Três filmes: “Meu Malvado Favorito 4”, “Tarsilinha”, “O Gigante de Ferro”

 textos de Marcelo Costa

“Meu Malvado Favorito 4”, de Chris Renaud (2024)
Não só é injusto como é uma responsa imensa estrear um filme “infantil” dias depois de “Divertidamente 2”, uma das animações mais bacanas do cinema recente, o típico filme de adulto travestido em filme de criança que os pais adoram aplicar nos filhos como um “auxílio” na educação (o meu filho, por exemplo, já está “roteirizando” com amiguinhos na escolinha “Divertidamente 3” com novas emoções – obrigado “Emocionário”), o total contrário da saga dos Minions, que poderia ser resumida como a Copa do Mundo do Bullying, mas, adaptando outro, “infância sem diversão faz do Jack um bobão”, certo? Humm… Não que “Meu Malvado Favorito 4” fosse sair prejudicado nas bilheterias estreando dias depois do hit da Pixar – a nova saga da família de Gru estreou entre os filmes mais assistidos nos cinemas brasileiros no final de semana, com mais de 1.5 milhão de público e cerca de R$ 31 milhões em bilheteria –, mas colocados lado a lado nas salas de cinema fica difícil não os comparar como produto final, e a Illumination Entertainment apanha de goleada da Pixar. Ainda assim, para quem se decepcionou com “Minions 2: A Origem de Gru”, uma grande bobagem, “Meu Malvado Favorito 4” parece mais bem cuidado, com uma história mais tátil e as mesmas zoeiras de sempre dos amarelinhos, que agora ganham superpoderes (que irão render uma nova linha de brinquedos e blá blá blá). Na trama, a família de Gru – agora com um novo integrante, Gru Jr. – é obrigada a se esconder de um vilão travestido de barata que promete atazaná-lo, mas, você sabe, ele será encontrado e precisará enfrentar o temível Maxime Le Mal. Objeto simpático de riso fácil, “Meu Malvado Favorito 4” é mais do mesmo, mas diverte enquanto… entrete? (risos) Não sejamos ranzinzas: já vale por apresentar Tears for Fears pros pequenos.

Nota: 5


“Tarsilinha”, de Célia Catunda e Kiko Mistrorigo (2022)
Tarsilinha é uma menina de oito anos de idade que vive em uma casa de fazenda com os pais. Certo dia, Tarsilinha se vê obrigada a enfrentar seus maiores medos e embarcar sozinha uma aventura para recuperar as memórias da sua mãe que, repentinamente, se esquece de tudo, inclusive da pequena filha. Animação produzida pelos fundadores da TV Pinguim (Pinguim Content), os mesmos criadores das franquias Peixonauta e O Show da Luna (com o qual, aliás, Tarsilinha guarda leves semelhanças), “Tarsilinha”, como o nome já adianta, é inspirado nas obras da pintora, desenhista, escultora, ilustradora, cronista e tradutora Tarsila do Amaral, uma das principais artistas modernistas latino-americanas. Obras como “A Lua” (1928), a “A Cuca” (1924), “O Saci” (1925) e, claro, o famoso “Abaporu” (que, na trama, é a casa da vilã Lagarta) ilustram as paisagens que a pequena personagem desbrava em sua jornada por um mundo fantástico (repleto de personagens do folclore brasileiro), que guarda semelhanças narrativas com “Alice no País das Maravilhas”, mas se mostra personal, educativo e delicado ao abordar temas densos como medo, memória, amadurecimento e coragem. O elenco de vozes conta com Marisa Orth (Lagarta), Alice Barion (Tarsilinha), Maira Chasseroux (Mãe), Ando Camargo (Sapo), o saudoso Skowa (Saci) e Rodolfo Dameglio (Bicho Barrigudo) num filme que foi selecionado para festivais como o Children’s International Film Festival, na Austrália, Marché du Film, em Cannes, e Veneza Film Market, “Tarsilinha” está disponível na Amazon Prime Video e é uma boa alternativa de longa-metragem para assistir com os filhos pequenos em casa.

Nota: 7.5


“O Gigante de Ferro”, de Brad Bird (1999)
No auge da Guerra Fria nos anos 1950 numa cidadezinha do estado norte-americano do Maine, um garotinho solitário chamado Hogarth, criado por uma mãe viúva que trabalha em uma lanchonete e tem pouco tempo para dar atenção ao menino, descobre um gigante de ferro que veio do espaço e cria um forte laço de amizade com o robô. Juntos, eles se divertem em um ferro velho de um rapaz que Hogarth conheceu na lanchonete em que a mãe trabalha – só os dois sabem do gigante de ferro. Porém, certo dia, a mãe descobre a existência do robô, e com receio de que o filho esteja correndo perigo, alerta as autoridades, que enviam o exército para dar cabo ao gigante, incluindo um detetive inescrupuloso que fará de tudo para acabar com o robô. Animação densa, poética e emocional baseada no livro infantil “The Iron Man: A Children’s Story in Five Nights” (1968), que o poeta britânico Ted Hughes escreveu nos anos seguintes ao suicídio da esposa, a escritora e poetisa Sylvia Plath, para confortar os filhos, este brilhante “The Iron Giant” também foi o primeiro grande sucesso do diretor Brad Bird, que nos anos seguintes seria responsável por dois clássicos infantis modernos, a franquia “Os Incríveis” (2004/2018) e a obra-prima “Ratatouille” (2007), filmes que renderam dois Oscars ao diretor. Bird estava lidando com a morte da irmã, assinada pelo marido, quando começou a trabalhar no filme e utilizou a metáfora do personagem ser capaz de se recompor após ser danificado como mote para si próprio numa história triste e muito, muito bonita, que em nenhum momento apela para “bichinhos fofos e números musicais” (como observou o crítico Roger Ebert) nem cinema pastelão gratuito, concentrando-se numa história de amizade, perda e amadurecimento. Comovente e genial.

Nota: 10

– Marcelo Costa (@screamyell) edita o Scream & Yell desde 2000 e assina a Calmantes com Champagne.

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