Música: “Não Leve a Mal”, disco de estreia da Pluma, é inteligente, instigante e sincero

texto de Renan Guerra

A música do quarteto paulistano Pluma habita um espaço bastante único de experimentação, pois é fortemente indie e experimental, mas ao mesmo tempo saborosamente pop. E depois de um vagaroso caminho de interessantes canções, enfim somos apresentados ao primeiro disco da banda, “Não Leve a Mal”, lançado pelo selo Rockambole, e podemos enfim afirmar: a espera valeu a pena. Se o prelúdio da banda foi marcado por um casamento entre o indie e o jazz, nesse primeiro disco temos uma aventura ousada por diferentes gêneros em um trabalho que não tem medo de ser pop & estranho.

Formada por Diego Vargas (teclado/synth), Guilherme Cunha (baixo), Lucas Teixeira (bateria) e Marina Reis (vocal), quatro amigos que se conheceram na faculdade de Produção Fonográfica, a Pluma se reuniu em 2019 como banda a partir do seu projeto de conclusão de curso, tanto que seu primeiro EP, “Mais do Que Falar” (2020) era basicamente um projeto da faculdade. Nessa perspectiva formal de eles se entenderem e trocarem, os quatro músicos criaram um universo bastante particular que parte não das similaridades, mas sim das diferenças e unicidades de cada um. São as estranhezas de cada membro que, felizmente, gera a coesão sonora da Pluma.

“Não Leve a Mal” surge como fruto dessas experiências de quatro artistas jovens descobrindo os palcos pós-pandemia e entendendo o que pode ser a sonoridade desta banda que nasceu de forma quase protocolar, mas que se impôs de forma sincera, pela força que assumiu nos ouvidos atentos de quem estava interessado em algo fresco e sincero. E, por isso mesmo, esse disco teve seu tempo de maturação, em um processo lento que passa pela gravação em estúdio – gravado na Casa Rockambole, espaço cultural importante no bairro de Pinheiros, em São Paulo – e pela pós-produção, com um trabalho minucioso que desconstrói e reconstrói as canções.

Com inspirações que vão de Billie Eilish ao sons da cena eletrônica underground de São Paulo, a Pluma cria um universo bastante particular: o jazz e as quebras de ritmo ainda estão ali, até mais experimentais, porém ganham espaço as possibilidades quebradiças e velozes da música eletrônica, as digressões lisérgicas do rock e as métricas pegajosas do pop. Tudo isso é amarrado por uma poética cada vez mais sincera e direta.

Capa de “Não Leve a Mal”, primeiro disco da Pluma

Se antes havia um universo que parecia intrincado e misterioso na Pluma, agora há uma sinceridade acolhedora. Romances, incertezas e medos aparecem expostos com a crueza de quem se mostra vulnerável para o outro, de quem se abre para o inesperado de forma completamente entregue. E nesse jogo a banda se coloca ainda mais próxima de seu ouvinte, seja ele um par geracional dos quatro músicos ou de uma geração completamente distinta.

As canções da Pluma tratam de temas universais: amores em declínio, paixões incertas, inseguranças do amadurecimento e a exaustão geral que nos assola. E, por deus, como podem eles serem tão certeiros em certos temas. A intensidade da juventude auxilia que eles construam canções tão certeiras e diretas sobre nossas intimidades.

E tudo isso é feito em músicas que exploram diferentes caminhos sonoros. Eles podem optar pelas guitarras distorcidas, pelos beats acelerados do drum’n’bass ou pelas quebras do free jazz, e isso cria possibilidades que vão da pista de dança às canções de fossa mais dolorosas possíveis. “Não Leve a Mal” é um reforço da inventividade da Pluma e também uma apresentação extremamente interessante da banda para um novo público. E, de algum modo, reflete todo o background diverso de seus integrantes, em alguma salada que, sabe-se lá como, acaba saindo extremamente coesa e deliciosa.

A estreia da Pluma tem todas as potencialidades para tornar eles em a banda que está nos ouvidos de geral, basta que as pessoas tenham a curiosidade de se entregar ao novo. Com sua estranheza pop, “Não Leve a Mal” é um disco inteligente, instigante e, principalmente, sincero. Ouça de peito aberto e se deixe levar pelo universo envolvente da Pluma.

– Renan Guerra é jornalista e escreve para o Scream & Yell desde 2014. Faz parte do Podcast Vamos Falar Sobre Música e colabora com o Monkeybuzz e a Revista Balaclava

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