Massaripalooza no FFFront, em São Paulo, 23 de março de 2024
texto e vídeos de Marcelo Costa / foto de Rogerio Lacanna
Em comemoração aos 60 anos do “Reverendo” Fabio Massari em 2024, a Editora Terreno Estranho planejou uma série de eventos, sendo o pontapé inicial essa noite especialíssima que muitos dos presentes apelidaram como “Massaripalooza”. Na lojinha, as camisetas da série “Primeiros Livros” do Reverendo (“Estação Islândia” com uma Björk teenager na estampa, “Detritos Cósmicos” com Frank Zappa em destaque e, ainda, “Emissões Noturnas”). No som, a noite começou com o músico, jornalista, vocalista da Mickey Junkies e poeta Rodrigo Carneiro exibindo suas vísceras ao declamar poemas do belíssimo “Afetos Sísmicos”, seu segundo livro pela Terreno Estranho. Carneiro surgiu acompanhado por Paulo Beto, da anvil FX, que fez intervenções oportunas alternando guitarra e programações. Na sequência, o caos sonoro se instalou com mais uma apresentação demolidora da Giallos, combo do ABC que tive o prazer de escalar num distante Prata da Casa, no Sesc Pompeia, e que tantos anos depois soam ainda melhores. Um dos motivos é “Atravessou o Ebó”, discaço que os caras lançaram em 2023 marcando a nova formação em quarteto com Mabu Reis (trombone) muito bem inserido – ao vivo funcionou demais – ao lado do trio original que traz Flávio Lazzarin (bateria), Luiz Galvão (guitarra) e Claudio Cox (vocais, maracas e intervenções) – e, aqui, mais percussão. Showzaço caótico e sensacional. Para fechar a noite de festa, Inocentes. O prazer de ver e ouvir o quarteto num lugar pequeno e aconchegante é indescritível. Some-se a isso a curiosa conjunção do dia, que trazia, no mesmo horário em que Clemente, Ronaldo, Nonô e Anselmo iniciavam seu set no FFFront com a punk pop poderosa “Nada Pode Nos Deter”, o Titãs dando adeus a sua turnê caça-níqueis milionária num Lolla caidaço e enlameado (sempre lembrando aquela velha “anedota” de José Augusto Lemos nos primórdios da revista Bizz). Peças do acaso. Só quem viveu a época sabe o quanto arrepia ouvir Clemente lembrar: “Eu namorava uma garota no ABC no começa dos anos 80, e indo pra lá, num pontilhão, vi a pixação: ‘Garotos do subúrbio, vocês não podem desistir de viver”. As clássicas “Rotina”, “Expresso Oriente”, “Ele Disse Não”, “Miséria e Fome”, “Restos de Nada”, a cover de “São Paulo” (365) e, claro, “Pátria Amada” e “Pânico em SP” (com Clemente indo de guitarra em punho abraçar Massari no meio do povo) fizeram uma festa punk que deixou o povo rouco. De arrepiar. Vida longa, Massari!
Ale Sater no Blue Note São Paulo, 27 de março de 2024
texto e vídeos de Bruno Capelas / foto de Nik Silva
Conhecido nos últimos anos por ser o vocalista da Terno Rei, o cantor Ale Sater já se permitiu ao longo da última década alguns saltos distante de sua banda – caso do single “Japão”, de 2016, ou do bonito EP “Fantasmas”, de 2021. Na noite da última quarta-feira, quem compareceu ao Blue Note São Paulo pode vê-lo tomando impulso para um mergulho solo mais profundo. Ali, o paulistano não só se apresentou apenas com seu nome, mas também revelou estar em meio aos preparativos para lançar seu primeiro álbum individual neste ano. Mas Ale não estava só: acompanhado de Gabriel Arbex (do Dozaj) na guitarra, Roberto Kramer no baixo e Pedro Lacerda (do Glue Trip) na bateria, o cantor mostrou faixas dos trabalhos anteriores e também canções inéditas, algumas delas ainda sem nome. A maioria das novas músicas trafega por uma frequência mais noturna e reflexiva do que as criações do Terno Rei. Sem perder o sotaque pop, muitas passeiam por paragens que remetem ao rock inglês do pós-britpop de bandas como Travis ou do Radiohead circa “The Bends”, um prato cheio para a mão segura de Lacerda. Das canções já conhecidas, destaque para “Nós” , que abriu a noite, e para a delicada balada paterna “Peu”, com direito a citação incidental de “Porque É Proibido Pisar Na Grama”, de Jorge Ben. No segundo e no último quartos do show, porém, Ale dispensou a banda e encarou o público apenas munido de voz e violão. Curiosamente, foram também os instantes em que ele se voltou ao repertório da Terno Rei, apresentando versões desnudas para algumas das favoritas do bom (e jovem!) público presente no Blue Note – caso de “Yoko” ou “Solidão de Volta”, do estourado “Violeta”, de 2019, ou de “Olha Só”, lado-B do mais recente disco do quarteto, “Gêmeos”. Sem medo dos spoilers, o vocalista também reforçou o que quem acompanha o grupo nas redes sociais já sabe: a banda está em estúdio, mas ainda sem data para qualquer tipo de lançamento. Uma coisa de cada vez: primeiro, Ale vem sozinho – e pelo que apresentou nos 60 minutos em que esteve sob a ribalta do Blue Note, vale a pena ficar de ouvidos atentos.
Smack no Porta, em São Paulo, 27 de março de 2024
texto e vídeos de Marcelo Costa / foto: frame de um vídeo da Sarah Quines
“Esse mês do Thomas em São Paulo dá um filme do Jim Jarmusch”, brincou Bruno Capelas em uma conversa no Whatsapp. Explico: o músico e jornalista Thomas Pappon trabalha na BBC em Londres, mas sempre que volta ao Brasil dá um jeitinho de reativar algumas das bandas da qual fez parte lá nos anos 1980. Nessa passagem rolou sessão de autógrafos do recém-lançado em vinil “Amanhã é Tarde”, do Fellini, ao lado de Cadão Volpato, Jair Marcos e Ricardo Salvagni; um encontro com os amigos da Voluntários da Pátria (Nasi, Miguel e Frippi – o baixista Ricardo Gaspa mora em Goiás hoje em dia); DJ set, ensaios para um show da Zeroum (banda com Paulo Beto, Luiz Thunderbird e Tatá Aeroplano) e uma reunião do Smack, que, conforme dissemos aqui no Scream & Yell anos atrás, é “uma das bandas mais interessantes do pós-punk brasileiro e uma das mais desconhecidas”. Liderada por Sérgio “Pamps” Pamplona, falecido em 2015, o Smack contava com Edgard Scandurra na guitarra, Sandra Coutinho no baixo e Thomas Pappon na bateria e lançou dois discos mitológicos pela Baratos Afins, “Ao Vivo no Mosh” (1985) e “Noite e Dia” (1986), e ainda um EP pela midsummer madness em 2008. Nesse reencontro de Thomas com Sandra e Edgard mais Tadeu Dias na segunda guitarra no pequeno e completamente tomado Porta (alguns metros após o FFFront, em Pinheiros), a sensação de audição (já que apenas alguns fãs dedicados que chegaram antes conseguiram se posicionar em frente a banda) era de que todos evoluíram muito como músicos, o que deixou as canções do Smack ainda mais fortes. Assistindo ao show por uma janela (com apenas Thomas visível, relances de Sandra e, com sorte, um ou outro vislumbre de Edgard cantando), e se emocionando igual aquele moleque que, no século passado, ouvia o vinil lançado pela Baratos num quartinho a quase 150 quilômetros da capital paulista, essa noite soou como um acerto de contas adolescente: eu devia isso para aquele Marcelo de 16 anos em 1986. Ouvir os riffs de Edgard e ver Sandra se divertindo valeu uma noite com uma casa toda cantando canções como “Fora Daqui”, “Desespero Juvenil”, “Sete Nomes”, “Noite e Dia” e tantas outras. Especial demais… Volte mais vezes, Thomas!
– Bruno Capelas (@noacapelas) é jornalista. Apresenta o Programa de Indie e escreve a newsletter Meus Discos, Meus Drinks e Nada Mais. Colabora com o Scream & Yell desde 2010.
– Marcelo Costa (@screamyell) é editor do Scream & Yell e assina a Calmantes com Champagne.