Crítica: “Underdressed at the Symphony” é, facilmente, o melhor disco de Faye Webster

texto por Piergiuseppe Lippolis

Em 2017, logo após se matricular na Belmont University, em Nashville, Tennessee, para estudar composição, Faye Webster refez seus passos: decidiu tentar construir sua trajetória artística por conta própria, voltando para Atlanta, para a casa dos pais, a quem ela prometeu que continuaria na faculdade se não se tornasse uma musicista de sucesso. Na época do juramento, Faye era pouco mais que uma adolescente, mas já tinha um álbum em seu currículo, “Run and Tell”, lançado em 2013, quando ela tinha apenas 16 anos. Em suma, não se pode dizer que ela nem sempre tenha tido ideias muito claras.

No alvorecer de 2024, Faye Webster tem quase 27 anos e publicou recentemente o seu quinto álbum, “Underdressed at the Symphony”, que desde os primeiros minutos se assemelha ao trabalho da maturidade definitiva, completando idealmente um caminho de crescimento que, nos últimos anos, pareceu bastante constante e linear. Na esteira daquela ironia genuína e infantil que já conhecemos com a capa de “Atlanta Millionaires Club” (2019) e com o nome de seu álbum de 2021, “I Know I’m Funny haha”, o título do novo trabalho satiriza um episódio autobiográfico bastante curioso, com Faye tendo comprado ingressos para assistir a Orquestra Sinfônica de Atlanta no último minuto e não tendo tido tempo de usar roupas adequadas à ocasião.

“Underdressed at the Symphony” reúne dez músicas em menos de quarenta minutos e mantém alguns traços da cantora e compositora da órbita folk rock que conhecemos nos últimos anos, mas também busca novos impulsos em um romantismo r&b/soul e em um jazz suspenso e cinematográfico, bem como em alguns traços country espalhados aqui e ali. “Thinking About You”, a abertura, é a expressão perfeita dessa busca visceral e espontânea pela sensualidade, e é também a música mais longa do álbum graças a uma coda que teimosamente se arrasta além do imaginável, com um efeito hipnótico e um piano melífluo de sotaque jazzístico.

“Underdressed at the Symphony”, porém, não é só isso e há dois episódios em particular que apontam para um renovado gosto composicional: primeiro com “But Not Kiss”, na intenção de uma anti love song expressivamente impressionante, mas com uma geometria decididamente mais distorcida e quase contraintuitiva, com o piano se tornando o ponto de apoio da narrativa, com seus altos e baixos e pequenas deflagrações, alimentando um caos ordenado; e depois com “Lego Ring”, que conta com a participação de seu amigo Lil Yachty passando pela distorção e pelo autotune e, portanto, por uma chegada potencialmente inesperada, mas bem moldada, no (novo) contexto musical de Faye Webster.

Faye disse que se inspirou em Wilco, de quem foi artista de abertura em mais de um show, e cuja influência pode ser reconhecida em algumas das arquiteturas musicais mais barrocas e menos instintivas do novo trabalho, como “He Loves Me Yeah!”, mas a já citada “But Not Kiss” também pode ser outro exemplo da inspiração wilcoana. Comparado a Jeff Tweedy e seus associados, no som de “Underdressed at the Symphony”, o jazz é uma estrela-guia, não uma simples influência, por mais tangível que seja: percebe tanto em “eBay Purchase History” quanto na faixa-título, cujos arranjos, suspensos entre uma necessidade urgente de leveza e uma certa elegância, também se permitem ecos vagamente psicodélicos com um sabor country em suas rarefações quentes.

O traço comum de “Underdressed at the Symphony” é um véu de languidez nas linhas vocais, ainda mais do que na música, mesmo em suas passagens mais imediatas: “Lifetime”, que cozinha em fogo lento e traz à tona todos os lados mais emocionais de uma personalidade e um estilo de composição que encontra um de seus pontos mais altos na conclusão “Tttttime”, outro belo exercício da junção de jazz e country, muitas vezes perceptível nas dobras do álbum.

Mais do que o deslumbramento de uma abertura particularmente bem-sucedida e brilhante, mais do que o despertar positivo dos minutos seguintes ou as sensações alimentadas por uma boa primeira parte de sua carreira, “Underdressed at the Symphony” é, com pouca margem de dúvida, o mais bem realizado e bem-sucedido trabalho de Faye Webster. Tendo se libertado o suficiente de sua zona de conforto artística, Faye encarna hoje a síntese ideal entre o grau certo de inovação na abordagem e intuições que mantêm uma ligação com o passadoi, evitando pontos de ruptura potencialmente traumáticos. “Underdressed at the Symphony” merece um lugar de direito no grande círculo de artistas que estão escrevendo belas páginas na história da composição feminina contemporânea.

Texto publicado originalmente no site italiano Kalporz, parceiro de conteúdo do Scream & Yell. 

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