-humorado em plena Disneylândia viraliza. A banda seguia num limbo e até os discos do Pumpkins pareciam obras solo de Corgan (principalmente “Monuments to an Elegy”, de 2014), mas aquele momento de raiva e mal humor num “local de diversão” parece soar um divisor de águas na vida do líder dos Pumpkins, pois logo depois ele recruta James Iha e Jimmy Chamberlin para um novo disco, “Shiny and Oh So Bright, Vol. 1 / LP: No Past. No Future. No Sun” (2018), e parece virar a chave para… curtir a vida. Não é uma decisão fácil, principalmente quando você adora se vestir de preto e mantém uma posição sisuda, mas essa percepção colocou os Pumpkins nos trilhos novamente.

Em sua quinta passagem por São Paulo, o Smashing Pumpkins versão 2024 intercalou hits poderosos com canções novas, ensaiou brincadeiras constrangedoras típicas de quem não tem tato para entreter o público quando a massa sonora silencia, mas mesmo assim se sente à vontade para tentar, e surpreendeu com covers atípicas (e absolutamente deliciosas) que demonstram que a banda (como um todo, e Billy Corgan, em particular) está curtindo a vibe de circular o mundo tocando canções noite após a noite. Foi um “novo” Billy Corgan presente no Espaço Unimed, e isso fez toda diferença.

A noite começou como um repeteco das apresentações anteriores da banda com “The Everlasting Gaze” e “Doomsday Clock” dando a tônica do que viria pela frente, uma motoserra guitarreira que iria se sobrepor as melodias., algo principalmente sentido na cover meio descabida de “Zoo Station”, do U2, fixa no set list. “Today” foi o primeiro grande momento com os 8 mil presentes cantando com mão no peito, algo amplificado em “Tonight, Tonight” (curioso que Corgan evita os versos “Believe in me as I believe in you” da letra) e estendido para “Ava Adore”, em grande versão, e, principalmente “Disarm”, irrepreensível.

O quarteto instrumental (James Iha na guitarra, Jimmy Chamberlin na bateria, Jack Bates no baixo e Kiki Wong nas guitarras), então, deixa Corgan sozinho no palco e, munido de violão, o líder dos Pumpkins fez um medley surpresa com “Landslide” (Fleetwood Mac) e “Shine On, Harvest Moon” (uma canção popular do início dos anos 1900!). “Mayonaise”, amada pelos fãs mais antigos, colocou lenha na fogueira, e “Bullet With Butterfly Wings” foi a gota d’agua para conquistar quem ainda não havia se rendido ao show. O trecho final – com “Perfect”, “1979”, “Jellybelly”, “Cherub Rock” – mostrou a banda se divertindo (com citações na guitarra de riffs do Black Sabbath, AC/DC e Led Zeppelin) e o público feliz.

Via de regra, os Pumpkins não têm feito bis na turnê recente, é motoserra uivando uma canção atrás da outra com “Zero” encerrando a festa em altíssimo astral, mas nessa noite especial em que a banda fazia um dos melhores shows dela no Brasil (devemos falar sobre o show do Planeta Terra? Melhor não), o grupo decidiu presentear o público com um bis não planejado (escrito à mão, de improviso, no set list), e James Iha assumiu o microfone para cantar “Ziggy Stardust”, clássico de David Bowie e os Spiders from Mars, em uma versão que fez o público se beliscar não apenas pelo inusitado, mas também pelo capricho na execução, encerrando de maneira bonita um domingo repleto de boas surpresas.

Em um ano em que o Lemonheads se reergueu e também fez seu melhor show no país (contrariando todas as expectativas), o Pumpkins (que também era uma incógnita nas bolsas de apostas) deixa São Paulo com uma sensação de dever cumprido: por quase duas horas, Billy Corgan, James Iha e Jimmy Chamberlin – escudados muito bem por Jack Bates e a musa das guitarras Kiki Wong – honraram a história que construíram (principalmente nos anos 1990). Aquela banda que muita gente ainda ama está viva e fez muita gente feliz em São Paulo. A vida, ela dá voltas…

SET LIST

The Everlasting Gaze
Doomsday Clock
Zoo Station
Today
That Which Animates the Spirit
Tonight, Tonight
Beguiled
Ava Adore
Disarm
Landslide
Shine On, Harvest Moon
Mayonaise
Bullet With Butterfly Wings
Empires
Perfect
Sighommi
1979
Jellybelly
Gossamer
Cherub Rock
Zero

BIS
Ziggy Stardust

– Marcelo Costa (@screamyell) é editor do Scream & Yell e assina a Calmantes com Champagne.
– Fernando Yokota é fotógrafo de shows e de rua. Conheça seu trabalho: http://fernandoyokota.com.br

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